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Comandante Brissac das Neves Ferreira
Brissac das Neves Ferreira

 

Neves Ferreira (João António Brissac das).

 

n.      28 de fevereiro de 1846.
f.       5 de julho de 1902.

 

Capitão-de-mar-e-guerra, ministro de Estado honorário, governador da província de Moçambique, de Benguela e do distrito do Congo, governador civil do Porto, etc. 

Nasceu em Belém a 28 de fevereiro de 1846, faleceu no Funchal a 5 de julho de 1902. 

Assentou praça como aspirante de marinha em 1 de agosto de 1863, sendo promovido a guarda-marinha em 4 de julho de 1866, a tenente em 29 de setembro de 1869, a 1.º tenente em 6 de maio de 1878, a capitão-tenente em 28 de abril de 1887, a capitão de fragata em 10 de agosto de 1889, e a capitão de mar e guerra em 20 de fevereiro de 1890. O primeiro navio que comandou foi o vapor Sena, depois foi imediato na canhoneira Tete, em viagem para o Zambeze, sob o comando do sr. conselheiro Ferreira do Amaral. Por portaria de 17 de março de 1876 foi nomeado vogal da comissão encarregada de formular os regulamentos para a execução da lei de 21 de fevereiro desse ano; em 18 de outubro ainda de 1876 foi nomeado para estudos do caminho-de-ferro de Luanda a Ambaca. A Revue Diplomatique, de 23 de junho de 1893, publica um interessante artigo acerca deste ilustre oficial de marinha, em que falando nesses estudos, diz que Neves Ferreira não era somente um marinheiro distinto, era também um engenheiro muito hábil. Sendo encarregado dos estudos duma linha do caminho-de-ferro de Donde a Ambaca, nota-se nesses estudos uma ponte metálica tendo o alcance de 180 m., cujas fórmulas têm sido adoptadas por muitos engenheiros franceses e ingleses, que renderam homenagem à ciência do seu colega improvisado. 

Por portaria de 23 de março de 1880 foi nomeado governador de Benguela, e nesse governo deu provas de firme energia, sufocando uma revolta dos deportados naquela região, que andavam por uns 400, que contavam com inteligências valiosas entre os soldados indígenas do presídio. A Illustrazione Militare Italiana, de outubro de 1893, que publicou o retrato e biografia de Neves Ferreira, diz o seguinte sobre este assunto: «O governador, tendo uma noite conhecimento de que os presidiários preparavam para a madrugada seguinte uma sortida, planeando o extermínio das autoridades e dos habitantes mais grados da cidade, dirigiu-se no mesmo instante, e completamente só, à caserna, e pela energia do seu comportamento, fez abortar, logo à nascença uma conjuração que se pronunciava temível.», pedindo a exoneração daquele cargo, regressou a Lisboa. No seu governo fizera Neves Ferreira a sua aprendizagem administrativa, deixando aos seus administrados a grata recordação dum governo sensato e justo. Chegando a Lisboa foi nomeado 2.º comandante da escola de marinheiros, em 14 de novembro de 1882, e em 17 do referido mês vogal da comissão encarregada de redigir um projecto de regulamento para a mesma escola. Em 9 de maio de 1883 era comandante da canhoneira Tejo. Foi a bordo desta canhoneira, que em 1884, tomou parte no bombardeamento de Catalla. Pouco depois teve a exoneração deste comando. 

Pela portaria de 20 de maio de 1885 foi nomeado vogal da comissão por parte de Portugal, para verificar quais as ocasiões e circunstâncias em que a Ínsua grande do rio Minho comunica com a terra firme, e proceder a um estudo exame das condições das outras ilhas daquele rio. Em 15 de outubro do mesmo ano foi nomeado para fazer parte da comissão encarregada da compra, em Inglaterra, de material para o novo distrito do Congo, para que teve a nomeação de governador, por decreto de 23 de dezembro de 1835. Neste governo procedeu a importantes reformas, terminou com muitos abusos, e desenvolveu consideravelmente o comércio daquele distrito. Acerca da permanência do ilustre oficial no Congo, diz o Sr. Lopes de Mendonça, na Revista Ilustrada de 5 de novembro de 1890: «O engenhoso expediente que eu passo a notar, recorda a conhecida anedota dum grande navegador com os índios da América, aproveitando-se dum eclipse de sol para alcançar a salvação e o prestígio. Foi na época em que Neves Ferreira governara o Congo. Embarcara no vapor Massabi para ir fazer uma fundação com certos indígenas das margens do grande rio. Para os leitores menos versados em assuntos africanos, cumpre explicar que fundação significa para os pretos pouco mais ou menos o que no direito europeu é traduzido pelas palavras tratado ou convénio, e representa geralmente um acto de vassalagem. O vapor chegou de noite. Como o governador tivesse pressa, convocou imediatamente o régulo e os seus macotas para proceder à fundação. Mas a legislação consuetudinária dos africanos determina que tão solenes actos apenas se pratiquem de sol a sol. Neves Ferreira não se perturba. Enquanto um guarda‑marinha volta a bordo a transmitir uma ordem que ele lhe deu em voz baixa, o governador continua a insistir com o soba para apressar a solução do seu negócio. Passados alguns momentos em renhida teima com o preto, o governador exclama: «Pois se a questão é de sol, faça-se, com a breca!» E acendeu um fósforo. Era um sinal convencionado, porque apenas surgiu na praia essa luz bruxuleante, respondeu-lhe da banda do rio um clarão resplandecente e fortíssimo, que inundou os indígenas deslumbrados e lhes tez soltar exclamações frenéticas de espanto. «Aí têm o sol, bradou o governador, vamos agora a isto.» E realizou-se a fundação, mercê da luz eléctrica que fazia a sua primeira aparição no Zaire, fecunda em vassalagens para a coroa portuguesa.» Pouco tempo depois era Neves Ferreira nomeado governador-geral da província de Moçambique, e aproximava-se para ele uma das épocas mais notáveis da sua vida. 

A memorável tormenta que nos trouxe o ultimato inglês de 11 de janeiro de 1890 avançava como uma ameaça formidável sobre a consciência do país. O pretexto da contenda foram supostas irregularidades na administração de Serpa Pinto, afirmando o gabinete Salisbury, por informações do seu cônsul em Moçambique, que o major Serpa Pinto dissera ter dado ordem para que fosse fortificado o Qabongo e outros portos. O ultimato exigia a destituição de Serpa Pinto e explicações da nossa parte sobre os interesses ingleses na região dos macololos. O governo português teve de ceder perante as brutais ameaças; protestando contra a violência, e chamando a atenção dos signatários do tratado de Berlim para a violação que lhe era feita, tratado que nos dava a garantia da arbitragem. O governador-geral de Moçambique viu-se isolado, no meio do perigo, sem elemento algum de defesa e sem meio de combate; só tinha a sua coragem, a sua energia, o seu amor pela pátria, luta, porém, empregando todas as finuras da diplomacia, toda a energia do direito violado, e toda a coragem do homem disposto a sacrificar a própria vida. A esquadra inglesa chega, ameaçadora, os seus couraçados estão cheios de soldados e os seus canhões cheios de metralha Mas Neves Ferreira, com o seu espírito diplomático, sugere conferências, e durante este tempo toma as medidas mais severas a respeito dos ingleses, dá as ordens mais enérgicas, e às ameaças do chefe da esquadra inglesa, Johnston (que era o cônsul inglês em Moçambique) fez constar, que se os ingleses se atrevessem a atacar e a invadir Lourenço Marques e Moçambique, que lá seriam recebidos, devida e cortesmente pelos torpedos que se ocultavam nas águas dos respectivos portos. «Ide levar essas ameaças a Lisboa, porque em Moçambique ninguém tem direito de falar mais alto do que eu. Nunca se pôde averiguar bem a veracidade desta versão. O sr. Lopes de Mendonça, no seu artigo já citado na Revista Ilustrada, diz: «Em seguida ao ultimato de 11 de janeiro, houve um homem que desenvolveu acima de todos, poderosas faculdades de estadista, energia de carácter a toda a prova, finuras de diplomata e coragem de patriota. Foi o governador-geral de Moçambique Esses serviços não foram apreciados, porventura, no seu justo valor; e creio que por ocasião do seu regresso, o sr. Neves Ferreira teve razão de sobra para responder, com a ironia incisiva que caracteriza por vezes a sua palavra, ao reaccionário que lhe perguntava para onde queria ele ir: «Para onde não faça dano.» Os ingleses encontraram diante de si uma força, e souberam respeitá-la. Mesmo quando a tensão de relações era mais acentuada, quando os funcionários e oficiais de Sua Graciosa Majestade viam fechadas diante de si as portas do palácio de Moçambique, exactamente como as do gabinete de lorde Salisbury diante do sr. Barjona, o cônsul Johnston confessava, em uma carta, o seu profundo respeito pelas qualidades de gentil-homem que distinguem o sr. Neves Ferreira.» 

O ilustre oficial de marinha, não concordando com algumas ordens dimanadas do governo da metrópole, pediu a sua exoneração, recolhendo à Europa. Chegando a Lisboa foi nomeado governador civil do Porto, sendo então presidente do conselho de ministros o conselheiro José Dias Ferreira. No Porto encontrou os ânimos agitados; tinha-se dado a revolta de 31 de janeiro de 1891, e ali repetiu as resolutas energias que empregara em Moçambique. Neves Ferreira conservou-se no Porto granjeando a maior consideração e estima, até que em 1893, foi chamado aos conselhos da coroa no gabinete presidido pelo conselheiro Hintze Ribeiro, para se encarregar da pasta da marinha e ultramar. Foi ele quem em 1895 mandou responder a conselho de guerra o comandante sr. Augusto de Castilho, por haver recolhido a bordo da corveta Rainha de Portugal os insurrectos do Rio de Janeiro por ocasião da revolta do almirante Custodio José de Mello. Como aquele oficial fosse absolvido, Neves Ferreira deixou o ministério. 

Pouco tempo depois foi nomeado governador-geral da província de Angola, lugar de que não pôde tomar posse, porque nos estados da Índia davam-se graves revoltas na milícia indígena, reclamando enérgicas providências do governo da metrópole. Sua alteza o senhor D. Afonso, que fora à frente da expedição organizada para ensinar aos rebeldes o caminho do dever, dera, perante as promessas dos cabecilhas, uma amnistia geral aos revoltosos contritos, e regressando à pátria, cedeu o alto cargo de superintendente dos negócios indianos ao conselheiro Neves Ferreira, nome que naturalmente se impunha para completar a obra do sr. infante. Depois de regressar da Índia, deixou completamente a política, dedicando-se então ao estudo dos problemas coloniais, fazendo parte de muitas companhias de fomento e exploração no ultramar. Era grã-cruz da Ordem de S. Bento de Avis, comendador desta ordem, e da Torre e Espada, de S. Tiago; da Ordem de Mérito Naval de Espanha e da Legião de Honra de França. Foi também ajudante de ordens do rei D. Carlos I. 

Em 1896 publicou-se no Porto o seguinte folheto: Ao Ex.mo sr. João A. de Brissac das Neves Ferreira, servindo a pátria, Homenagem ao valor e ao patriotismo, prestada pelos seus amigos do Porto.

 

 

 

 

Ferreira, João António Brissac Das Neves (1846-1902)
Respublica - Repertório português de ciência política

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume V, págs.
59-61.

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