|
|
|
Barbosa
du Bocage (José
Vicente).
n. 2
de maio de 1823.
f. 21 de dezembro de 1805.
Bacharel
formado em medicina pela Universidade de Coimbra, lente de zoologia
na Escola Politécnica, do conselho de Sua Majestade, ministro de
Estado, deputado, par do Reino, um dos fundadores da Sociedade de
Geografia de Lisboa, sócio da Academia Real das Ciências, da
Sociedade de Zoologia de Londres, etc.
Nasceu
no Funchal a 2 de maio de 1823.
Era
primo em segundo grau do popular poeta Manuel Maria Barbosa du
Bocage. A sua ascendência é a mesma da do poeta, e provém do
francês Gil Hedois du Bocage, que chegara a Lisboa, em 1704, na
esquadra francesa que veio reunir-se ao nosso exército, na guerra
contra a Espanha, a qual terminou em 1713, com o tratado de paz de
Utrecht. Gil Hedois ficou ao serviço de Portugal, sendo em 1717
promovido ao posto de coronel de mar e terra (vice almirante).
Casou com D. Clara Francisca Lestof, em 1720, filha de Leonardo
Lestof, cônsul holandês, e rico proprietário, que residia em Setúbal.
Deste matrimónio houve duas filhas: D. Mariana Joaquina Xavier
Lestof du Bocage, que casou com José Luís Soares Barbosa, que foi
o pai do poeta popular Barbosa du Bocage, e D. Antónia Xavier
Lestof du Bocage, que casou com um seu primo materno, Lestof de
Castelo Branco, de cujo casamento nasceu uma filha única, que casou
com Francisco António Soares de Barbosa, irmão do pai do poeta.
Deste consórcio houve um filho, João José Barbosa du Bocage,
cadete do Regimento de Setúbal, casado com D. Josefa Ferreira
Pestana, irmã do general José Ferreira Pestana, par do reino e
lente da Universidade de Coimbra, que muito sofreu, como
constitucional, nas lutas civis de 1828 a 1833, chegando a ser
sentenciado à morte, podendo conseguir a muito custo, que a sentença
fosse mudada em degredo para Angola, donde em 1829 pôde fugir com
destino ao Brasil. Ferreira Pestana viu-se então obrigado, para se
alimentar e à sua família, a estabelecer um colégio no Rio de
Janeiro (V. Ferreira Pestana, José). Nesta empresa o ajudou
seu cunhado, que em 1830 emigrou da Madeira para o Brasil, onde
pouco depois se lhe reuniu sua esposa, cem dois filhos menores, um
dos quais faleceu no Rio de Janeiro, e o outro, que sobreviveu aos
tormentos e angustias daquele tempo de perseguições, que aos sete
anos esteve encarcerado com sua mãe e seu irmão na cadeia do
Funchal, essa criança, para quem a infância foi tão atribulada,
deveria ser no futuro o distinto estadista e notável zoólogo, o
Dr. José Vicente Barbosa du Bocage.
Depois
da emigração, voltaram para o Funchal, em 1834. Até 1868 ali se
conservou João José Barbosa du Bocage, exercendo alguns cargos públicos,
sendo por fim empregado superior da alfândega. No ano de 1839
mandou seu filho para a Universidade de Coimbra, onde se matriculou
em matemática e medicina, fazendo nestas duas faculdades, um curso
brilhante, obtendo prémios em alguns dos anos; concluindo os
estudos em 1846, tomou grau de bacharel em medicina. De novo as
lutas políticas perturbaram o reino; uma enérgica revolução
rebentou contra o governo presidido pelo conde de Tomar, e o Dr.
Barbosa du Bocage alistou-se no Batalhão Académico, que se
organizou às ordens do general Póvoas. Terminada a luta com a
convenção de Gramido, veio para Lisboa exercer clínica, sendo
logo nomeado facultativo do Hospital de S. José. Pouco tempo, porém,
se demorou neste exercício, resolvendo abandonar a medicina, e
dedicar-se de corpo e alma aos estudos zoológicos, que eram o seu
enlevo, e para que tinha decidida vocação. Aos vinte seis anos de
idade, em 1849, foi nomeado lente substituto da cadeira de zoologia
na Escola Politécnica, ficando em pouco tempo com a efectividade,
por ter falecido o respectivo lente proprietário, o Dr. Assis. Em
1851 casou com D. Teresa Roma, filha de Carlos Morato, conselheiro
do tesouro e o primeiro economista português do século passado.
Em
1866 teve a nomeação de membro do Conselho Superior de Instrução
Pública, lugar que exerceu até à dissolução deste conselho, no
tempo do governo do bispo de Viseu, D. António Alves Martins. Tendo
entrado para a Academia Real das Ciências, foi nomeado, em 1875,
seu vice-presidente, em substituição do duque de Ávila.
Dedicando-se depois à politica, filiou-se no Partido Regenerador Em
1878, sendo deputado, concorreu muito com a sua elevada inteligência,
bom senso e prudência, para que fosse resolvida satisfatoriamente a
pendência que se levantara entre Portugal e Espanha, por causa dos
pescadores de ambos os países. Foi também notável o seu discurso
sobre a Guiné. O Dr. Barbosa du Bocage, como verdadeiro
naturalista, fez estudos profundos sobre as nossas colónias,
ocupando-se particularmente do estudo acerca dos seres que as
habitam; mamíferos, aves, répteis, batráquios, peixes, espongiários,
estudando em especial, ora certos animais sobre que vogavam noções
incertas ou erróneas, ora sustentando polémicas interessantíssimas
no ponto de vista científico. Foi assim que o Dr. Barbosa du Bocage
adquiriu conhecimentos geográficos coloniais, que o conduziram a um
lugar distinto na Comissão Central permanente de Geografia, e
depois à presidência da Sociedade de Geografia de Lisboa. É ao
distinto professor que a Escola Politécnica deve também uma grande
parte do seu desenvolvimento em todos os ramos científicos.
Dominava-o uma nobre e benemérita inspiração, a de organizar, sob
sólidas bases, o Museu de Zoologia, dando uma ordem e classificação
racional ao que estava confuso e disperso, enriquecendo as colecções
existentes com exemplares de valor científico, uns adquiridos por
compra, outros
por dádivas importantes, como as do falecido monarca, el-rei D. Luís.
Para coroar esta obra, já de si credora do maior respeito e
consideração, recebeu as colecções, devidamente classificadas,
vindas das colónias africanas da costa ocidental, oferecidas por
José Anchieta, um desses obreiros da ciência, apaixonados pela sua
ideia e que tudo sacrificam para a realizar, sujeitando-se às
maiores dificuldades e trabalhos. (V. Anchieta).
A essas remessas africanas vieram juntar-se as de outro naturalista
viajante, Francisco Newton.
O
Museu de Zoologia, conhecido também pelo Museu do Bocage, é muito
admirado por nacionais e estrangeiros que o visitavam. Em 1881 saiu
eleito par do reino, tomando posse na respectiva câmara, na sessão
de 25 de Janeiro de 1882. Em 1881 também fez parte do Congresso
Geográfico de Veneza, presidindo a sessão zoológica, em que foi
muito apreciado; presidiu igualmente a uma das sessões magnas do
referido congresso. Em 1883, foi chamado pela primeira vez ao ministério,
no gabinete presidido por Fontes Pereira de Mello, e encarregou-se
da pasta dos negócios de marinha e ultramar; em 1890, tomou
novamente parte no ministério, presidido por João Crisóstomo de
Abreu e Sousa, sendo ministro dos negócios estrangeiros. O nome do
Dr. Barbosa du Bocage figura em muitos livros de ciência muito notáveis,
distinguindo-se entre eles, o de Ornithologia
de Angola, fruto de longos anos de trabalho aturado, que foi
recebido com respeito e consideração pelos homens de estudo de
todos os países, que elogiaram o seu autor, colocando-o a par das
primeiras capacidades do mundo científico.
O
Dr. Barbosa du Bocage tem as seguintes honras e condecorações: grã-cruz
da ordem de S. Tiago, do Mérito Naval de Espanha, e de Francisco
José, de Áustria; comendador da ordem da Rosa, do Brasil, de
Isabel a Católica, de Espanha, e oficial da Legião de Honra, de
França.
Nos
últimos anos teve a infelicidade de cegar, mas apesar da sua avançada
idade e dessa deplorável desgraça, ainda em 1903 publicou a sua
obra: Contribution à la
faune des quatre îles du golfe de Guinée. Em 5 de junho do
referido ano de 1903, realizou-se na Sociedade de Geografia uma sessão
solene, presidida por Sua Majestade o rei senhor D. Carlos, em
homenagem ao Dr. Barbosa du Bocage, antigo presidente e um dos seus
fundadores. A homenagem consistiu na entrega da medalha de honra,
significando esse acto o reconhecimento de assinalados serviços à
ciência e à nação. A medalha de honra é de ouro, e foi criada
como suprema distinção, por aquela Sociedade em 1879, e só tinha
sido concedida oito vezes: a José Anchieta, o sábio que tanto
viajou pelos sertões africanos; a Serpa Pinto, Capelas e Ivens, três
nomes gloriosos nas explorações da nossa Africa; a Luciano
Cordeiro, que muitos serviços prestou à sociedade, de que foi
secretário; ao coronel Galhardo, que tanta glória alcançou nas
guerras de África; a Mousinho de Albuquerque, o herói de Chaimite;
e a João de Azevedo Coutinho, que se enobreceu na campanha do Barué.
Foi uma cerimónia imponentíssima e muito comovente.
É
longa a série dos seus trabalhos científicos, de que mencionaremos
os seguintes: Memoria sobre a
cabra montês
da serra do Gerês,
apresentada e lida á primeira classe da Academia Real das Ciências,
Lisboa, 1857; anda também no tomo II, parte 13; da nova série das Memorias
da referida Academia; Instruções
praticas sobre o modo de coligir,
preparar e remeter
produtos
zoológicos
para o museu de Lisboa, Lisboa, 162; Relatório
acerca da situação e necessidades da secção zoológica
da museu de Lisboa, apresentada a s. ex.ª o ministro e secretario de
estado dos negócios
do reino, Lisboa 1865; Noticia
dos anziolos de Portugal, nas Memorias
da Academia das Ciências,
nova serie, 1.ª classe, tomo III, parte II, 1865; Noticia
acerca
da descoberta nas costas de Portugal de um zoófito
da família
halo-cactoides,
Brandt, idem; Diagnose de
algumas espécies
da família
squalidae, idem; Noticia acerca
de um novo género
de mamíferos
do Africa ocidental,
idem, tomo IV, parte I; Lista
dos reptis das possessões portuguesas
da Africa ocidental
que existem no museu de Lisboa; no Jornal
das ciências
matemáticas
e físicas,
publicado sob os auspícios da Academia, n.º 1, 1856; A
Ornitologia
dos Açores,
idem; Segunda lista dos
reptis das possessões portuguesas
da África ocidental,
que existem no museu de Lisboa, idem, n.º 3, Agosto de 1867; Apontamentos
para a ictiologia
de Portugal; peixes plagióstomos;
primeira parte: Esqualos, com versão francesa, Lisboa, 1866;
nesta obra também colaborou Brito Capelo; Relatório
de 20 de janeiro de 1868 sobre a visita feita (por comissão do
governo) à
exposição internacional de Paris em 1867; foi transcrito no Jornal
do Comércio,
de 31 de Janeiro de 1868; Considerações
acerca
do melhor aproveitamento das ostreiras
da margem esquerda do Tejo e da cultura das nossas ostras, idem,
1868; Memorias zoológicas;
Noticia acerca
dos caracteres e afinidades naturais
de um novo género
de mamíferos
insectívoros
da Africa ocidental
«Bayonia Velox» (Potamoyale Velox du Chaillu); Ornitologia
de
Angola, ouvrage publié
sous les auspicfs du ministère de la marine et des colonies,
Lisbonne, 1881. Tem também alguns artigos científicos nos Anais
das ciências
e letras, publicados pela Academia, classe 1.ª, e também no Diário
de Lisboa, de 1850, etc. A vasta bibliografia do Sr. conselheiro
Barbosa du Bocage acha-se sistematizada no folheto: Publicações
cientificas
de J. V. Barbosa du Bocage (1857-1901), Lisboa, Typ. da Academia
Real das Ciências, 1901.
|
Genealogia
de José Vicente Barbosa du Bocage
Geneall.pt
|
|
|
|
|