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O Portal da História Dicionário >  Frei Joaquim de Santa Rosa de Viterbo

 

Viterbo (frei Joaquim de Santa Rosa de).

 

n.      13 de maio de 1741.
f.       13 de fevereiro de 1822.

 

Religioso franciscano da província da Conceição, pregador na sua ordem, cronista da província, notário apostólico, sócio correspondente da Academia Real das Ciências de Lisboa, etc. 

Nasceu no Gradiz, povoação do bispado de Viseu, a 13 de maio de 1741, faleceu em 13 de fevereiro de 1822. 

Depois de aprender a língua latina, tomou o habito de religioso, professando na Ordem de S. Francisco a 7 de setembro de 1720. No seu convento completou os estudos revelando desde muito novo a mais viva tendência para as investigações históricas. Era dotado de raríssima memória e de tal retentiva, que bem se podia dizer, que a sua cabeça era uma livraria. Quase todo o seu tempo o passava a ler ou a escrever, e conquanto se dedicasse a diversas matérias científicas, contudo a sua paixão predominante era o estudo da história e antiguidades, particularmente das do nosso país, e nele se tornou tão versado como bem se deixa ver dos seus escritos. Viajou por diversas partes do reino para indagar inscrições e monumentos romanos, góticos e mouriscos, esquadrinhando as livrarias o arquivos públicos e particulares, para o que estava munido duma ordem régia. As cópias de manuscritos antigos tiradas por ele ficavam valendo como originais, em virtude de privilégio real que assim o mandava, por isso vários sujeitos o encarregaram de por-lhes em ordem os seus cartórios; e também fez no mesmo sentido importantes trabalhos na Torre do Tombo. Sendo nomeado cronista da ordem franciscana, empenhou todo o seu zelo em coligir notícias históricas e em folhear e decifrar os velhos documentos. Os profundos estudos a que se entregava, lhe inspiraram a ideia de escrever e publicar uma obra, de que em Portugal havia grande falta, uma obra que servisse para auxiliar a leitura de documentos, e de livros antigos, uma obra enfim como o Glosario, de Du Cange. 

Essa obra, que se publicou em 1798, é em 2 tomos, com estampas, e intitula-se: Elucidário das palavras, termos e frases, que em Portugal antigamente se usaram, e que hoje regularmente se ignoram: obra indispensável para entender sem erro os documentos mais raros e preciosos que entre nós se conservam. Publicado em beneficio da literatura portuguesa, e dedicado ao Príncipe Nosso Senhor. Encontrou logo adversários esta obra utilíssima, e que é fruto dum ímprobo trabalho, e reveladora de não vulgar erudição e fino critério. Alguns críticos filólogos chegaram a tratar o autor com certa severidade e desabrimento. Agostinho de Mendonça Falcão, na Crónica Literária da Nova Academia Dramática, pág. 199, acusa-o de ter desconhecido o Cancioneiro de Resende, «cuja lição, diz ele, lhe teria sido proveitosa, para não incorrer em algumas inexactidões que se encontram na sua obra, definindo incorrectamente, ou por conjecturas inexactas, alguns vocábulos, cuja verdadeira acepção teria achado no Cancioneiro, se o tivesse manuseado convenientemente.» João Pedro Ribeiro, que também se lhe não mostra muito favorável, diz a seu respeito: 

«Viterbo aproveitou-se dos trabalhos, posto que informes, que deixara preparados o laborioso cónego regular D. Bernardo da Encarnação, os quais lhe foram franqueados no mosteiro da Serra do Porto. Sobre estas bases, com a colheita que fez em alguns cartórios, e outros subsídios que obteve da liberalidade de alguns amigos, organizou o seu Elucidário. Além dos defeitos de execução que nele se encontram, pelo que respeita à significação de muitos vocábulos, sua ortografia, etc., o plano da obra é vicioso, porque exorbita do seu assunto. Ficaria reduzido à terça parte se omitisse em muitos artigos longas discussões em objectos de política, economia e moral, sustentando aliás opiniões nem sempre exactas. Devem-se­lhe agradecer as notícias de história e antiguidades, que semeou pela sua obra para instrução dos leitores; mas cabe aí aplicar-lhe o Sed tamen noa erat hic locus  

E com efeito, numerosas são as correcções que lhe faz acerca dos significados etc. de muitos vocábulos. As acusações mais veementes, porém que se faziam ao Elucidário, de Viterbo, eram as que resultavam do seu suposto ódio às instituições monásticas. Frei Fortunato de S. Boaventura sobretudo, quase que o tinha na conta de livre pensador. Acusava-o de não citar senão trechos desagradáveis para os frades e para os reis. O artigo Bula, principalmente, reputava-o frei Fortunato de S. Boaventura muito pouco ortodoxo. Pondo de parte, porém, essas acusações, que nada vêm para o caso, porque se não tratava no Elucidário de combater ou defender as instituições monásticas, mas sim de explicar as palavras antigas, é incontestável que a obra, se é imperfeita, tem no entanto altíssimo valor, e presta aos estudiosos relevantes serviços, tomando-se principalmente em conta as notas de João Pedro Ribeiro. Viterbo reconheceu a conveniência de resumir a sua obra, suprimindo as digressões e documentos, e limitando-se só ao necessário para os que pretendessem entender com acerto os monumentos anteriores, ou coevos dos primeiros séculos da monarquia, e os manuscritos ou impressos dos autores que floresceram até o século XVI. Neste sentido refundiu e abreviou o Elucidário, preparando uma nova edição, que a morte o não deixou publicar, mas que pouco depois saiu em Coimbra, em 1815, impresso na imprensa da universidade, com o título de: Dicionário portátil das palavras, termos e frases, que em Portugal antigamente se usaram, e que hoje regularmente se ignoram: resumido, correcto e adicionado pelo mesmo autor do Elucidário, a beneficio da literatura portuguesa: Em 1866 fez-se em Lisboa uma nova edição do Elucidário, empreendida pelo editor Fernandes Lopes e dirigida por Inocêncio Francisco da Silva. Saiu com a indicação de segunda edição revista, correcta e copiosamente adicionada de, novos vocábulos, observações e notas criticas, com um índice remissivo. O modo como o erudito bibliógrafo compreendeu a sua missão foi vivamente atacado por Augusto Soromenho, e daí resultou entre estes dois irascíveis eruditos uma discussão violentíssima. No fim do tomo II vem como apêndice, a resposta de Inocêncio ao seu antagonista. 

Absorto nas suas preocupações literárias e estudiosas, eleito sócio correspondente da Academia Real das Ciências e notário apostólico, retirou-se Viterbo nos últimos anos para o convento de Fraga, no distrito de Viseu, e aí continuou a trabalhar até que um ataque apoplético, alterando-lhe as faculdades intelectuais o veio privar de se entregar às suas ocupações dilectas de investigação histórica. Ainda viveu assim algum tempo, até que faleceu, contando setenta e oito anos de idade. Santa Rosa de Viterbo havia publicado no Porto, em 1791, sem o nome do autor, um tomo de Sermões apostólicos, e originariamente portugueses. Deixou bastantes obras manuscritas, cujo destino se ignora.

   

 

 

 

Frei Joaquim de Santa Rosa de Viterbo
e-Cultura - Centro Nacional de Cultura

 

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume VII, págs. 655-656.

Edição em papel © 1904-1915 João Romano Torres - Editor
Edição electrónica © 2000-2015 Manuel Amaral