Nasceu
nesta cidade a 8 de maio de 1826, onde também faleceu em 26 de fevereiro
de 1883. Era filho de Francisco Lupi, de origem italiana, e de D.
Maria do Carmo Lupi.
Mostrando
desde criança muita vocação para o desenho, matriculou-se na
Academia de Belas Artes em 4 de fevereiro de 1811, na aula de
desenho histórico. Fez um curso brilhantíssimo, sendo premiado nos
três anos lectivos de 1841 a 1843. Em 15 de fevereiro de 1864
entregou-se definitivamente aos estudos da pintura histórica, que
era a sua predilecção. Reflectindo, porém, que se não tivesse
outro modo de vida, lutaria com a falta de recursos para se
sustentar, primeiro que chegasse pela arte a auferir razoáveis
lucros, resolveu empregar-se, e em maio de 1849 entrou para a
Imprensa Nacional num lugar de amanuense da contadoria, onde
permaneceu até abril de 1851, ano em que obteve o lugar de contador
na junta de fazenda na província de Angola, para onde partiu a
tomar posse do seu novo emprego, de que se exonerou a 27 de setembro
de 1853, regressando então a Lisboa. Em 12 de outubro de 1855 saiu
o decreto que o nomeava aspirante de 2.ª classe da repartição de
fazenda do distrito do Porto; lugar que não chegou a exercer, por
ter sido transferido em 24 do mesmo mês para aspirante de 2.ª
classe da direcção do Tribunal de Contas, sendo logo em seguida
nomeado amanuense do mesmo tribunal, pelo decreto de 26 de agosto de
1859.
Lupi
passara os melhores anos da mocidade no exercício das suas funções
oficiais, mas não largara nunca o pincel e a paleta, resignando-se
a trabalhar como simples amador de pintura e esse facto lhe valeu o
ser encarregado de pintar o retrato de D. Pedro V para o tribunal, e
ainda hoje se vê numa das suas salas. Lupi pôde finalmente
realizar as suas aspirações artísticas. A exposição daquele
quadro bastou para revelar ao público um verdadeiro talento,
augurando-lhe um glorioso futuro artístico. O governo
estabeleceu-lhe uma pensão para estudar em Itália, resolução que
foi acolhida com geral aplauso, e em 1860 partiu Miguel Ângelo Lupi
para Roma, regressando à pátria em novembro de 1863. O primeiro
quadro da sua notável e vastíssima colecção, o que pintou em
Roma, chamava-se D. João de Portugal, tendo por assunto a
cena final do 2.º acto do drama Frei Luís de Sousa, de
Almeida Garrett.
Diz
Pinheiro Chagas na biografia do grande
pintor, que publicou em 1883, no Occidente,
vol. VI, pág. 66, 78 e 86:
«O
assunto foi admiravelmente escolhido. Se a execução não
corresponde completamente ao arrojo, foi porque um artista,
privado por tanto tempo dos meios de estudar e de progredir, começando
agora de novo aos trinta e quatro anos a sua carreira, não podia
atingir desde logo aos píncaros a que o seu génio depois o
levantou. É certo que o quadro tem pouca perspectiva. A sala não
se desenrola bem diante do espectador, nem a galeria dos quadros
se prolonga bem pela parede fora. As duas figuras principais
atropelam-se um pouco. Sobretudo o colorido é fraco. Mas em
compensação, que admirável fisionomia a de D. Madalena de
Vilhena! Como o terror se pinta bem no seu rosto angustiado! Como
se percebe que uma catástrofe súbita a fulminou em plena
tranquilidade. Gosto menos da fisionomia do romeiro. A expressão
é mais vaga. Não se adivinha no seu rosto, um pouco de cliché,
que tanto, pode ser o de Rui Gomes da Silva do Hernâni,
como o do Barba Roxa dos Burgraves,
as paixões e os sentimentos que o agitam; mas, fossem quais
fossem os defeitos que se pudessem notar no quadro, o que ele
desde logo revelava era uma tendência notabilíssima para pintar
a figura humana, sobretudo uma predilecção especial pelos rostos
femininos, que sabia pintar com inexcedível delicadeza de toques.
Estava ali evidentemente um grande pintor histórico, um homem
fadado para arrancar da sombra da história as figuras que no seu
primeiro plano se agitam e faze-las reviver na tela. Por isso
quando Lupi foi a concurso para a cadeira de pintura histórica,
executando para esse concurso a belíssima tela, que intitulou Um
beijo de Judas,
o público saudou com verdadeiro entusiasmo a sua
nomeação.»
Lupi
tornou-se o artista predilecto do público. Nas exposições da
Sociedade Promotora de Belas Artes de 1863 e 1864, os visitantes
agrupavam-se de preferência na frente dos seus quadros. Nesta
ultima exposição, o quadro Esperança
e saudade conquistou os mais sinceros aplausos do público: Em
Janeiro de 1834 recebeu a nomeação de professor interino da
cadeira de desenho histórico. Em 1867 foi a Paris em comissão do
governo, inspeccionar os trabalhos do monumento de D. Pedro IV, que
ali se estava fazendo: Parece que foi essa a única missão oficial
de que se encarregou, depois de ter sido nomeado lente da Academia
de Belas Artes. Algum tempo depois de regressar de Paris tomou
posse, como efectivo, do seu lugar de professor dá cadeira de
pintura histórica. Os seus quadros apareceram na exposição de
Madrid em 1871, recebendo prémio o que se intitulava Mãe;
na exposição universal de Paris, em 1878, também foi premiado
o seu quadro As lavadeiras
do Mondego. Lupi era também um retratista de primeira ordem;
apanhava a semelhança com uma facilidade surpreendente.
Além
dos quadros apontados, sabemos dos seguintes; históricos, de género
ou de paisagem: A Esmola do
Espírito Santo, O
Tintoretto, que foi
adquirido pelo rei D. Luís I, A
Espera, Leitura, de uma carta, A Costureira, Confidência, Salvai-o,
que foi vendido para Londres, Aguadeira,
Forte da Guia, Os dois escravos, eram os retratos de dois pretos
pertencentes a Serpa Pinto; O Crepúsculo,
A Família, que pertence à sr.ª condessa de Edla, Lição
de bordado, Esboceto de Vasco da Gama, Cartão de Egas Moniz, O
Marquês de Pombal determinando a edificação de Lisboa,, quadro
encomendado pela câmara municipal, e que figura na sala das sessões
da mesma Câmara; e muitos outros. Retratos, temos conhecimento dos
seguintes: D. Luís I; D. Fernando II, Wisse Dahi, arcebispo de Goa,
José da Costa Pereira e filhos, visconde de Castilho (António
Feliciano de Castilho), viscondessa de Castilho (D. Cândida), duque
de Ávila, marquesa de Belas, Ferreira do Amaral, visconde de
Penalva de Alva, Condessa de Gerás do Lima, conde de Castro,
general Filipe Folque, visconde de Condeixa, Bulhão Pato, Venâncio
Deslandes, marquesa do Faial, mãe do Dr. Sousa Martins, João Lupi,
Matoso da Camada, Emília Adelaide, Augusto Rosa; baronesa da
Folgosa, Veiga Barreira, um filho de Pinheiro Chagas, e retratos de
pessoas da família de Miguel Ângelo Lupi. O notável artista
faleceu aos 56 anos de idade, e a sua morte foi justamente
pranteada, Escreveu: Catalogo
dos projectos para o monumento de sua majestade
imperial o senhor D. Pedro IV, recebidos em virtude do concurso
aberto em 20 de março de 1864 pela comissão
nomeada para tratar do monumento, Lisboa, 1865; com uma estampa
litografada; foi reproduzido em diversos numeres da Gazeta
de Portugal; A reforma da Academia Real de Belas
Artes de Lisboa; Depois da sua morte publicou-se um Catalogo
dos quadros, aguarelas,
e desenhos, obras do falecido
Miguel Angelo Lupi, leilão na Academia de Belas Artes,
em 16 de dezembro de 1883 e dias seguintes, Lisboa, 1883.