Araújo
(José
Gregório da Rosa).
n.
17 de novembro de 1840.
f.
26 de janeiro de 1893.
Comerciante;
deputado, par do Reino, presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Nasceu
nesta cidade a 17 de novembro de 1840, onde também faleceu a 26 de
janeiro de 1893.
Era
filho de Manuel José da Silva Araújo e de Eulália Rosa da Silva
Araújo, de quem herdou uma fortuna colossal granjeada em improbo
labor quotidiano, e o amor e dedicação ao trabalho. Seu pai estava
estabelecido com unia importante confeitaria na rua de S. Nicolau,
estabelecimento que seu filho sempre conservou, e onde entrou em
1853 na. companhia de seu pai, tendo apenas treze anos de idade,
incompletos. Cursara os estudos primários no colégio de Santo
Agostinho, que começou a frequentar aos seis anos. Nessa curta
idade deu então principio à sua vida comercial. No estabelecimento
falava-se em politica, que, era da particular predilecção de seu
pai, e decerto foi esse o motivo que o resolvera a assentar praça
por ocasião das lutas civis que terminaram em 1834, tornando-se
mais tarde patuleia exaltado na guerra da Maria da Fonte, em
1846; fora sócio do Clube dos Camilos e influente nas
eleições.
Tudo isto, porém, praticara aquele respeitável chefe de família,
com um desprendimento verdadeiramente exemplar, detestando a ostentação,
e simplesmente firmado no desejo de concorrer por essa forma, na
medida das suas forças, para o bem da pátria. A uma singeleza de
costumes juntara sempre a maior rigidez de princípios e a mais alta
sinceridade de convicções.
Foi
depois de 1857, daquele ano lastimoso em que a febre-amarela tantas
vítimas causou, que Rosa Araújo começou a inscrever-se em
diferentes associações, tornando-se um grande trabalhador pela
causa popular, prestando muitos serviços que lhe granjearam as
maiores homenagens. Foi pelas associações que principiou a sua
carreira pública. Pertencia também a diversas companhias
comerciais, distinguindo-se sempre pela sua extraordinária
actividade, iniciativa inteligente e empreendimentos úteis e
rasgados. Nessas empresas, em que era muito estimado e respeitado,
tomou parte em diferentes comissões de exames de contas, de reforma
de estatutos, e até de inquérito. Nas associações ocupou o cargo
de presidente no Grémio Popular, na Associação homeopática, e na
Fraternidade, de socorros mútuos; vice-presidente
na Associação dos empregados do comércio e indústria, e
da Irmandade do Santíssimo, da igreja de S. Nicolau, uma das
associações que mais serviços prestava à pobreza da capital. Nas
companhias exerceu as distintas funções, de presidente na de Tabacos
nas barreiras de Xabregas, vice-presidente da Fidelidade, secretário
da Bonança, Algodões de Xabregas, das Lezírias do Tejo
e Sado, e da antiga companhia do Gás, sendo também
director efectivo da de Crédito Comercial.
No
fim de outubro de 1871, Rosa Araújo tratava unicamente dos negócios
relativos à laboriosa casa de seu pai, e dos que mais directamente
interessavam ás associações e companhias a que estava ligado,
quando recebeu um convite do governador civil de Lisboa, então
Augusto César Cau da Costa, para fazer parte da lista da eleição
municipal. Rosa Araújo recusou; mais tarde foi novamente instado, não
só pelo governador civil, como também pelo falecido estadista António
Rodrigues Sampaio; Rosa Araújo persistiu firmemente na sua recusa,
e somente se resolveu a aceitar tão honroso convite, quando seu pai
interveio, decidindo-o com os seus bons conselhos. Figurou então
pela primeira vez na vereação da câmara, em fevereiro, no biénio
de 1872 a 1873. Nesta gerência logo se distinguiu, com
especialidade pela resolução tomada cerca das concessões dos
carris de ferro, dando em resultado estabelecer-se definitivamente
na capital esse sistema de viação, em substituição do antigo
formulário das licenças, e ainda mais pelo novo sistema de imposto
e pela nova marcha financeira, inaugurada pelo primeiro empréstimo
de cento e sessenta contos de reis, contraído por intervenção do Banco
Lusitano. A resolução dos negócios relativos aos carris de ferro
foi devida principalmente ao estudo e ao bom conselho de José Elias
Garcia, em substituição do formulário das licenças e do trabalho
iniciador de Geraldo Braamcamp, que deixara saudosas recordações
na administração municipal. Rosa Araújo foi quem contratou o empréstimo,
depois de terem sido infrutíferos todos os esforços empregados
pela vereação anterior, e mesmo por aquela de que fazia parte na
mesma ocasião. De acordo com o Sr. Francisco Simões Margiochi,
conseguiu que o ministro da fazenda, então o falecido estadista António
Serpa, apresentasse ás cortes um projecto de lei, elevando, a dotação
da câmara a quinze contos de reis, o que foi aprovado com o voto unânime
do parlamento.
A
harmonia que existiu no biénio de 1872 a 1873 não se repetiu no biénio
seguinte, em que se levantaram graves conflitos a propósito da
decoração da fachada principal dos paços do concelho, o que deu
em resultado saírem da câmara os vereadores Rosa Araújo, Simões
Carneiro, Dr. Alves e Barros Gomes. Falou-se muito na dissolução,
promoveram-se meetings para esse fim, mas o governo, sendo
ministro do reino António Rodrigues Sampaio, não aceitou a imposição,
apesar de ser muito instado por amigos políticos e dedicados. Pelo
falecimento de sua mãe, Rosa Araújo afastou-se dos trabalhos assíduos
durante algum tempo, mas, em novembro de 1875 tornou a figurar nas
eleições camarárias. Depois de renhida luta, novamente foi
eleito, sendo vereador no biénio de 1876 a 1877, em que a câmara
deu as mais elevadas provas de energia e actividade; devido ao
presidente, o Sr. Luís de Almeida e Albuquerque, alcançou-se a
lei, pela virtude da qual o município ficava habilitado a negociar
os meios precisos para o saneamento da cidade. O mercado da praça
da Figueira foi então muito discutido também, se deveria ser
entregue à especulação particular, e Rosa Araújo, sendo
vice-presidente, combateu aquela ideia, levando o município a
contrariá-la como prejudicial e nociva aos interesses do concelho.
Nessa câmara, sob proposta ainda de Rosa Araújo, resolveu-se fazer
cumprir o artigo 294 do Código Civil, criando o asilo municipal, e
fazendo admitir provisoriamente as crianças no asilo de Maria Pia,
mediante uma mensalidade estipulada. Alugara para esse fim o palácio
do conde de Redondo a Santa Marta, mas a vereação que se seguiu,
ordenou que se pusessem escritos no palácio, limitando-se a admitir
uma ou outra criança no asilo Maria Pia. Mais tarde tornou a ser
eleito vereador, e desde então tomou parte da presidência, lugar
em que depois sempre se conservou. Datam dessa época as grandes
obras municipais que transformaram a cidade. Iniciou as obras do
bairro Estefânia; criou os asilos municipais com escolas para as
crianças; as creches, em 1876, principiando pela de Santa Eulália,
que assim a denominou em memória do nome de sua mãe. Esta creche
é situada no largo da Graça, e foi toda construída à sua custa,
desde os alicerces. Criou os talhos municipais, como meio de obstar
ao monopólio dos marchantes; cooperou quanto pôde para a conclusão
dos Paços do Concelho, e promoveu muitos outros melhoramentos da
cidade, a maioria dos quais foram da sua iniciativa.
A
obra, porém, mais notável foi, sem dúvida, a Avenida da
Liberdade, que só a extraordinária boa vontade e energia de
Rosa Araújo poderia conseguir, lutando com as numerosas
dificuldades que se levantaram para a sua realização. Os
habitantes da cidade, em grande parte, opuseram-se à demolição do
antigo Passeio Publico, chegando a fazer representações à câmara
por causa de atentado que Rosa Araújo
queria cometer. O enérgico presidente da câmara encontrou também
outra dificuldade importantíssima, a falta de dinheiro para
semelhante obra, que exigia avultados capitais. A câmara não
estava habilitada, porém Rosa Araújo possuía algumas dezenas de
contos de réis e não desanimou. Os trabalhos inauguraram-se no dia
24 de julho de 1879, pela demolição do velho teatro das Variedades
e da velha praça do Salitre; seguiram-se as demolições dos prédios
importantes da praça da Alegria, em que os proprietários eram
largamente indemnizados; as demolições prosseguiram à maneira que
as urgências o exigiam, e a vasta avenida concluiu-se, sendo hoje
um dos melhores pontos de reunião da cidade, vistosa e
grandiosamente adornada com edifícios e propriedades sumptuosas,
teatros da avenida e rua dos Condes, hotel magnifico, tendo junto a
estacão central do caminho de ferro, monumento dos Restauradores,
etc. Na ocasião dos festejos do tricentenário de Camões em 1880,
Rosa Araújo tomou parte muito activa nessa memorável comemoração,
cooperando para a criação de bairro Camões. Rosa Araújo foi
deputado, par do reino electivo, e tinha a comenda de Nossa Senhora
da Conceição de Vila Viçosa. Consta que mais de uma vez lhe fora
oferecido o título de visconde, que não quis nunca aceitar.
Era
um bom carácter, trabalhador incansável, amigo sincero e serviçal;
filho do povo, soube elevar-se, conservando sempre a sua vida de comércio,
tanto na considerável confeitaria que herdara de seu pai, como na
casa bancária que estabelecera na rua do Arco do Bandeira. Tendo
predilecção pela política como seu pai, a ela se entregou com
dedicação, que lhe absorveu, por assim dizer, uma grande parte da
sua fortuna. Dotado de extrema bondade e excessivamente caritativo,
a sua bolsa estava sempre aberta para donativos, esmolas, e empréstimos,
de que raras vezes era embolsado; os seus capitais estavam também
sempre à disposição do município.
Criou dois jornais políticos: O
Espectro da Granja, de que foram redactores Eduardo Tavares e
Jacinto Augusto de Freitas Oliveira, e a Gazeta comercial, de
que foi director político o conselheiro Dr. António José
Teixeira. Todas estas liberalidades e grandeza de alma concorreram
grandemente para que a sua fortuna fosse comprometida, levando-o
quase à pobreza. A morte de Rosa Araújo foi muito sentida, e o
funeral uma manifestação imponente e das mais simpáticas, em que
se incorporaram todas as associações, a câmara municipal, vereação,
empregados superiores e pessoal menor, as escolas municipais com os
seus professores e alunos, vestindo o fardamento que então usavam,
levando à frente os seus estandartes, os bombeiros municipais,
voluntários, da Ajuda e da Junqueira, a direcção e professores
dos asilos municipais com uma carreta carregada de coroas, pessoal
do cemitério ocidental levando à frente o respectivo
administrador, empregados da Associação do Comércio e Indústria,
as suas aulas levando os estandartes, carreta com o féretro, muitos
convidados, representantes, da imprensa etc., seguindo todos a pé
até ao cemitério oriental. A câmara dos pares, o ministério e o
partido regenerador fizeram-se também representar. No cemitério
esperavam as crianças dos asilos da Ajuda e do Campo Grande, com os
respectivos directores e professores. À beira da sepultura
discursaram: o Dr. Teófilo Ferreira, um sócio da Associação do
Recreio 11 de outubro, e os Srs. José Bastos, do Ateneu Comercial,
Simões de Almeida, Gomes da Silva e Júlio Ribeiro.