DAS MEMÓRIAS DE ANTÓNIO DE SOUSA DE MACEDO


Extracto das Memórias escritas com o título «Contêm este papel uma Sumária Relação dos Sucessos de Portugal desde a menoridade até ao Falecimento de el-Rei D. Afonso o 6.º que Deus descansa escrita e composta por António de Sousa de Macedo». O trecho descreve os primeiros tempos do governo pessoal de D. Afonso VI, após a sua «Tomada do Poder», afastando a mãe da regência, e entregando a direcção do governo ao conde de Castelo Melhor.

Nota: As ligações no texto remetem para entradas no «Portugal - Dicionário histórico».

 

D. Afonso VI

D. Afonso VI.

Quinta Feira 20 de Julho de 1662 nomeou El-Rei ao Conde de Castelo Melhor por seu secretário da puridade e mandando chamar no mesmo dia a noite o Pedro Vieira para que lhe passasse a carta lhe representou ele tocava este ofício ao Secretário de Estado e que dele lhe tinha El-Rei que Deus têm feito muito de promessa sem embargo de o mostrar por escrito e de outras razões que representou se lhe mandou fazer a carta que logo no outro dia foi a assinar beijando no mesmo grande quantidade de fidalgos a mão a Sua Majestade de pela mercê que havia feito ao Conde com grande pesar alguns de ver que sendo este o maior ofício que dão os Reis se conferiu a um sujeito que não chega a 30 anos sem notícias nem experiências e sem ainda haver cumprido um mês depois de El-Rei entrar no governo quando nele lhe havia feito tanta mercê que sobre lhe dar quarto no Paço lhe entregar as assinaturas lhe havia fiado uma chave de duas voltas coisa que nunca intentou alcançar nem o Conde de Odemira sem embargo do seu muito juízo muitos serviços e muitos anos.

Quinta-feira a tarde 27 de Julho de 1662 nomeou S. Majestade de para Ministros da Junta dos Três Estados a António de Mendonça eleito Arcebispo de Braga e a André Furtado de Mendonça Deão de Lisboa.

Sexta-feira 4 de Agosto de 662 pelas 10 horas da manhã mandou El-Rei nosso Senhor chamar ao Secretário Gaspar de Faria Severim e entrando na sua Câmara lhe deu o papel seguinte mandando-lhe que ele executasse logo as ordens que refere.

Sabereis a forma que se guardou com o Duque de Cadaval a outra vês que foi desterrado e nessa mesma lhe fareis aviso da minha parte que convêm a meu serviço por justas razões que tendo considerado e lhe devem ser presentes que ele se abstenha logo de vir ao Paço e que dentro de cinco dias se parta para Tentúgal de donde não sairá sem outra ordem minha o que tudo cumprirá inviolavelmente por assim lhe ser necessário.

A Pedro Vieira da Silva avisarei que se abstenha de vir a Secretário e se parta dentro de 3 dias 50 léguas desta Corte de donde não virá sem ordem minha por assim convir a meu serviço.

 Em satisfação deste papel se escreveram estas cartas

Para o Duque

Sua Majestade que Deus guarde me manda dizer a V. Ex.ª da sua parte que por justa considerações de seu serviço que a V. Ex.ª deverá ser presente há por bem que V. Ex.ª se abstenha logo de vir ao Paço e que dentro em 5 dias se parta V. Ex.ª para Tentúgal donde não sairá sem outra ordem sua e que V. Ex.ª a cumpra inviolavelmente por ser assim necessário Nosso Senhor etc. Do Paço 4 de Agosto de 662.

Para o Secretário Pedro Vieira da Silva

Sua Majestade que Deus guarde me manda dizer a V. Mercê da sua parte que V. mercê se abstenha de vir à Secretaria e se parta dentro de 3 dias para 50 léguas fora da Corte donde não virá sem outra ordem do dito senhor por assim convir a seu serviço Nosso senhor etc. Do Paço 4 de Agosto de 662.

A esta ordem respondeu Secretário Pedro Vieira o seguinte.

Agora acabo de receber hum escrito de V. mercê com aviso de Sua Majestade que Deus guarde me mandar abster de ir à Secretaria e de me partir entrando de 3 dias 50 léguas de distância desta Corte donde não sairei sem outra ordem de Sua Majestade logo executarei o que Sua Majestade mande Deus guarde a V. Majestade de Casa 4 de Agosto de 662.

Em lugar de Secretário Pedro Vieira da Silva nomeou Sua Majestade ao Desembargador António de Sousa de Macedo do seu Conselho e de sua fazenda e juiz das justificações que havia sido seu Embaixador aos Estados das Províncias Unidas de Holanda. Porém com as condições seguintes em que se introduziu o Conde de Castelo Melhor.

Que o Conde de Castelo Melhor tomaria de El-Rei as resoluções sobre o que se votasse no Conselho de Estado para António de Sousa as escrever somente À margem dos próprios assentos. Que poria as vistas em todas as cartas a Decretos que se oferecem.

Que lhe havia de fazer os avisos das ordens que se houvessem de passar. E finalmente ficou sendo oficial maior do Escrivão da Puridade.

O Conde tomou para sua Secretaria a Casa que no Forte igual das mais de El-Rei serviu de sua guarda-roupa e depois de casa dos gentis-homens de El-Rei que Deus guarde quando o havia.

A 29 de Julho deu D. Sancho Manuel Conde de Vila Flor e Governador das Armas da Província da Beira uma Batalha ao Duque de Ossuna na Ribeira de Águeda em que ganhou a artilharia do seu exército e lhe matou muita gente e pelo inimigo deixar num lugar nosso junto a Castelo Rodrigo chamado Escalhão feito um forte de grande consideração guarnecido com 400 Infantes o foi sitiar no seguinte dia e em 30 rendeu depois de o haver atacado por duas partes à vista do exército inimigo concedendo aos rendidos uma peça de artilharia das que tinha o Forte e a vida aos que escaparam do combate.

A 6 de Agosto de 662 veio preso de Alentejo o Mestre de Campo Diogo Leite por ter comunicação com Castela e o meteram na casa de segredo.

A 7 do mesmo mês se avisou pela Secretaria de Estado da parte de S. Majestade a Luís de Melo seu Porteiro-Mor que não fosse ao Paço sem outra ordem de Sua Majestade e a seu filho Manuel de Melo e a Garcia de Melo Monteiro-Mor saíssem fora da Corte 14 léguas até outra ordem de Sua Majestade

Em 12 de Agosto nomeou Sua Majestade a Frei Luís de Sousa Irmão do Conde Castelo Melhor e tio deste escrivão da Puridade por Bispo do Porto. Foi este Religioso geral da sua Congregação de Cister e actualmente era governador do Arcebispado de Évora feito há mais de um ano e meio; e porque os cónegos da mesma se entenderam lhe não podia tocar a jurisdição, e o tiraram por esta causa, não o querendo tornar a restituir a ela, andam todos desterrados, e a Sé está sem capitular nenhum com grande sentimento do povo do Arcebispado.

Em 22 de Agosto de 1662 tomou Luís Mendes de Elvas posse do lugar de Conselheiro da Fazenda que se lhe mudou pelo do Ultramarino em que assistia.

Em 19 de Agosto sábado dia de S. Luís Bispo de Tolosa foi Pedro Severim de Noronha a primeira vez a Despacho como secretário das Mercês, e expediente e ainda que de idade de dezanove anos teve já este exercício assim juntamente com seu pai como por si só; no ano de 1656 servia de Secretário de Estado Mercês; e Expediente juntamente depois da morte de El-Rei D. João o 4.° entrando o governo da Rainha D. Luísa parou com este exercício que agora tornou a continuar.

Segunda-feira 21 de Agosto que El-Rei D. Afonso Nosso Senhor cumpriu os dezanove anos de sua idade fez mercê ao Senhor Infante D. Pedro seu irmão de lhe dar mil quintais de pau-brasil livres de direitos, mandando os Sua Alteza buscar por conta de sua fazenda. Dizem que importara esta mercê dez ou doze mil cruzados.

Sexta feira 25 de Agosto mandou El-Rei desterrar ao Conde de Soure dentro de três dias, para Loulé de onde não sairia sem nova ordem e esta lhe passou o Secretário António de Sousa de Macedo e na mesma forma a D. Pedro de Castelo Branco Conde de Pombeiro para Pombeiro.

Segunda-feira 28 de Agosto de 662 foi Sua Majestade como costumava Alcântara onde para maior entretenimento seu havia Luís Mendes de Elvas mandado ter catorze touros que à sua conta se compraram. Estava dentro da Tapada feito hum curro capaz em que S. Majestade toureou acompanhado do Conde de Castelo Melhor e do Visconde D. Pedro de Lima seu estribeiro-mor ainda que Sua Majestade se viu alguma vês em bastante perigo se fizeram muito boas sortes. Na tarde do mesmo dia, se correram no Pátio da Quinta do Conde de S. Lourenço dez destes 14 touros tendo-se naquele sítio preparado também Palanques e lugar decente para Sua Majestade e altura estarem que pela manhã foi em segredo. Tourearam os filhos de António Galvão estribeiro-menor Francisco e Manuel Galvão a este posto que de 12 anos de idade fez também sua obrigação como se tivera muitos de ofício. Acabados de comer entrou Sua Majestade para uma Casa onde se lhe tinha preparado merenda de doces com grande aparato de pratos e copos. Tocou Sua Majestade num prato e saindo-se da casa entraram noutra os cavaleiros que o acompanhavam e os mais que foram a ver a festa que para todos havia grande quantidade correndo toda a despesa por conta de Luís Mendes de Elvas que acrescentou com pipas de vinho e prémios aos toureiros de pé que faziam as sortes.

Este dia às seis horas da tarde pariu D. Francisca Maria de Meneses mulher de D. Diogo de Faro e Sousa filho do Marquês de Soure Gaspar de Faria Severim uma filha que se chamou D. Joana Agostinha de Faro

Sábado 9 de Setembro de 662 fez El-Rei mercê a D. Manuel da Câmara filho de D. Rodrigo da Câmara Conde de Vila Franca de lhe dar o titulo de Conde da Ribeira Grande de juro e herdade com todas as mercês que o Pai possuíra e havia perdido por ser prezo pelo Santo Ofício da Inquisição como compreendido no crime de pecado nefando e como tal sentenciado.

No mesmo dia nomeou El-Rei por Governador da Universidade de Coimbra a Rodrigo de Miranda Inquisidor de Lisboa irmão de Henrique Henriques de Miranda mas sem consulta da Mesa da Consciência e ordens, nem nomeação da Universidade viu-se o valimento de Conde de Castelo Melhor pois até aqui abrangeu.

Domingo 10 se baptizou D. Joana Agustina de Faro filha de D. Diogo de Faro e de D. Francisca Maria de Meneses na Igreja dos Mártires foram Padrinhos o Conde Castelo Melhor e a condessa de Mesquitela D. Joana Maria das Brotas e Meneses: baptizou-a seu tio Frei Luís de Faro Religioso São Domingos digo Santo Agostinho

No mesmo dia se foi para o Mosteiro da Encarnação de Lisboa de donas da ordem militar de Avis D. Filipa de Meneses mulher de Gaspar Vieira da Silva filho mais velho de Pedro Viera da Silva deixando a seu marido, mas dali a poucos dias se tornou a recolher a sua casa.

Quarta feira 13 foi El-Rei e o Infante lançar fora a armada Real de que foi general o Conde da Atouguia do Conselho de Estado e do despacho ordinário e por Almirante Luís Velho que tinha vindo de Governador da Ilha constava de cinco naus Portuguesas duas de El-Rei e três da Companhia Geral e todas se uniram com seis inglesas que estavam esperando fora da Barra.

Sábado 16 mandou Sua Majestade preso para a Torre Velha a Martim Correia de Sá filho de Salvador Correia de Sá por umas razões que teve no pátio da capela com o Marquês de Marialva e Conde de S. Lourenço sobre haver S. Majestade sequestrar e vender uns açucares e tabacos que o Pai mandara do Rio de Janeiro impondo-lhe a eles ser resolução sua e não de El-Rei que não mandara nada.

No mesmo dia sábado 16 de Setembro nomeou El-Rei Conselheiro de Estado ao Conde de Castelo Melhor e de despacho ordinário do Reino: Vendo-se sem Serviço e só de 26 anos de idade nos maiores postos, e honras que muitos não alcançaram depois de largos anos de Serviço e merecimentos.

Domingo 17. se celebrou em Lisboa auto de fé em que pregou Frei Bartolomeu Ferreira Provincial da ordem de S. Domingos. Saíram 40 homens e 25 mulheres. Foram relaxados em carne 6 homens e duas mulheres entre os quais foi Nuno Fernandes e Carvalho cuja confiscação dizem que importou mais de 700 mil cruzados. Duas estátuas de ausentes e uma com os ossos de uma defunta nos cárceres do Santo Ofício El-Rei os foi ver queimar rebuçado.

Sábado 23. de Setembro de 662 chegou de Inglaterra por Embaixador ordinário a El-Rei nosso Senhor Dom Ricardo Fanchao que no governo da Rainha nossa Senhora e se tratava o Casamento da Senhora Infanta D. Catarina com Sua Majestade Britânica lhe havia trazido umas cartas com tratamentos de Enviado. Trouxe sua mulher e filhos e desembarcou 5.ª feira à tarde 28 do mesmo mês; e está aposentado na quinta que está junto a Igreja de S. Sebastião da Pedreira e foi do Duque de Aveiro Conduziu o Conde de Aveiras que o levou também para a audiência Domingo o primeiro de Outubro

Domingo primeiro de Outubro de 662 se despediu do serviço do Infante D. Pedro Rui de Moura Teles Presidente do Desembargo do Paço mandando pedir à Rainha o houvesse assim por bem. Deram diferentes motivos a esta novidade porque a consideração por lisonja a El-Rei a esta bastante para o conservar na Presidência que ocupa: ainda que já não tão eficaz como seria em algum tempo pela diferença que nesta faz a amizade entre os Irmãos muito entrada modernamente. Outros afirmaram se originara o enfado de Rui de Moura de palavras ásperas ditas pelo Infante pelejando porque lhe mandara fechar certa porta falsa pela qual dizem, saía Sua Alteza ou lhe entrava alguém,

Sábado 14 do próprio deu a Rainha audiência particular à mulher do Embaixador de Inglaterra, que foi falar a Sua Majestade em um Coche de cavalariça acompanhada de três filhas duas criadas e 4 gentis-homens a Cavalo. Falou-lhe a Rainha, sentada em cadeira e ela em tamborete raso as filhas se assentaram entre as Damas todas de muito lindas caras, e igual ornato. Conduzias Manuel Caldeira de Castro como tenente da Guarda de El-Rei e de trás do Coche de Sua Majestade em que a Embaixatriz se recolheu para sua Casa a foi acompanhando seu marido em uma liteira própria.

Sábado 20 de Setembro aportou em Lisboa a Armada de que foi por General o Conde de Atouguia com a Capitania e Almirante e dois Navios mais Portugueses, e cinco Ingleses que a foram comboiando vindos da ria de Vigo - em Galiza que foram demandar com intenção de assenhorear aquela Vila; mas como não tomaram nem o Porto, nem em Viana a Infantaria que ali se tinha mandado fazer prestes por razão de estar o nosso exército em Campanha na Província do Minho e senão querer desfazer dela o Conde do Prado que governa as Armas entraram só na ria os navios Portugueses, sem lançar gente em terra e aos canhonasos [a tiros de canhão] destruíram a Vila de cujo castelejo lhe tiravam algumas peças com pouco dano, porém porque sem o fazerem nas Embarcações mataram só o Sargento-mor e um Capitão com alguns soldados os mais por desastre, e achando lá a Capitania e Almiranta da Esquadra de Flandres acompanhada de mais dois Navios agora vinte e tantos vasos menores artilhados todos não quiseram pelejar com os Portugueses, os quais com esta glória se recolheram a Lisboa.

No mesmo dia chegou também da Inglaterra o Conde de Pontével Nuno da Cunha de Ataíde com a Condessa sua mulher D. Elvira de Vilhena filha de D. João de Sousa da Silveira os quais tinham ido acompanhando a Rainha D. Catarina de Grã-Bretanha. Ela por Dama e ele como desposado com o tratamento que a D. Elvira se dera por esta viagem afora outras muitas mercês que pela mesma causa se fizeram

No mesmo sábado chegou nova do Conde de Vila Flor D. Sancho Manuel haver restaurado o Forte de Escalhão na Província da Beira onde governa as Armas. Este Forte havia feito este Verão o Duque de Ossuna Governador das armas daquela parte de Castela que confina com a Beira. Valendo-se de o Conde se achar sem gente por haver mandado de socorro à Província de Alentejo mas o Conde sem embargo de tudo o buscou com a que tinha e ganhando-lhe uma gloriosa vitória depois de o fazer fugir à vista do seu exercito lhe rendeu o Forte em que estavam 300 soldados escolhidos e o deixou com presídio mas depois corrido o Duque da afronta e remediou comprando a fé ao Cabo Português que então a guarnecia. Vinte mil cruzados foi o preço e estes valerão tanto que o mesmo que devia defender o Forte rejeitou novos socorros que o Conde lhe mandava meter dentro pressentindo acautela do atenção do inimigo. Porem onde não valeu o discurso prevaleceu a força por que o Conde juntou logo a sua gente que eram 3 mil infantes municionados e 600 cavalos e animando-se-lhe 6.ª feira 13 de Outubro apesar de 400 soldados pagos e 50 cavalos que guardavam o Forte ao Domingo 15 ao meio dia estava Senhor dele. Da primeira / jornada e Batalha se imprimiu uma Relação por menor deste sucesso e foi o segundo mais glorioso pelo grande empenho do Duque e sentimento com que o Conde estava da aleivosia do Cabo de que se fiara.

3.ª feira 31 de Outubro entraram em Lisboa os capitães João da Silva Barbosa e António da Costa que em dois navios tinham saído a socorrer a Armada do Conde de Atouguia e desencontrando-a no caminho toparam um Navio Francês que trazia mercadorias para Portugal e estava já pela mesma causa aprisionado pelos galegos; mas chegando a avistar-se com estes fizeram nossa a que era presa sua e obrigando-os a fugirem, e meteram em Lisboa muito a seu salvo.

Sexta-feira 10 de Novembro de 662 se fez a prisão de António de Andrade de Oliva de entrega por antenomasia: mas para vir em conhecimento de quem ele seja é necessário tomar a narração muito de atrás. Foi este homem de honesta geração, mas que não anda nos livros da genealogia. Em seus primeiros anos tomou o hábito da ordem de S. Francisco de donde saindo-se anulou a profissão; teve espírito inquieto trocista ágil, esperto, e engenhoso. Conhecido por tal é voz p.ca que Sebastião César de Meneses filho de Vasco Fernandes César Provedor dos Armazéns e armadas reais de Conselho de Estado e Junta dos Três Estados Bispo eleito do Porto Coimbra e Arcebispo de Lisboa e seu Irmão Frei Diogo [?] César Provincial da ordem de S. Francisco da Província dos Algarves se valeram dele (ou pelo trato da religião ou por outro particular) para lhe fiarem a comunicação que dizem vulgarmente tinham com El-Rei de Castela mas o mensageiro reconhecendo o perigo da jornada e do risco que lhe resultaria se fosse descoberta a conjuração quis ele ser o anunciador e assim estando em Alcântara El-Rei D. João o 4.° e agasalhando-se António de Andrade em umas casas de fronte das em que pousava o secretário Gaspar de Faria lhe ensinou tinha negócio de grandíssima importância que comunicar a S. Majestade. Referiu o Secretário a El-Rei o que passava e deferindo-se-lhe o sujeito alcançou a audiência e com todo o recato que a matéria do negócio pediu entrou o Andrade na tapada por uma porta falsa que nele há, e no campo começou a referir a El-Rei as circunstâncias que não chegaram a muitos. Continuaram-se as audiências e experimentaram-se as verdades das quais procedeu a prisão do Bispo eleito que então era de Coimbra e de seu Irmão Frei Diogo, entendendo tanto o Reino que ele fora o descobridor que se lhe pôs a alcunha de entrega, e El-Rei com efeito o mandou entregar a Pedro César de Meneses e a Luís César Irmão dos presos para a todo o tempo lhe darem conta dele. Passados muitos tempos tornou a recocitar António de Andrade fazendo várias jornadas a Castela por ordem da Rainha Regente e nas últimas já com tanto nome que se publicavam e veio a ter passaportes de El-Rei de Portugal e do valido de Castela para passar de um ao outro Reino e mandar correios sobre as pazes entre eles acerca das quais se tinha tratado pelo Conde de Soure Embaixador de Portugal a El-Rei de França no tempo que em S. João de Luz se ajustaram as de Castela com o Cristianíssimo, e depois as veio tentar a Lisboa Monsiur de Chup; mas não sortindo então efeito se continuou a pratica por Andrade que teve o mesmo levando ele entretanto grossas ajudas de custo nas Cortes de Madrid e Lisboa afora outras mercês que nesta se lhe fizeram. Desvanecido o negócio e despuzado totalmente no Governo de El-Rei D. Afonso particularmente por se abrir o trato dele por João Nunes da Cunha e o Conde de Tarouca Marquês de Penalva em Castela nos Exércitos que campeavam na Província de entre Douro a Minho, ficou Andrade e muito diminuído no Crédito mas não na agência ; por que com esta se soube introduzir de modo na graça de El-Rei que muitos tempos antes da sua prisão ia todos os dias gastar com S. Majestade muitas horas deputando-se-lhe para este efeito as sucessivas depois de El-Rei jantar. Em estas práticas afirmam os que tem maior inteligência do Palácio: que Andrade afiava demasiadamente a El-Rei o ruim Governo presente aconselhando-lhe admitisse a ele sua Mãe como Rainha e o Conde de Cantanhede Marquês de Marialva como o primeiro sujeito em autoridade e lugares da sua Monarquia e que El-Rei estava de modo combalido as persuasões que faltava pouco que não lhes deferisse com efeito; Suspeitosos o Conde de Castelo Melhor e Atouguia e Arcebispo eleito de Lisboa de que se ardia e como a mina saiu fabricando a faze-los voar ganharam por mão os intentos, e impondo a Andrade crimes de tão alta natureza e horrendos de executar alcançaram depois de grandes baterias a permissão para o fazerem prender. Conseguida esta às mesmas horas em que António costumava ir falar a El-Rei se mandou recado ao Corregedor da Corte Duarte Vaz de Orta Osório se achasse no Paço: entretiveram a António de Andrade nas Casas exteriores do Paço até ser chegado o Corregedor e como o foi lhe disse o Conde de Castelo Melhor que na sua Casa que tem no Forte tinha certo negócio que comunicar-lhe entraram para ela e depois de despedida a gente que ali se achava o Conde o entregou ao Corregedor o qual o levou logo para uma Casa baixa do Forte, onde ficou. Dizem que nestes breves Passos foram Copiosas as lágrimas do preso, e que logo pediu a confissão de que o Padre Mateus de Figueiredo da Companhia chamado para este sacramento ficara muito satisfeito. Nas algibeiras se lhe acharam umas moedas incógnitas com caracteres desconhecidos e um papel que continha serviços feitos à Coroa de Castela. O crime que dão por causa para a prisão é o de inconfidência justificado mais pelo tal papel e pelas moedas que nomeiam familiar mas contra ambas as presunções se achou bastante reposta porque à fidelidade o servem as provas passadas e não saber da prisão o Desembargador Pedro Fernandes Monteiro do Conselho de El-Rei e Desembargador do Paço Presidente ou Cabeça da Junta da Inconfidência e por cuja mão correm todas as matérias que tocam a este crime; e no papel referido se pode fundar menos porque é (conforme se entende) a Cópia de outro desta instância que ele com permissão da Rainha deu em Madrid a D. Luís de Haro para corar mais a fidelidade com a Coroa de Castela, a assim terem melhor aceitação as propostas para as pazes com Portugal. Deste crime a sua prisão tratou o Desembargador Duarte Vaz de Orta de quem falámos. Os que melhor discursam nas aparências: dizem ser o seu crime a parcialidade com o Marques de Marialva e pelo conseguinte a oposição aos validos. Mas estes há certeza lhe dão causas da qualidade que nem se podem imaginar que mais escrever. O certo é que Sebastião César viu na mesma prisão e quem nela o meteu e o fez estar 8. anos e que não havia concorrer a vingança com muita ruim vontade.

Quarta feira 15 de Setembro às 6 horas da tarde faleceu em Lisboa nas Casas da moeda Antão de Faria Severim filho de Gaspar de Faria Severim e de D. Mariana de Noronha de um acidente de ar e [a]poplexia que lhe deu sobre uma leve doença de que se achava em cama. Foi a enterrar ao Mosteiro da Madre de Deus na Capela de Santa Anta que seu Pai ali comprara.

Sábado 18 do próprio mês beijaram a mão a El-Rei o Conde da Ericeira D. Fernando de Menezes do Conselho de Guerra Pedro César de Menezes do mesmo Conselho Dom Diogo de Menezes, António de Miranda Henriques, Rui de Figueiredo de Alarcão e Rui Fernandes de Almada Provedor da Casa da Índia pelas mercês que lhes fizera de os nomear gentis homens da Câmara do Infante D. Pedro a quem logo começaram a servir no Domingo seguinte.

Sexta feira 24 do próprio beijam a mão a El-Rei Manuel Teles da Silva pela mercê que lhe fizera do título de Conde de Vilar Maior que seu Pai Fernão Teles de Menezes tivera o qual serviu de Mordomo mor da Rainha e foi governador das armas da Província da Beira e gentil homem da Câmara do Príncipe D. Teodósio Mouco servindo de Mordomo Mor e ainda assim afirmam dera o filho um bom donativo pelo título.

3.ª feira 29 de Novembro do mesmo ano de 1662 foi primeiro dia em que se despachou na nova Junta Geral digo Junta da Companhia Geral do Comércio. Formou-se ela da corrupção e extinção da outra antiga deste título que havia formado El-Rei D. João o 4.° de homens de negócios os quais tinham seu Tribunal nas Casas que o Marquês de Castelo Rodrigo fizera no sítio a que chamam Corte Real para onde depois se mudou o Infante D. Pedro por El-Rei seu Pai lhos haver dado. Houve queixas da ruim administração da fazenda e com que os deputados se governavam [d]esperdiçando (segundo diziam) grandes somas em ordenados e propinas desnecessárias de modo que deixaram de pagar os réditos e avanços de direito que naquela bolsa comum tinham metido os interessados uns por sua vontade e obrigados por força todos os homens da Nação Hebraica do Reino. Com esta causa se formaram várias vezes diferentes juntas para examinarem os livros da razão da Companhia e a última se fez depois de El-Rei tomar o Governo. Presidindo nela o Visconde de Vila Nova D. Diogo de Lima. Contudo antes se [abrigam] o que neste particular se poderia descobrir se mandou à Junta parar com seu exercício e na Alfândega depositar os direitos do comboio que se lhe pagavam. Assim se executou em breves dias esquecendo os serviços que a Junta havia feito de ser a principal causa da restauração de Pernambuco e Capitanias do Brasil de vários empréstimos consideráveis com que havia acudido aos apertos do Reino com 120 mil réis que deu para dote da Rainha de Inglaterra e outros se extinguiu a junta e em seu lugar se criou outra derrogando-se o contrato que fizeram os homens de negócio com El-Rei e os Privilégios e isenções, que lhe tinha concedido e andam impressos. Constou a nova junta de hum Presidente que foi o Conde da Atouguia de dois Deputados António de Miranda Henriques e o Desembargador João Leite de Aguilar Desembargador dos Agravos da Casa da Suplicação por parte da Nobreza e por parte do Comércio João Guterres Manuel Martins Medina Gaspar Gonçalves de Sotto e pelo Povo Manuel Ferreira e Secretário Pantalião Figueira. Tem o Presidente 1 mil Cruzados de ordenado os Deputados 300 Mil reis e 200 Mil o Secretário. O Decreto para a nova formatura se passou em 23 de Novembro de 662.

Quarta feira 6 de Dezembro do mesmo ano entraram certos homens em casa de Luís Mendes de Elvas Conselheiro da Fazenda e Secretário da Junta dos Três Estados, e arrombando-lhe o escritório lhe levaram de uma gaveta vinte e cinco mil cruzados em ouro, e hum hábito de diamantes que valia cinco. Passou El-Rei decretos porque perdoava os Crimes a quem descobrisse este e prometia alvíssaras. Delatou um criado seu por nome António Serra e da sua confissão e outros indícios de várias devassas que se tirarão sobre o caso se acharam três cúmplices que todos entenderam pelo rumor do povo senão faltaria na matéria. Assim sucedeu, mas apertando-se mais no caso se lhe restituiu tudo por mão de hum Religioso; menos dois cruzados.

Domingo dez do próprio mês de Dezembro desceu decreto ao Conselho de guerra para se Consultar o Governo das armas de Alentejo sem dependência do Marques de Marialva. Tinha o Marques ido aquela Província por Capitão General dela o Verão antecedente quando se tirou ao Conde de Atouguia e como no governo de El-Rei parece lhe não soprava tão favorável o vento do valimento por ter a graça Real os Condes, e Arcebispo de bando contrario; quiseram estes obrigá-lo a fazer a jornada no Outono. Precederam vários recados que levava a Luís Mendes de Elvas e outras tantas escusas, e vindo ultimamente a desconchavar; se nomeou o Conde de Mesquitela D. Rodrigo de Castro para ir o Alentejo por Governador das Armas, subordinado contudo ao Marquês.

Foi o Conde, e servindo com todo o cuidado e diligência havia poucos dias se tinha recolhido a sua gravemente enfermo de uns vómitos, e fraqueza. Estando ainda sem se desesperar de sua saúde, e sem o ouvirem lhe mandaram consultar o posto; murmurando o povo que com esta acção se fizeram dois grandes agravos a dois dos maiores homens de Portugal. Ao Marquês porque totalmente o excluíram de Alentejo, a ao Conde porque vindo do serviço tendo a sua patente na mão havendo procedido como devia, e achando-se enfermo pelo muito que trabalhara em utilidade da Província lhe mandava consultar o seu posto sem lhe darem satisfação nem o ouvirem.

Segunda-feira 19 do próprio mês às três horas da manhã faleceu o Conde de Mesquitela D. Rodrigo de Castro do achaque da fraqueza de estômago, e desfalecimento de forças que tinha trazido de Alentejo. Foi sepultado no Convento dos Religiosos de S. Domingos Hibérnios às fangas da farinha junto a Frei Domingos do Rosário Bispo eleito de Coimbra. Diz-se por ele: que como os Mártires da Igreja morreram por defendê-la ele falecera por conservar o Reino e acrescentar sua casa.

Sexta-feira 5 de Janeiro de 663 fez El-Rei mercê a Sebastião César de Meneses Arcebispo Eleito de Lisboa de o nomear Inquisidor Geral de Portugal e porque ficasse com o carácter do Arcebispo o nomearam com o novo Título de Arcebispo de Fez.

Terça-feira 9 do próprio morreu uma filha do Conde de Castelo Melhor nascida de poucos dias. Foi a enterrar a S. José de Ribamar Convento de frades da Província da Arrábida. Pegaram no caixão em que foi o Marquês de Nisa, os Condes de S. Lourenço pai, e filho e Rui Fernandes de Almada. Levou o caixão seu tio Bispo Eleito de Angra e frade Bento em uma liteira onde ia com ela, e o caixão na cadeira de Trás. Foi de noite. Achou-se em sua Casa toda a nobreza cortejando o valimento e acompanhavam-na alguns Coches de parentes, e amigos.

D. Sancho Manuel Conde de Vila Flor chegou a Lisboa segunda-feira 8 de Janeiro vindo da Província da Beira onde era governador das Armas, chamado para o ser da Província do Alentejo: porque ainda que o Conde de Atouguia fora proposto para este governo em primeiro lugar, por se lhe querer fazer lisonja como a valido; a necessidade do Reino requeria hum homem como o Conde de Vila Flor; e por esta causa lhe escreveu El-Rei a Beira se partisse logo direito a Estremoz; mas o Conde se veio a Lisboa a representar conveniências do Real serviço e foi recebido com todo o agrado, e respondido se determinou logo ir buscar sua casa como o fez.

Sexta-feira 19 do mesmo às duas horas de madrugada partiu El-Rei e o Infante para Salvaterra. El-Rei se embarcou em um Bergantim que não era o Real, e o Infante com outro de Henrique Henriques. Foi El-Rei deitado na cama, com sua companhia o Conde de Castelo Melhor e o Marquês de Fontes. Acompanharam-no Oficiais da Casa em várias embarcações; Convidou para a mesma jornada os Fidalgos seguintes O Conde de Unhão, o Conde de Aveiras, Lourenço de Mendonça, Bernardo de Miranda, Jorge Furtado, Luís Lobo, Diogo Luís, Henrique Henriques, D. Luís de Lencastre, Cristóvão de Almada, o Conde de Sarzedas, o Conde de Serem, Jorge Furtado de Mendonça, e António Cavide, e o Conde de Mesquitela. D. Noutel Luís de Castro E Sua Alteza levou os seus criados.

Sábado 20. se partiu o Conde de Vila Flor à Beira a buscar sua casa para fazer jornada a Alentejo.

Domingo 21 baptizou o Conde da Torre um filho seu esperando para o fazer que se lhe acabasse de bordar um Coche que dizem passara o custo de sete mil cruzados entendendo alguns o mandara fazer por mostrar nele a pouca estimação que fazia dos valimentos e o pouco que se lhe dava do agravo que lhe haviam feito em o tirarem de General da Cavalaria de Alentejo com que servira; e nomeando em seu lugar a Diniz de Mello de Castro, e assim eram os remates do jogo do Coche quatro mãos dando figas.

E ao outro dia se partiu com toda sua casa para a sua quinta que chamam da Ocharia no campo de Santarém.

Os Padrinhos do Baptismo foram D. Pedro de Almeida Cunhado do Conde, e a Senhora D. Guiomar mulher de D. Rodrigo de Meneses Regedor da Justiça.

Segunda-feira 22. Indo El-Rei à Caça em Salvaterra tiveram uma pendência o Marquês de Fontes D. Francisco de Sá e Meneses, e o Conde da Mesquitela D. Noutel Luís de Castro, e acudindo por este seu cunhado Pedro Severim os apartaram Sua Majestade e Alteza mas logo tomou o Conde de Castelo Melhor em presença de El-Rei aos mãos de amigos a todos três, e daí a pouco espaço levou o Conde prezo ao Marquês para sua Casa, e D. Francisco de Sousa Capitão da Guarda ao Conde de Mesquitela ficando Pedro Severim solto ; porem fazendo-se conselho à noite se assentou o prendessem também o que se fez à 4.ª pela manhã, e à 5.ª o trouxe a ele, e a Conde Miguel Juzarte Corregedor do Crime da Corte, e Casa ao Conde para a Torre de S. Gião [Julião da Barra], e a Pedro Severim para a Torre velha e na quinta trouxe o Corregedor que então servia o Desembargador Pedro de Carvalho ao Marquês para o Castelo de Lisboa.

Terça-feira 23 morreu ao Conde de Castelo melhor seu filho único de idade de um ano que foi a enterrar na mesma forma, e à mesma parte que sua irmã.

Quinta feira se partiu desta Cidade de Lisboa D. João da Silva Marques de Gouveia em direitura a Coimbra para daí se passar às suas terras desgostoso do ruim acolhimento que achava em El-Rei e seus validos por se lhe haverem quebrado as isenções, e regalias de seu oficio de Mordomo Mor de El-Rei que serviram seus passados; e a principal ocasião conforme diziam era porque sendo prerrogativa do seu Regimento despachar vocalmente com El-Rei as consultas que ele mesmo fazia e levava tocantes aos filhamentos na Casa Real, e provimentos dos ofícios menores dela; então se lhe não permitia faze-lo; mas antes sem que ele soubesse despediu El-Rei e proveu alguns ofícios, e fez assentar moços da Câmara, e outras coisas semelhantes; mandando-lhe pedir as Consultas, e saindo delas os despachos sem sua intervenção; Escandalizado destes procedimentos que com ele se usavam o Marquês pediu licença para sair para as suas terras não se lhe deferiu à primeira instância repetiu-a, e respondeu-lhe o Secretário de Estado António de Sousa que Sua Majestade lhe dava a licença, mas que não viria sem outra ordem sua: depois de receber esta se deteve alguns dias na Corte até que no dia referido se foi levando consigo a Marquesa sua mulher e sua família.

Terça-feira 6. de Fevereiro do mesmo ano de 663, às oito horas da manhã chegou El-Rei e o Infante seu irmão das coutadas de Salvaterra onde haviam estado caçando, e de onde partiram a noite antecedente. Por mar fizeram a jornada, e aportando junto ao Cais do Carvão, fez o Infante horas em Casa de Henrique Henriques de Miranda Tenente General da Artilharia até virem os Coches que de antes se mandavam preparar para fazer a entrada detendo-se El-Rei no entretanto no Bergantim em que passara o Rio. Foram direitos até a fazer oração e voltaram-se para o Paço; mas não ao quarto da Rainha suas Mãe a quem não tomaram a bênção como nem o haviam feito quando se foram: sendo estilo, e cerimónia sempre usada fazerem esta todas as vezes que saíam da Casa, ou se recolhiam a ela ainda quando era só por horas. À tarde foram à Igreja de S. Roque Casa Professa dos Religiosos da Companhia a Cavalo, e de gala de Campo, com plumas, e ostentações festivas.

No mesmo dia foi o Desembargador Pedro de Carvalho com Decretos Reais soltar ao Conde de Mesquitela que estava preso em S. Giaõ [Julião], e a Pedro Severim que o estava na Torre Velha; porque na tarde antecedente em que recebeu as ordens havia solto o Marquês de Fontes que estivera no Castelo.

Sábado 10. descia Decreto o Conselho de Guerra para nele haver despacho todos os dias excepto os de guarda pecado mortal enquanto se dispunham as coisas tocantes ao governo de Alentejo, e seu exército.

Segunda-feira 12. recebeu o Desembargador Miguel Juzarte de Azevedo Corregedor do crime da Corte, e Casa um Decreto para prender ao Desembargador António de Sousa de Tavares do Conselho de el-Rei seu Desembargador do Paço, o que havia sido Secretário do Estado de Bragança e do Senhor Infante. Com esta ordem se foi esperar a Capela passeando no pátio dela à porta do Desembargo do Paço. Quando deste Tribunal saiu António de Sousa se lhe fez encontradiço, e o foi como acompanhando para a sala que chamam dos Tudescos que é a por onde se entra para os quartos das Casas Reais. Antes de subir a Escada, e no meio dela perguntou António de Sousa se lhe queria alguma coisa, como estranhando a novidade respondeu Miguel Juzarte com o silêncio, e à segunda instância, que na Sala lho diria: chegado a esta lhe manifestou a ordem da prisão, e que se estendia a ser na Torre de Outão defesa da barra da Vila de Setúbal. Assustou-se como era justo o preso e pediu-lhe fossem a sua casa para mudar de vestido e se prover do mais urgente. Esta permissão negava a Ordem; e em sua observância se foram dali embarcar com becas ambos, e com provimento nenhum fazendo sua jornada a Outão onde ficou António de Sousa. Aquela tarde foi hum Desembargador da Casa da Suplicação à do preso e lhe inventariou todos os papéis sem tratar contudo dos móveis ou fazendas.

No mesmo dia escreveu o Secretário António de Sousa de Macedo um escrito a Luís de Sousa irmão do Conde de Miranda Embaixador aos Estados de Holanda e que em sua ausência governava a Relação e Casa do Porto, como fazia ao Bispado de cuja Sé era Deão : Continha o escrito que Sua Majestade havia por seu serviço que ele dentro em vinte a quatro horas se fosse para a Vila de Abrantes de donde não sairia sem outra ordem Real.

 


Notas:

Normas de transcrição: Desenvolveram-se todas as abreviaturas e capitalizaram-se todas as palavras que utilizam maiúsculas, como sejam os apelidos. Não se modernizou os arcaísmos, tentando sempre que possível explicá-los. 

Fonte:

António de Sousa de Macedo,
D. Afonso VI ..., (edição de Eduardo Brasão),
Porto, Livraria Civilização, 1940


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