Caio Calígula

 

Calígula
O terceiro Imperador de Roma

 

Nasceu em Antium (Anzio), em 31 de Agosto de 12 d.C.;
morreu em Roma em 24 de Janeiro de 41 d.C.

 

Último filho de Germânico, filho adoptivo de Tibério, segundo imperador de Roma, e de Agripina, filha de Agripa, tinha 25 anos quando se viu nomeado para o Império, devido à acção decisiva do perfeito do pretório Marco, que lhe obteve o juramento dos pretorianos, dos soldados e dos marinheiros da frota de Itália, e depois a investidura senatorial. Recebeu primeiro o título de imperator, e a seguir, e de uma só vez, todos os outros, com o poder tribunício e o pontificado, e por fim, um pouco mais tarde, foi considerado Pai da Pátria.  

Desta maneira, este jovem que só tinha a seu favor o ser o único filho sobrevivente de Germânico e o principal herdeiro civil de Tibério, conseguiu, de uma só vez, tal como um príncipe real, reunir todos os títulos, e todos os poderes, que Augusto, o primeiro imperador romano, tinha levado anos a acumular e que Tibério tinha em parte recusado. Assim, e muito rapidamente, o Principado deixou de ser uma lenta consagração política de uma pessoa, para se tornar uma instituição constitucional, de facto uma instituição monárquica, cuja nomeação dependia da aprovação do exército e da investidura formal pelo Senado.

As legiões das províncias aceitaram o decidido em Itália e Roma, e prestaram juramento de fidelidade a Caio, que passou a realizar a cerimónia de juramento anualmente. Os primeiros meses do governo foram calmos, tendo o príncipe mostrado o desejo de governar com o Senado, chamando do exílio as vítimas de Tibério, honrando os membros da sua família - a sua avó Antónia, o seu tio Cláudio, esquecido por toda a gente, e mesmo Gemellus, nomeado co-herdeiro com Caligula por Tibero, que vestiu a toga viril e foi declarado Princeps juventutis. Não proclamou a apoteose de Tibério mas distribuiu o legado imperial como previsto, aumentando o seu valor.

Pouco tempo depois a avó Antónia morreu, a única pessoa que poderia ter alguma influência sobre ele, já que o tinha educado na infância. Adoeceu gravemente, provavelmente com uma depressão nervosa, que terá actuado no seu carácter como um catalisador, mostrando a sua verdadeira natureza. Com pouca saúde, com várias doenças congénitas, como a epilepsia, a doença desequilibrou de uma forma irreversível este jovem dotado, inteligente e bom orador, fazendo com  que os autores modernos ainda hoje discutam o significado dos seus actos. É também preciso ter em conta  a sua inexperiência e a excitação do exercício do poder, para além da influência dos escravos e dos libertos orientais que conheceu em casa de Antónia, filha de António: é que parece haver em Calígula uma vontade infantil de reviver o sonho do seu antepassado, a «vida inimitável» do monarca helenístico, desdenhoso da austeridade conformista de Augusto e de Tibério.

Logo após o seu restabelecimento, Caio lança-se numa política, se é que é disto que se pode falar, extravagante e cruel que representam o essencial da biografia de Suetónio. Gemellus foi morto, já que era fácil de prever que seria a base de uma oposição futura. Em relação ao Senado mostra-se, tanto irónico como ofensivo, como cruel e sádico. Os melhores servidores de Tibério, velhos e excelentes membros da classe consular, assim como experientes governadores são ridicularizados, subjugados, necessitando de se rebaixar às mais reles baixezas e aterrorizados. Muito são executados sumariamente, algumas vezes em pleno Senado, ou obrigados ao suicídio ouvindo as graçolas do algoz imperial. As enormes despesas em realização de Jogos, em festas e outros esbanjamentos assim como em construções inúteis levam o tesouro deixado por Tibério à exaustão, e para encher os cofres de novo volta-se às condenações de ricos, tanto em Roma como na Gália, com confisco dos bens. 

No começo da sua governação Calígula contrariou muitas das decisões de Tibério, projectando entregar aos comícios as eleições que lhes tinham sido retiradas em 14, mas a ideia não foi para a frente. Queria governar, dizia, para o povo e a classe equestre, rodeando-se de libertos. Nomeia-se cônsul todos os anos, tirando o ano de 38, para sublinhar a preeminência do princeps na constituição. Retirou ao procônsul de África o comando da 3.ª Legião, Augusta, para que todas as tropas estivessem nas mãos dos legados imperiais. Mas, de facto, não mudou praticamente nada o pessoal administrativo das províncias, que não sofreram das suas loucuras, tirando a Gália, em que residiu entre 38 e 40, tendo em Lyon uma corte magnífica, rodeado de príncipes orientais, como Júlio Agripa, ou helenizados como Ptolomeu da Mauritânia, neto de António e Cleópatra, pela sua mãe Cleópatra Selena). A sua política externa opõem-se também aqui à de Tibério, e mesmo à de Augusto, que pretendiam acabar com os vários estados clientes existentes no Oriente. Calígula entregou vários territórios, como a Trácia, a Arménia, a Itureia, Damasco, uma parte da Judeia aos herdeiros dos reis desapossados, o que teve como resultado aumentar a confusão.

Mas há outro fio condutor. Calígula quis, e claramente desta vez, governar como um monarca oriental, como um déspota, de acordo com o seu bel-prazer. O mais grave é que para realizar o que pretendia não necessitava de modificar as bases do principado fundado por Augusto, já que os princípios de uma monarquia sem controlo estavam presentes na obra do «restaurador da liberdade» (vindex libertatis). Algumas das iniciativas de Calígula foram arcaizantes, como as festas em honra de Jupiter Latiar ou a reconstituição do rito do Rex Nemorensis (regresso às origens : aos montes Albanos), possivelmente inspirados pelo seu tio Cláudio, um sábio «antiquário». Os outros aspectos da política religiosa são mais lógicos; exaltação da ideologia oriental helenistica e de auto-deificação. Fez construir templos, sobretudo no Oriente, onde a sua estátua era colocada ao lado da divindade no naos. Tentou impor aos senadores a genuflexão como forma de saudação (proskysene), como Diocleciano fará dois séculos e meio mais tarde. Divinizou Drusila, a sua irmã referida, tanto em Roma como nas províncias, após a sua morte em 38, e rendeu-lhe culto como às mulheres-irmãs dos reis Ptolomeus do Egipto helenístico, o que fez nascer os boatos sobre relações incestuosas entre os dois. Tentou que o Senado mandasse construir um templo em sua honra no Capitólio, e enquanto esperava aumentou o templo de Castor e Polux, onde era adorado em pessoa. Fez ligar o seu palácio no Palatino ao Capitólio por uma passagem imensa, afim de poder contactar Júpiter mais facilmente, segundo as suas próprias palavras. A lembrança de António, a recordação da sua visita a Alexandria, acompanhando os pais, em 18 quando tinha 6 anos, a sua preferência pela monarquia Ptolemaica explica a sua devoção ao culto de Ísis. Por isso autorizou o culto, proscrito por Tibério, construiu no Campo de Marte um Isaeum, e inscreveu o culto de Ísis no calendário romano. As províncias orientais aceitaram facilmente esta política que irritava os Romanos. Mas ao querer colocar a sua estátua no templo de Jerusalém entrou em conflito com os Judeus.

Em Roma, onde tudo ainda se decidia, se as províncias se mantivessem calmas, as coisas não podiam manter-se assim durante muito tempo. Depois de ter alienado as classes dirigentes, Calígula teve a imprudência de criar impostos para os artífices e os comerciantes da capital, não perdendo também uma ocasião de insultar os tribunos das coortes pretorianas, que eram o único apoio que lhe restava. Após o falhanço sangrento de numerosas conspirações, foi finalmente assassinado pelo tribuno do pretório Cassius Chaerea, que foi o executor de uma conspiração onde se encontravam senadores, um dos dois perfeitos do pretório e de libertos importantes, cansados de tanto loucura.

O reinado trágico e louco de Calígula acabava em sangue, o primeiro de uma longa série. Mas, sob muitos pontos de vista, a política de Calígula não era completamente demente nem prematura: a hora do despotismo oriental é que ainda não tinha chegado a Roma. E de facto, havia outras maneiras de resolver as contradições deste regime monárquico fundado no respeito da tradição republicana, e o reinado seguinte, de Cláudio, iria mostrá-lo.

Fonte:

Paul Petit, Histoire Générale de l'Empire Romain, 1, Le Haut-Empire (27 av. J.-C. - 161 ap. J.-C.), Paris, Éditions du Seuil («Univers Historique»), 1974.

A ler:

Suetónio, Os Doze Césares, Livro IV: Caius Caligula

Na Internet:

Calígula no «De Imperatoribvs Romanis» 
(a ligação abrirá numa nova janela)

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