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Real Colégio dos Nobres.

 

 

Por Iniciativa do marquês de Pombal, o notável ministro do rei D. José, então ainda conde de Oeiras, foi criado este estabelecimento científico, por carta de lei de 7 de março de 1761, sendo escolhido para a sua instalação o antigo. edifício do noviciado da Companhia de Jesus, do sítio da Cotovia, que ficara vago pela extinção daquela ordem religiosa, por carta de lei de 3 de setembro de 1759. Na mesma data se aprovaram também os estatutos, que se compunham de 25 títulos, onde se estabeleciam as obrigações dos colegiais, das pessoas que exerciam os diversos cargos, desde o reitor, professores, até aos familiares, etc. 

 

O Colégio dos Nobres em meados do séc. 19

 

O numero dos colegiais admitidos era de cem, mas para a sua admissão deviam, primeiramente, qualificar-se com o foro de moço fidalgo, pelo menos, sendo preferidos, nos casos de concurso, os que houvessem tido exercício do dito foro; era também requisito indispensável saber ler e escrever, e não ter menos de sete anos de idade, nem mais de treze. Cada colegial pagava de pensão anual mente 120$000 reis, em duas prestações adiantadas, no princípio de cada semestre. No dia 1.º de outubro deviam apresentar-se no Colégio dos Nobres todos os estudantes para assistirem à abertura das aulas, à matricula, à distribuição dos lugares de cada uma das câmaras de aposentadoria, e à nomeação dos vice-perfeitos, familiares e dos mais assistentes. Os principais lugares do Colégio dos Nobres, segundo os estatutos, eram: reitor, vice-reitor e perfeito dos estudos. O reitor (pessoa de letras, virtudes e circunspecção, na frase dos Estatutos), era encarregado do governo do colégio, e tinha residência no mesmo edifício. As suas obrigações e direitos consistiam em fazer observar os estatutos, visitar as aulas, castigar, dentro de certos limites, os excessos dos colegiais, conceder a estes as licenças que lhes fossem precisas, manter a paz, o sossego e a boa ordem. Não podia aceitar só pela sua autoridade, colegial algum, nem tão pouco fazer, sem ordem do soberano, estatuto, regulação ou reforma, tendo só o direito de representar o que a experiência lhe fosse mostrando ser preciso. No fim de cada ano lectivo devia dar conta de todos os colegiais, referindo secretissimamente os estudos, progressos e composições, que cada um deles houvesse, ou não houvesse feito. Tanto a conta ou relatório anual, como as representações, já indicadas, subiam à secretaria do reino por intermédio do director geral dos estudos. Ao vice-reitor (que será pessoa séria e de exemplar gravidade, dizem os Estatutos) competia, em tudo e por tudo, o governo do colégio, na falta, ausência, ou impedimento do reitor. Eram as suas obrigações ordinárias, vigiar cuidadosamente os colegiais, fazendo visitas repetidas e inesperadas, e observando se estudavam, ou se estavam em sossego nas horas competentes, assistir com eles à missa, a todos os exercícios espirituais, às refeições, aos divertimentos extraordinários e ás recreações extraordinárias.  O perfeito dos estudos devia ser um homem de costumes exemplares, e bem instruído nas belas letras e saber escrever com pureza e elegância em latim. Era ele quem recitava a oração latina no primeiro dia, do ano literário; examinava e revia as composições dos colegiais, assistia a todos os exercícios e actos literários; fazendo um relatório de tudo quanto dizia respeito aos estudos do colégio, para o comunicar ao reitor, e também para, em extracto, o ler no ultimo dia do ano na presença dos colegiais. Para auxiliar o perfeito nomeava o reitor alguns vice-perfeitos, escolhidos dentre os colegiais de mais anos, de melhor procedimento e mais estudiosos. Para administração das rendas e governo económico do colégio foi criada uma junta, composta do reitor (presidente perpétuo), do perfeito dos estudos, de dois professores anualmente chamados pelos turnos das suas antiguidades, e de três colegiais dos mais antigos e dos mais hábeis; servindo todos durante um ano, findo o qual devia o reitor dar conta ao director geral dos estudos, para lhe assignar o dia da nova eleição de conselheiros, e presidir a ela. O conselho devia reunir-se todas as semanas na tarde do dia feriado, para tratar dos negócios concernentes à conservação da fazenda do colégio, deliberar sobre os provimentos económicos da casa, e examinar as despesas da semana antecedente. O conselho tinha um secretário e um escriturário. Os fundos do colégio deviam estar num cofre, do qual haveria três chaves: uma no poder do reitor, outra no do mais antigo dos conselheiros professores, e a outra no do mais antigo dos colegiais. Os estatutos regulavam com previdentes e severas providências a administração da fazenda e a gerência económica do colégio. Os mesmos estatutos providenciavam sobre o estabelecimento seguro e bem ordenado dum arquivo ou cartório, onde seriam guardados os títulos e papéis pertencentes ao colégio e seus bens, rendas e privilégios; sendo o serviço e a guarda do arquivo um cartorário, nomeado pelo director geral dos estudos sobre proposta da junta, ou conselho da fazenda, que assentava sobre uma eleição de três candidatos. Aos professores eram concedidos todos os privilégios, indultos e franquezas, de que os lentes da Universidade de Coimbra gozavam, sem diferença alguma. Todos os colegiais, familiares e pessoas do colégio, que nele tinham exercício, ou assistiam, ou se ocupavam no ensino, gozavam também, respectivamente, de todos os privilégios, indultos e franquezas, que competiam aos estudantes da mesma Universidade. Também foi criada uma livraria privativa, regulada na sua composição pela natureza dos estudos do colégio. Junto da livraria estabeleceu-se um gabinete para acomodação e uso dos instrumentos matemáticos. 

Por alvará de 27 de setembro de 1765 foi concedido o titulo de conselho aos reitores do Colégio dos Nobres. No mesmo alvará, e na carta de lei de 12 de outubro do mesmo ano, se proveu à dotação do colégio. Pela carta de lei de 13 de outubro, ainda de 1765, foi concedido e doado ao Colégio dos Nobres o privilégio exclusivo para a impressão dos livros de Euclides, de Arquimedes, e de outros clássicos das ciências matemáticas. Este privilegio foi transferido para a Universidade de Coimbra pelo alvará de 16 de dezembro de 1773. A abertura do Real Colégio dos Nobres realizou-se a 19 de março de 1766, com a maior solenidade, assistindo à cerimónia toda a família real e a corte. O perfeito dos estudos recitou um discurso manifestando a necessidade de fazer reviver em Portugal as ciências, as letras e as artes, e encarecendo as vantagens que todos os estados tiravam da cultura do espírito. Em seguida, o vice-reitor, o perfeito dos estudos, e os vinte e quatro pensionistas que tinham entrado no colégio, prestaram juramento de defender a imaculada Conceição da Virgem. Os professores nomeados, eram italianos, menos o de retórica, que era português, e os de grego e latim irlandeses. Pelo alvará de 1 de dezembro de 1767 foram declarados e ampliados os estatutos do Colégio dos Nobres. O alvará de 4 de junho de 1771 cometeu à administração e direcção dos estudos das escolas menores à Real Mesa Censória, "incluindo, diz o alvará, nesta administração e direcção não só o Real Colégio dos Nobres, mas todos e quaisquer outros colégios, e magistérios que Eu for servido mandar erigir.” Pela carta de lei de 10 de novembro de 1772 foi ordenado que os estudos matemáticos, até então professados no Real Colégio dos Nobres, só pudessem ser seguidos na Universidade de Coimbra. O legislador declarava formalmente que estes estudos, ficaram na sua real intenção abolidos, e de nenhum efeito, desde a publicação dos outros novíssimos estatutos da universidade. Em ofício do marquês de Pombal à Mesa Censória, datado de 30 de outubro de 1773, foi declarado que a aceitação de familiares, de criados de serviço e de capelães do colégio, até então privativa do director geral dos estudos, pertenceria à mesma Real Mesa, ficando a cargo dos presidentes dela uma vigilante inspecção, tendente a evitar a admissão de pessoas indignas. No mesmo recomendou muito apertadamente a maior economia nos gastos e despesas do colégio, autorizando a expulsão de quaisquer pessoas que, neste particular, promovessem ou apoiassem abusos. O rei D. José permitiu que os professores do Colégio dos Nobres fossem admitidos a beija-mão. 

Pelo aviso de 26 de outubro de 1779 foi ordenado à Mesa Censória, que no edifício do Real Colégio dos Nobres mandasse pôr à disposição dos lentes da Academia de Marinha, as aulas e demais casas que se pudessem dispensar para a acomodação deste último estabelecimento. É de notar que pela carta de lei de 5 de agosto de 1783 foi criada a Academia de Marinha de Lisboa, e pelo citado aviso mandou o governo pôr em exercício aquele estabelecimento, separando-se para esse fim algumas aulas do Real Colégio dos Nobres, e podendo os colegiais aproveitar assim os estudos da nova academia. Por aviso de 22 de fevereiro de 1781 foi ordenado que o Real Colégio dos Nobres cedesse e trespassasse ao Prior e Beneficiados da Igreja Paroquial de S. Mamede o terreno necessário para a edificação da nova igreja. oficinas, e cemitério dela, mediante a indemnização que depois houvesse de ser estipulada. A igreja de S. Mamede estava naquele tempo no sítio de Vale de Pereiro; e o terreno de que se tratava, consistia em um chão baldio, pertencente ao colégio, que decorria do colégio para o Salitre. Pela resolução régia de 19 de outubro de 1759 foi criado um Professor de Esgrima e outro da Arte de Cavalaria, pagos pelo cofre do colégio, sendo fornecidos os cavalos pelas reais cavalariças. Por decreto de 3 de abril de 1791 foi declarado que na Academia de manejo, e arte de andar a cavalo, estabelecida no Real Colégio dos Nobres, podiam ser admitidos como alunos, não só os colegiais, mas também outros de fora do colégio, que tivessem as qualidades requeridas nos estatutos, e além delas, as de boa educação e procedimento, que os tornassem próprios para se comunicarem com os colegiais nas ocasiões do exercício, verificando a mesa, depois de informação do reitor do colégio, que nos pretendentes à admissão, concorriam as sobreditas qualidades. O decreto de 16 de junho de 1792 mandou pagar pelo subsidio literário os ordenados dos professores do Real Colégio dos Nobres, e permitiu que as aulas fossem frequentadas por alunos externos. Este decreto continha uma providência salutar, e mais conforme com os belos princípios da igualdade, do que a primordial disposição dos estatutos do mesmo colégio. Fala-se da determinação tendente a fazer publicas as aulas: «E por que tenho considerado que os Estados do Colégio podem muito bem aproveitar a muitos de fora, sem prejuízo da disciplina e decência dos colegiais, sendo compatível que estejam em separação na mesma aula sem a comunicação dos de fora: Tenho deliberado que as Aulas do Colégio sejam públicas aos de fora, na forma que se regular.» Neste sentido devia a Real Mesa da Comissão Geral sobre o exame e censura dos livros dar certos esclarecimentos ao governo, e como que traçar o plano para a melhor execução dos desígnios da soberana. Pela resolução de 3 de setembro do mesmo ano de 1792 foi ordenada a remoção das Aulas da Academia de Marinha, das casas que ocupavam no Colégio dos Nobres, para poder ter cabimento a segunda providencia do decreto de 16 de junho, acima mencionado. 

No ano de 1823 houve uma discussão muito curiosa e interessante, a respeito do Colégio dos Nobres, no congresso nacional. Tratava-se de discutir o respectivo orçamento, e sobre o assunto discursaram diversos deputados. Soares Franco disse, que o Colégio devia ser reformado e estabelecer-se um liceu nacional, mas como se não tratava disso, e somente de examinar o que se havia de pagar aos professores, a sua opinião era que fosse suprimida a verba da despesa, em razão de eles não darem aulas públicas. Borges Carneiro observou, que o colégio dos nobres era também direito feudal, porque para ali de entrar era preciso ter foro de fidalgo. Que havia no Colégio um monopólio de certas ciências só para esses fidalgos. O mais notável, porém, era o pagamento ser feito pelo Subsidio Literário a estas escolas privativas do feudalismo, sendo aquele tributo criado para o ensino público da mocidade. Moura considerou também aquele estabelecimento como um privilégio exclusivo, e portanto intolerável. Mas não se tratava de extinguir o Colégio, mas saber se devia dar-se consignação do Subsidio Literário para pagamento dos mestres. Dizia que não, porque o subsidio literário era destinado para os mestres públicos, e os do Colégio dos Nobres eram particulares, por isso não tinham direito a ser pagos pelo tesouro nacional. A discussão ainda continuou acerca do pagamento ser ou não por conta do Estado, falando Pato Moniz, Serpa Pinto, Derramado, Santos Vale e Xavier Monteiro, até que por fim o congresso votou: Se é conforme à Constituição a existência do Colégio dos Nobres? Decidiu-se que não, mandando-se criar uma comissão para propor a sua reforma, e que a despesa dos professores fosse paga pelas rendas do mesmo colégio. A comissão de fazenda da câmara electiva do anuo de 1827, encarregada de examinar a conta da receita e despesa do estado em 1826, e o orçamento da receita e despesa para 1827, propôs que fosse suprimida a verba destinada aos ordenados dos professores do Colégio dos Nobres pela folha do subsidio literário, fundando-se em que o Colégio tinha o rendimento necessário para por ele pagar tal despesa. O ministro do reino, na sessão de 26 de março de 1827, observou que os professores eram pagos pelo subsidio literário, por estar este destinado para a instrução pública; não vendo por isso inconveniente em que houvesse de continuar o pagamento como até então. No fim dalguma discussão, ficou resolvido, eliminar-se a verba do Colégio dos Nobres. Com a guerra civil, parece que fechou o Colégio dos Nobres, porque a portaria de 6 de agosto de 1833 mandou que as aulas abrissem em tempo competente, devendo o reitor dar providencias precisas para este fim, em ordem a que se evitasse o prejuízo que à instrução publica resultava de se conservarem fechadas por mais tempo. Por decreto de 2 de setembro do mesmo ano foram demitidos alguns empregados do colégio, por não serem afectos à causa da Liberdade. Por portaria de 23 de janeiro de 1834 foi determinado que os professores e mestres do Colégio fossem pagos pelos rendimentos daquele estabelecimento, e só no caso de não chegarem para o pagamento da totalidade dos vencimentos, competiria ao Tesouro Publico pagar o que faltasse para preenche-la. Pela portaria de 2 de maio do mesma ano, mandou o governo que o encarregado da direcção do Colégio dos Nobres fizesse desde logo publicas as aulas do mesmo colégio, como estava ordenado pelo decreto de 16 de junho de 1792 No ano de 1834 estava aquartelada em parte do edifício do Colégio a brigada de artilharia, mas prometeu o ministro do reino oficiar ao da guerra, no sentido de se efectuar a transferência da mesma brigada para outro local. A portaria de 17 de dezembro de 1831 mandou admitir no Colégio dos Nobres quantos colegiais aí pudessem caber, pagando todos, indistintamente, a pensão de 150$000 reis. Em 28 de setembro de 1836 foi nomeada uma comissão, encarregada de elaborar e propor um plano das reformas necessárias no Colégio dos Nobres, tanto na parte científica, como na parte económica. O decreto de 4 de janeiro de 1837 determinou a abolição do Colégio e providenciou competentemente acerca dos colegiais, dos professores e empregados, e dos rendimentos. Transcrevemos este importantíssimo decreto, que vem publicado no vol. VI da Historia dos estabelecimentos científicos, literários e artísticos de Portugal, por José Silvestre Ribeiro, a pág. 322: 

«Sendo o Real Colégio dos Nobres uma instituição que não está em harmonia com a constituição política da monarquia, em razão por ser seu instituto uma escola privilegiada; e devendo colocar-se no respectivo edifício as escolas que vão ser organizadas: hei por bem decretar o seguinte: 1.º Fica abolido desde já o Colégio dos Nobres. 2.º Os colegiais que agora nele existem serão recebidos no Colégio Militar, onde se lhes dará a instrução conveniente, e nunca inferior àquela que até agora se lhes subministrava, pagando as mesmas prestações que pagavam ao colégio abolido. 3.º Os lentes e mais empregados do colégio abolido serão empregados nas novas escolas que vão ser criadas, e até ao estabelecimento delas conservarão seus actuais ordenados por inteiro. 4.º Todos os rendimentos do colégio abolido, seu edifício e mobília, serão aplicados ás novas escolas pela maneira que o governo determinar.” Oito dias depois da data deste decreto, foi promulgado outro, no qual o governo determinava o seguinte: “1.º O edifício do Real Colégio dos Nobres com todas as suas pertenças, ficará à disposição do ministério da guerra, para nele se estabelecer a Escola Politécnica, e os mais estabelecimentos científicos da dependência do mesmo ministério, que ali for conveniente colocar. - 2.º Os rendimentos do mesmo colégio serão aplicados para as despesas da dita escola, e administrados pela sua junta administrativa. - 3.º A parte da mobília que for necessária para a nova escola, será posta à disposição da mesma.» 

V. Escola Politécnica, Portugal, vol. III, pag. 178.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume VI, págs. 108-111.

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