Francisco Sá Carneiro em Dezembro de 1979

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Francisco Sá Carneiro, fotografado em 14 de Dezembro de 1979

DISCURSO DE SÁ CARNEIRO.

Discurso de Francisco Sá Carneiro proferido em 11 de Janeiro de 1980 no Palácio de São Bento perante a Assembleia da República, para apresentação  do Programa do 6.º Governo Constitucional.

 

O discurso de Sá Carneiro na apresentação do programa do governo saído das eleições de 2 de Dezembro de 1979, vem no seguimento dos três governos de iniciativa presidencial promovidos por Ramalho Eanes após a sua destituição do 2.º governo de Mário Soares. O primeiro governo presidencial, de Nobre da Costa, tinha sido nomeado em 29 de Agosto de 1978. O último, presidido por Maria de Lurdes Pintasilgo, tinha tomado posse em 7 de Julho de 1979 e estava incumbido sobretudo de realizar as eleições legislativas intercalares no final do ano.

As eleições só deviam realizar-se em 1980, como de facto se realizaram em 5 de Outubro, mas a oposição aos governos presidenciais, e a impossibilidade de encontrar soluções governativas estáveis na Assembleia da República saída das eleições de 25 de Abril de 1976, obrigaram Ramalho Eanes a convocar eleições intercalares.

A solução para a crise proposta por Sá Carneiro foi a organização de uma coligação pré-eleitoral do PSD com o CDS e o PPM, a que foi dado nome de Aliança Democrática. O seu objectivo era conseguir uma maioria absoluta na Assembleia da República e a apresentação de um candidato único às eleições presidenciais de finais de 1981.

Previa-se que estes meios permitiriam preparar a revisão da Constituição de 1976, acabando com o Conselho da Revolução, e preparando o regresso ao sector privado das empresas nacionalizadas a seguir ao golpe de 11 de Março de 1975.

A revisão da Constituição só seria conseguida pelo governo de Francisco Pinto Balsemão, e a privatização das empresas nacionalizadas só foi realizada durante os governos de Cavaco Silva.

Nota: Os sub-títulos são
os da publicação original.

 

«A mudança prometida pela Aliança Democrática vai decorrer nos quadros estabelecidos pela lei e no respeito das instituições democráticas do País. Ela, sem dúvida, implica a oportuna revisão da Constituição da República Portuguesa.»

 

Senhor Presidente,

Senhores Deputados:

Começo por saudar os representantes livremente escolhidos pelo povo português e, em particular, o seu Presidente. Esta Assembleia é uma assembleia única na história dos regimes representativos em Portugal. Pela primeira vez a maioria mudou pacífica, legal e ho­nestamente pelo voto. E as maiorias de ontem, que são as minorias de hoje, aceitaram sem violência o juízo do País.

A esperança e a vontade de mudar que aqui trou­xeram cento e vinte e oito deputados das listas da Aliança Democrática só dizem respeito aos partidos, agrupamentos e pessoas que a compõem. Aos que nos elegeram, solenemente prometemos não desiludir a es­perança nem trair a vontade. Mas é preciso acrescentar que a transferência do Poder, nos termos em que se fez, honra todos os participantes na vida política nacional: simples cidadãos, partidos, órgãos de soberania. Em certo sentido, a data de 2 de Dezembro não marca apenas a vitória da Aliança Democrática. Marca também, e sobre­tudo, um passo decisivo para a maioria da democracia portuguesa.

O País escolheu e expressamente mandatou um Governo para cumprir, com base numa maioria parlamentar, estável e coerente, um programa de mudança e de progresso.

Na verdade, não se limitou a escolher entre partidos. A Aliança Democrática propunha-lhe mais do que isso. Propunha-lhe uma escolha clara entre o seu Governo e o Governo do PC e do PS, com ou sem patrocínio presidencial. O País escolheu a Aliança Democrática. É este, pois, um Governo especialmente responsável que se apresenta ao povo português através da Assembleia da República.

Têm o Governo e a maioria nítida consciência da missão de que se encontram investidos. Como realidades políticas singulares na história da democracia portuguesa, ambos se sentem autorizados a sublinhar, antes do mais, a sua inalienável fidelidade aos valores da liberdade, da democracia e da justiça. Princípios éticos da sua criação e da sua acção, neles encontra a Aliança Democrática o critério para a luta em defesa da dignidade da pessoa humana e de um Portugal renovado, moderno e próspero.

A política do Governo é por natureza humanista no projecto, portuguesa na raiz e europeia na vocação. Contribuir para a edificação de Portugal democrático é o seu objectivo. Ajudar o processo de revitalização da sociedade civil e fomentar o reencontro entre o Estado e os cidadãos é o seu método. O Governo está interessado no aprofundamento das solidariedades entre os Portugueses, na afirmação e realização da pessoa humana e no desenvolvimento da justiça social. Como está interessado num exercício mais amplo das capacidades da iniciativa privada, individual ou de grupo, na convicção de que o progresso material do País tem nela o seu motor principal.

Gestor de interesses em conflito, o Governo encara as tensões sociais sem receio. Aceita-as como um factor dinâmico da vida colectiva, mas orientará a sua acção pela regra de subordinação do interesse particular ao interesse geral, condicionada ao respeito devido à autonomia dos corpos e grupos sociais e às exigências da descentralização.

O Governo atenderá às responsabilidades que cabem ao Estado na protecção dos mais desprotegidos e dos marginalizados da sociedade. A guerra contra a pobreza e a ignorância está na primeira linha das suas preocupações. E nesta luta o Estado deve dar o exemplo. A transparente honestidade da administração pública tem de se traduzir num firme combate a todas as formas de corrupção e numa prática quotidiana sóbria e digna.

A dignidade do Estado português, na ordem interna e na ordem externa, impõe também que o Governo seja sensível ao património cultural de um povo espalhado pelo Mundo e com mais de oito séculos de História. A forma de comemoração, em 1980, do IV Centenário da Morte de Luís de Camões será símbolo dessa sensibilidade. A aceleração do processo de integração europeia de Portugal representa, por outro lado, o sentido modernizador que o Governo entende imprimir, no começo da década de 80, à herança histórica de que o País é depositário, consciente de que só uma política interna determinada, coerente e adaptada aos interesses nacionais, poderá conduzir a que a integração se processe com vantagem e seriedade.

O Governo apresenta-se, pois, com uma política clara quanto ao sentido geral dos processos de democratização económica, social e cultural que quer animar, em complemento do percurso que o País percorre em direcção a formas mais aperfeiçoadas de democracia. O horizonte temporal restrito a que se sujeita este Programa não retira força, nem diminui a importância dessa política, embora limite a sua concretização ao curto lapso de alguns meses, até ao momento em que, de novo, os Portugueses sejam chamados a pronunciar-se através do voto.

O Governo não ignora que, muito cedo, terá de se submeter à prova eleitoral. Mas desde já afirma que não a teme. Pelo contrário, considera essa prova como mais um elemento mobilizador das suas próprias energias ao serviço do País. Saberá adoptar um estilo pragmático na busca da resolução dos problemas concretos dos Portugueses. Manter-se-á sereno perante as dificuldades, naturais ou artificiais, que lhe surjam. E, simultaneamente, recusará seguir os caminhos fáceis mas fraudulentos da demagogia. Pelo seu lado, o Governo não contribuirá para que o País viva os meses do seu mandato num clima da campanha eleitoral. Espera confiadamente que, nas eleições legislativas de 1980, o povo português o julgue pela obra realizada. É um desafio que gostosamente aceita.

Grandes opções

O Governo da Aliança Democrática foi eleito em nome de uma firme disposição de mudança, mas também sob o signo da moderação. O País precisa tanto de mudança como de moderação.

Em menos de cinco anos, Portugal teve onze Governos, cinco dos quais desde que a Constituição foi aprovada em 1976. O Governo da Aliança Democrática é, já de si, o princípio da mudança, porque responde à urgente necessidade de que Portugal não continue à mercê de arranjos partidários efémeros ou de Ministérios transitórios, em que o País não acredita e que a Assembleia da República não apoia. Mudança em direcção à estabilidade governativa e a uma efectiva colaboração entre Governo e Parlamento. O seu Programa aponta na mesma direcção.

A mudança prometida pela Aliança Democrática vai decorrer nos quadros estabelecidos pela lei e no respeito das instituições democráticas do País. Ela, sem dúvida, implica a oportuna revisão da Constituição da República Portuguesa. Mas sendo a defesa do principio da legalidade e a salvaguarda da autoridade do Estado de Direito a primeira grande opção política do Governo, este limitar-se-á, na sua actuação legislativa e administrativa, ao quadro constitucional existente. Entende, porém, o Governo e a sua maioria parlamentar que, em obediência à regra segundo a qual aquilo que não é proibido é implicitamente consentido, lhes será lícito defender a aprovação de uma proposta de lei-quadro sobre o regime jurídico do referendo ou interpretar de modo não restritivo os preceitos constitucionais relativos às Regiões Autónomas, quando da discussão das respectivas propostas de Estatuto na Assembleia da República.

A salvaguarda da legalidade e da autoridade do Estado de Direito, o Governo associa, de modo indissolúvel, o desenvolvimento da autonomia regional dos Açores e da Madeira e o aprofundamento da unidade e da solidariedade nacionais.

O Governo garantirá a comunicação permanente com os Governos Regionais, através dos quais, nomeadamente, se completará o processo de transferência dos serviços periféricos do Estado existentes nos dois arquipélagos, se estudará a devolução de poderes que as Regiões devem exercer, se ajustarão os apoios financeiros indispensáveis ao desenvolvimento regional, se acertarão os mecanismos de participação das regiões nas negociações de natureza internacional que, de algum modo, as afectem e se procederá à preparação da criação de zonas de franquia aduaneira nos dois arquipélagos, abrangendo os sectores comercial e industrial. A exemplo do que sucede noutras terras insulares da Europa, o Governo autorizará as Regiões Autónomas a emitir selos próprios, bem como a cunhar moeda própria com interesse numismático. Definir-se-á também para os arquipélagos uma nova política de transportes e infra-estruturas a eles ligados, por forma a minimizar os efeitos económicos e sociais da insularidade, e, nomeadamente, acelerar-se-ão os projectos e estudos destinados a assegurar as ligações intercontinentais da Madeira. Quanto ao território de Macau, sob administração portuguesa, o Governo e a sua maioria parlamentar estão abertos a conceder o apoio necessário à promoção do seu progresso cultural e material, à preservação das seculares relações de boa vizinhança entre os povos de Macau e da República Popular da China, e à discussão de novo Estatuto Orgânico do território, num clima de consulta sobre todas as providências que tenham incidência nos interesses e aspirações da população local e no respeito dos preceitos constitucionais pertinentes.

Entretanto, o Governo manterá o princípio de considerar Portugal como Estado responsável pelo Território de Timor Leste e não abdicará de lutar pela autodeterminação da sua população.

A unidade e a solidariedade nacionais impõem o reforço da participação dos portugueses na administração do País e na sua vida política. A apresentação à Assembleia da República de propostas de lei sobre revisão das leis eleitorais provém dessa opção essencial do Governo. Através delas, serão fixadas formas mais amplas de intervenção eleitoral dos emigrantes e restabelecido o círculo eleitoral de Macau.

Este propósito de promover uma maior participação dos cidadãos na existência colectiva é acompanhado pela vontade de diálogo e concertação com as forças sociais e culturais mais relevantes da sociedade portuguesa. Mas o Governo não ignora que lhe cabe, simultaneamente, ajudar a construir as condições que permitam aos Portugueses ter consciência da sua identidade nacional e orgulhar-se de uma Pátria justa, pacífica e próspera.

Prosseguir-se-á, com firmeza, a opção europeia e atlântica da política externa, como parte de um objectivo geral de preservação da independência e dignidade de Portugal. O mesmo objectivo, embora adaptado a especiais circunstâncias históricas e culturais, orientará o aprofundamento das relações com os outros Estados de língua portuguesa.

Quanto ao sistema económico, a racionalização do sector público merecerá uma particular atenção do Governo.

Mas o alargamento e reanimação do sector privado é um dos seus critérios de acção, visto que o considera uma base essencial do desenvolvimento do País e instrumento da sua reconstrução. Entretanto, aos cidadãos o Estado deve dar mais em troca do que lhes pede ou pedir menos do que aquilo que está em condições de reciprocamente lhes dar.

O Governo empenhar-se-á também na reforma progressiva da Administração Pública, condição do progresso geral do País.

No plano social, o Governo preocupar-se-á, sobretudo, com as carências mais significativas nos domínios da habitação, da educação, da saúde e da segurança social. O Governo inscreve no centro das suas preocupações a melhoria da qualidade de vida e do bem-estar dos Portugueses, essência da sua luta pela justiça e por mais sólidos suportes materiais e culturais da liberdade.

Estas são, pois, as grandes opções políticas do Governo: defesa do princípio da legalidade, salvaguarda da autoridade do Estado de Direito e acatamento da lei constitucional; desenvolvimento da autonomia das Regiões Autónomas, bem como da unidade e da solidariedade nacionais; reforço das formas de participação dos cidadãos, quer residentes quer emigrantes, na vida colectiva e a prática do diálogo como método de superação dos conflitos; preservação da independência e da dignidade do País, com aprofundamento da opção europeia e atlântica de Portugal; combate à crise económica e luta pela melhoria da qualidade de vida e bem-estar dos Portugueses.

O Governo espera poder, assim, contribuir para que os portugueses se sintam mais portugueses e mais confiados no futuro de Portugal.

Atribuirá, além disso, a máxima prioridade à resolução dos problemas concretos e está inteiramente disposto a não deixar que os temas ideológicos ou doutrinários do processo político se sobreponham ao enfrentamento claro e sem ambiguidades das questões que, no dia-a-dia, mais preocupam a maioria dos cidadãos.

Estrutura do Governo

A estrutura do Governo foi concebida em função de critérios de operacionalidade. 0 número dos seus ministros é o menor de todos os Executivos formados em Portugal desde o 25 de Abril. Não há nele ministros-coordenadores, devendo as relações de coordenação ser estabelecidas através de Conselhos de Ministros restritos, técnica e politicamente habilitados.

A coesão política do Governo parece estar, assim, mais facilmente assegurada através do primeiro-ministro ou, quando necessário, do vice-primeiro-ministro, evitando-se a pulverização dos centros de decisão num conjunto que precisa de se distinguir pela sua eficácia e pela funcionalidade.

Na Presidência do Conselho de Ministros ficarão, entretanto, situados vários sectores que a experiência aconselha a colocar na dependência política superior do próprio primeiro-ministro: Comunicação Social, Cultura, Ordenamento e Ambiente.

Concentraram-se no vice-primeiro-ministro, que acumula as suas funções com a de ministro dos Negócios Estrangeiros, muitas responsabilidades em matéria de política externa, incluindo as questões relacionadas com a integração europeia. Esta opção traduz a importância política que o Governo atribui à unidade na condução das relações externas do País. Pelo seu carácter global, o sector da reforma administrativa depende igualmente do vice-primeiro-ministro.

Os secretários de Estado deixam, entretanto, de ter competência própria atribuída por lei para passarem a dispor da competência que lhes for delegada pelos ministros, sem prejuízo de as correspondentes designações apontarem, desde já, para a área em que irão preferencialmente intervir. Pretende-se, assim, evitar a existência de compartimentos estanques dentro de cada Ministério e permitir maior rapidez no relacionamento e na coordenação entre serviços.

0 Ministério das Finanças e do Plano apresenta o maior número de secretários de Estado, em virtude, por um lado, do especial e diversificado volume de questões de que trata e, por outro, da concentração num único Ministério de responsabilidades governamentais que, por vezes, têm estado distribuídas.

No Ministério da Educação e Ciência, em contrapartida, desaparecem os lugares de secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário e da Administração Escolar, substituídos por um único lugar de secretário de Estado da Educação, com maior capacidade para o equacionamento integrado das questões de natureza diversa que se colocam em vários graus de ensino e em diferentes áreas da acção educativa.

Pela primeira vez, enfim, se cria um lugar de secretário de Estado da Família, a fim de que o Governo possa ter uma perspectiva acerca das políticas mais adequadas para promover a justiça social não apenas do ângulo do cidadão, mas também do conjunto familiar.

São, pois, importantes as inovações que a estrutura do Governo apresenta. Não são, porém, numerosas, se a compararmos com a dos quatro primeiros Governos Constitucionais. A alteração mais profunda deve resultar da reforma administrativa, não sendo prudente introduzir grandes alterações no plano político sem que, previamente, estejam estudadas e em via de concretização as necessárias adaptações ao nível dos serviços. De outro modo, encorajar-se-ia a tendência para fazer aumentar indiscriminadamente a dimensão da Administração num País onde ela já é excessivamente pesada e ineficiente.

Inovador é o facto de a responsabilidade pelo Ministério da Defesa Nacional se entregar a um civil. Entendeu-se, na verdade, que, com o aproximar do fim do período de transição constitucional em que vivemos, era desde já oportuno assinalar de alguma forma o princípio de que, após a revisão da Constituição e com o desaparecimento do Conselho da Revolução, as Forças Armadas Portuguesas devem depender politicamente do Governo escolhido pelo povo. Deste modo se abre caminho para uma nova forma de relacionação entre civis e militares na democracia portuguesa, mais consentânea com as tradições e regimes dos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte, de que Portugal é membro, sem qualquer quebra do rigoroso apartidarismo das Forças Armadas.

O Governo e os outros órgãos de soberania

O Governo manterá, em relação aos demais órgãos de soberania, um comportamento pautado pelo escrupuloso respeito das normas constitucionais. Para além disso, faz questão de sublinhar o seu propósito de considerar como decorrente de um imperativo nacional a cooperação entre órgãos de soberania dentro das suas esferas de competência específica, sem prejuízo do princípio da separação de poderes.

O Governo não pretende usar, em relação a qualquer outro órgão de soberania, o argumento político que resulta de ser a Assembleia da República e ele, Governo, quem exprime a mais recente e actualizada expressão da vontade popular. Não se porá em causa a legitimidade constitucional e popular de cada órgão de soberania, tal como decorre da lei fundamental.

Esta atitude não colide com as opiniões que as forças políticas apoiantes do Governo possam ter acerca da existência, da configuração, do comportamento ou do futuro dos vários órgãos de soberania ou dos seus titulares. Ela é assumida em nome do respeito pela legalidade e do interesse nacional. As instituições do Estado têm de se respeitar mutuamente e entender-se nos limites estabelecidos pela Constituição.

O Governo procurará, pelo seu lado, manter uma relação construtiva com o Presidente da República, manifestando o respeito devido ao Chefe do Estado, sem abdicar das suas próprias prerrogativas constitucionais.

Por fim, o Governo favorecerá o aperfeiçoamento das condições de trabalho da Assembleia da República e dos Deputados, esforçando-se por melhorar as relações orgânicas e funcionais entre ele e o Parlamento. O Governo estará disponível para o contacto e regular diálogo com a Assembleia da República, de que um dos seus membros, o ministro adjunto do primeiro-ministro, se encontra especialmente incumbido de coordenar e garantir.

O Governo, a opinião pública e as forças sociais

O Governo, consciente de que é o Governo de Portugal e, portanto, de todos os portugueses, não ignorará o significado social e político dos resultados das eleições de 2 de Dezembro. Não aceitará, todavia, que essa sua disposição se possa interpretar como aceitação implícita de privilégios de base geográfica ou social de algumas forças políticas. Portugal é uno e o Governo exerce, nos termos constitucionais, a sua acção sobre todo o País e com obediência ao princípio da igualdade dos cidadãos perante alei.

A opinião pública será mantida ao corrente dos principais problemas nacionais e da resposta que, para eles, o Governo for encontrando. Perante a opinião pública o Governo praticará uma política de verdade e de informação frequente e, em relação aos partidos que o não apoiam, saberá respeitar o Estatuto da Oposição. Do rigor dessa política está o Governo certo que resultarão importantes factores de estabilidade social e política.

Sem quaisquer paternalismos e num espírito de concertação, o Governo dialogará com os organismos representativos dos trabalhadores e dos empresários. O Governo confia no patriotismo e no espírito democrático da enorme maioria dos trabalhadores e dos empresários portugueses. Os conflitos de interesse que entre eles existem serão vistos pelo Governo dentro do respeito devido à autonomia das organizações sociais. A concepção de democracia participada da Aliança Democrática não é compatível com a instauração de um modelo de relações de trabalho em que se minimize a intervenção e decisão dos trabalhadores e entidades patronais. Mas nem por isso o Governo estará menos aberto ao diálogo com todos os sectores sociais e culturais relevantes.

Estas palavras constituem uma declaração política geral sobre o Programa e as regras práticas de actuação do Governo. São palavras medidas, que exprimem intenções firmes. O Governo e a maioria receberam o Poder do voto livre do povo português. Tencionam usá-lo com moderação e responsabilidade. Mas, que ninguém se engane, tencionam usá-lo cumprindo o mandato que é o seu. E para o afirmar de novo, com vigor e clareza, aqui e perante a Nação, o Governo decidiu pedir a esta Assembleia da República a aprovação de um voto de confiança sobre a política que se propõe seguir e consta do Programa hoje apresentado.

 

Fonte :

«Discurso do Primeiro-ministro, Dr. Sá Carneiro, na Apresentação do Programa do VI. Governo Constitucional» in Programa do VI Governo. Texto do Programa. Discursos do Primeiro-ministro, Dr. Sá Carneiro, na apresentação e no encerramento dos Debates e relativos à Moção de Confiança, Lisboa, Secretaria de Estado da Comunicação Social, Direcção-geral da Divulgação, [1980], págs. 7-18.

A ver também:

  • Francisco Sá Carneiro
    A biografia do político. 

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