n. 4 de dezembro
de 1638.
f. 14 de fevereiro de
1734.
Clérigo
regular da Ordem de S. Caetano.
Nasceu
em Londres a 4 de dezembro de 1638, faleceu em Lisboa a 14 de fevereiro
de 1734. Era filho de pais franceses. Tinha seis anos de idade
quando saiu de Londres com sua mãe, fugindo às agitações que se
seguiram à morte de Carlos I, e entrou em Paris, onde,
desenvolvendo-se-lhe um talento superior e paixão pelos estudos,
juntamente com o desejo de seguir a vida religiosa, depois de cursar
humanidades em Paris e doutorar-se em Roma nas ciências teológicas,
professou na Ordem de S. Caetano a 29 de agosto de 1661. Depressa
criou em França grande nomeada como pregador, e em 1668 veio para
Portugal, por mandado do geral da ordem. Aprendeu em pouco tempo a língua
portuguesa, começando também a distinguir-se em Lisboa como orador
sagrado, alcançando grande aceitação na corte.
O
seu nome não pode deixar de ser incluído neste nosso trabalho,
apesar de não ter nascido em Portugal, porque, além de serviços
que prestou e dos cargos que exerceu, bastava para adquirir esse
direito o Vocabulário português e latino, obra de grande
merecimento, que naquela época se tornou de muita utilidade, abalançando-se
e conseguindo ele só com o próprio esforço e estudo, o que as
academias não, puderam vencer antes nem depois. O Vocabulário
foi um verdadeiro serviço prestado a Portugal, e ainda hoje é
consultado com interesse pelas pessoas que se dedicam a estudos literários. Bluteau tinha a especial protecção da rainha D. Maria
Francisca de Sabóia, mulher de D. Afonso VI e de D. Pedro II, de
quem era muito afeiçoado e se tornara partidário. Em 1680 foi
encarregado de acompanhar à corte de Turim o Dr. Duarte Ribeiro de
Macedo, que ia tratar o casamento da princesa herdeira D. Isabel com
o duque de Sabóia, Vítor Amadeu, e falecendo Ribeiro de Macedo
durante a viagem, o padre D. Rafael Bluteau o substituiu naquela
missão até chegar de Lisboa em 1682 o novo ministro que foi o
duque de Cadaval, para concluir as negociações, que por fim se não
realizaram, pela grave doença que assaltara o duque de Sabóia.
Sendo
muito afeiçoado à rainha, a sua morte, em 27 de dezembro de 1683,
causou muitos dissabores a D. Rafael Bluteau, que o obrigaram a
retirar-se para França, onde se demorou bastantes anos, regressando
a Portugal somente em 1704. Desta vez não teve o acolhimento que
esperava, porque tornando-se suspeito ao governo, em razão da
guerra declarada a esse tempo entre as duas coroas, recebeu ordem,
apenas entrou em Lisboa, para se recolher ao convento de Alcobaça;
ali então dedicando-se aos seus trabalhos, reviu o Vocabulário
e outras obras empreendidas com toda a dedicação em benefício
das letras portuguesas. Em 1713 obteve licença para residir em
Lisboa, depois de concluída a paz geral. Desde, então, merecendo a
particular simpatia de D. João V, este monarca ordenou que fossem
impressas todas as suas obras à custa da fazenda real, e o nomeou
académico do número da Academia Real de Historia, quando em 1710
se fundou esta corporação. O Padre Bluteau já nesse tempo
pertencia à Academia dos Generosos e à dos Aplicados, assistia às
conferências eruditas que se celebravam em casa do conde da
Ericeira, etc. Durante alguns anos também foi prepósito do
convento de S. Caetano. Os últimos anos da sua longa vida, pois
faleceu com perto de noventa e cinco anos, passou-os
descansadamente, respeitado pelos homens mais doutos e instruídos
do seu tempo que o estimavam como amigo e mestre. O Padre Bluteau
era mais ou menos versado em todo o género de estudos,
merecendo-lhe particular predilecção o das línguas mortas e
vivas. Falava desembaraçadamente a inglesa, francesa, italiana,
portuguesa, espanhola e grega, tendo aprofundado o conhecimento das
gramáticas de todas estas línguas, compondo e escrevendo com
facilidade. Na Biblioteca Nacional de Lisboa há dois retratos seus,
e dizem que na Imprensa Nacional também existe um na sala da
contadoria.
Para
a sua biografia podem consultar-se as Memorias
históricas
e cronológicas
dos Clérigos
regulares,
por D. Tomás Caetano do Bem, tomo I, pág. 283 a 317;
Obsequio fúnebre, pela
Academia dos Aplicados, Lisboa, 1734; o
Elogio fúnebre,
pelo conde da Ericeira, no tomo XII da Colecção
de Documentos e Memorias da Academia; Canais, nos Estudos
biográficos, pag. 289.
Escreveu:
Vocabulário
Português
e Latino, Áulico,
Anatómico,
Arquitectónico,
Bélico,
Botânico,
Brasílico,
Cómico,
Critico, Químico,
Dogmático,
etc. autorizado
com exemplos dos melhores escritores
portugueses
e latinos, e oferecido
a el-rei
de Portugal D. João V,
tomo I, Coimbra, 1712; ao todo são oito volumes, impressos em
diferentes anos, sendo o último no de 1721; Suplemento
ao Vocabulário
Português
e Latino, que acabou de sair á luz, Ano
de 1721, Lisboa, 1727, 2 tomos; Primícias
Evangélicas, ou sermões e panegíricos do P. D. Rafael Bluteau, etc.,
oferecido à sereníssima
alteza de Cosmo Terceiro, grão-duque de Toscana,
Lisboa, 1676; Parte
segunda, oferecida a uma doutíssima,
poderosíssima
e virtuosíssima
princesa,
Lisboa, 1685; esta princesa
era a livraria
de D. Luís de Sousa, arcebispo de Lisboa, a quem dirigia uma
oração dedicatória muito extensa; Parte
terceira, oferecida ao Marquês
de Cascais,
etc., Paris, 1698; Sermões
panegíricos e doutrinais, que a diversas festividades e assumptos pregou,
etc., 2 tomos, Lisboa, 1732 e 1733; Prosas
portuguesas,
recitadas em diferentes congressos académicos,
Parte I e II, Lisboa, 1728; Instrução
sobre a cultura das amoreiras e criação dos bichos da seda,
dirigida à conservação e aumento das manufacturas da seda e
dedicada a el-rei D. Pedro II, quando príncipe
regente, que as estabeleceu e com os novos privilégios concedidos
por el-rei D. José I, nosso senhor; autor D. R. B.,
Coimbra, 1769; a 1.ª edição desta obra parece ter sido publicada
em 1679; depois foi publicada nas Prosas
Académicas,
tomo II. Esta nova edição é aumentada com as leis de D. José
I relativas ao assunto; Diccionario
castellano y portuguez, impresso en Lisboa por orden de el-rey
de Portugal D. Juan V, etc.; autor el P. D. R. Bluteau,
Rio de Janeiro, 1841.