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Ribeiro
Saraiva (António).
n. 10 de junho
de 1800.
f. 15 de dezembro de 1890.
Fidalgo da Casa Real, bacharel formado em
direito e em cânones
pela Universidade de Coimbra, escritor, etc. Nasceu em Sernancelhe a 10
de junho de 1800, faleceu em Paddock House, St. Peters, no condado de
Kent, a 15 de dezembro de 1890, contando noventa anos de idade. Era filho
do desembargador da Casa da Suplicação e conselheiro José Ribeiro
Saraiva e de D. Francisca Xavier Constantina de Morais e Macedo.
Matriculando-se na universidade, frequentou simultaneamente as
duas faculdades
citadas, e depois também as de matemática e filosofia. Em Coimbra
era geralmente considerado como um poeta muito distinto fazendo
parte da sociedade de rapazes estudiosos cujo chefe era António
Feliciano de Castilho, depois visconde de Castilho, do qual foi íntimo
amigo. Terminou os estudos da universidade em 1823, passando em
seguida algum tempo em Lisboa, na casa de seu pai. Em 1826 tomou o
partido do infante D. Miguel. As tropas realistas do marquês de
Chaves, não podendo resistir às liberais e às forças inglesas,
de Clinton, que as tinham vindo socorrer, tiveram de emigrar para
Espanha em março de 1827, e Ribeiro Saraiva emigrou também,
regressando à pátria, só quando D. Miguel se aclamou rei de
Portugal, em 1828.
Durante
a sua emigração, a princesa da Beira D. Maria Teresa, casada em
Espanha, o tomou para seu agente particular, empregando-o em
continuas comissões políticas, na Áustria, Baviera, Inglaterra e
França, podendo finalmente conseguir que D. Miguel saísse de Viena
de Áustria, no que a princesa da Beira empregou toda a sua
solicitude e valimento. Regressando a Lisboa, D. Miguel o nomeou
secretário da embaixada de Inglaterra, e neste emprego se conservou
até ao fim de maio de 1834. Terminada a guerra civil, Ribeiro
Saraiva soube em Londres tudo quanto decorria em Portugal e a época
de terror que se seguiu à convenção de Évora Monte. Além disso,
carácter sumamente enérgico e intransigente, mesmo depois de 1834,
em que se deram grandes dissidências nos partidos constitucionais
que se organizaram, deixando então os miguelistas mais em sossego,
Saraiva não quis, mais voltar a Portugal, onde reinava uma dinastia
que ele não podia nem queria reconhecer. Continuou a residir em
Londres, e mesmo depois de 1834, foi encarregado de várias comissões
diplomáticas, pelos governos da Áustria e da Rússia, para a
restauração do governo de D. Miguel, o que não pôde conseguir.
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Ocidente
nº 771 de 30 de maio de 1900 |
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António
Ribeiro Saraiva em 1884 |
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Desiludido
da esperança de ver o seu partido vencedor, mas conservando-se
sempre fiel aos seus princípios políticos, desprezou propostas de
seus amigos, e continuou vivendo em Londres, obscuramente, tirando a
sua magra subsistência de traduções inglesas que escrevia para
algumas chancelarias estrangeiras, e de uma modestíssima
percentagem de vinhos nacionais que alguns correligionários do
reino, por comiseração, o encarregavam de ir vendendo aos seus
conhecidos. Como compensação aos dissabores, era notável a
maneira especial como a alta aristocracia inglesa o apreciava, o
convidava, o distinguia e o estimava. Os ingleses respeitam as crenças
alheias, e acatam, seja em quem for, a lealdade cívica e o
cumprimento dos deveres sociais, religiosos e políticos. Por isso
Ribeiro Saraiva, o desvalido português vencido, mas fiel à sua
bandeira politica, era venerado pelas grandes e opulentas famílias
de Londres. Em junho de 1880, quando completou oitenta anos de idade,
dois jornais lhe dedicaram artigos elogiosos, cumprimentando-o, o Conimbricense
e o Comércio
de
Portugal. No artigo do primeiro liam-se os seguintes períodos:
«Apesar de militarmos em campos políticos diversos, não impede
isso que respeitemos a autoridade do nosso compatriota, que há
cinquenta e um anos se acha ausente do reino. Uma das qualidades mais apreciáveis
do sr. Ribeiro Saraiva é a sua independência, de que deu numerosas
provas durante o próprio governo do sr. D. Miguel, ao qual servia
com a maior dedicação.» Do Comércio
de Portugal transcrevemos também:
«Completa amanhã oitenta
anos de idade o ilustrado e venerando cidadão António Ribeiro
Saraiva, um dos altos funcionários do Estado durante a dominação
miguelista. Este homem é o tipo da maior independência e da mais
rigorosa austeridade. Há cinquenta e um anos que vive no
estrangeiro, expatriado, vivendo pobremente do seu trabalho, que nem
mesmo a idade tem conseguido enfraquecer ou diminuir. Para ele
Portugal deixou de ser terra, onde se pudesse viver tranquilamente,
depois que a sua causa se perdeu e um novo sistema político, a ele
oposto, se estabeleceu no país. Ribeiro Saraiva é um miguelista
dissidente, isto é, faz política a seu modo, sempre muito
honestamente, combatendo até muitos dos actos do seu partido. À Nação
e ao grupo que ela representa, tem por vezes dado correctivos de
um vigor assombroso para a idade daquele velho. É intransigente e
irreconciliável. As suas cartas ao ilustrado redactor do Conimbricense
são sempre muito curiosas, pelas revelações históricas e por
uma forma violenta para os adversários das suas ideias. Ribeiro
Saraiva é de tal modo independente, que em 1833 nas cartas,
encontradas nas regiões oficiais, do punho de varias influências
miguelistas, encontraram-se cartas de Saraiva verberando o governo
do sr. D. Miguel. António Ribeiro Saraiva tem tido provações
imensas. Sempre o mesmo. Antes quebrar que torcer. Chegou a não ter
com que pagar o porte de uma carta. No tempo do sr. D. Miguel.
representava Portugal em Londres. Mudado o sistema, cessou a
representação. Sabem o que fez Ribeiro Saraiva? Havendo dívidas
importantes da legação, cuja responsabilidade passaria
imediatamente ao seu sucessor, Ribeiro Saraiva empenhou-se,
sacrificou-se e pagou à sua custa tudo. Um homem assim é raro e
respeita-se. Não se procura nele o adversário, aprecia-se o cidadão.
Um bom carácter e um homem leal, esteja onde estiver, estima-se e
preza-se. Aos oitenta anos Ribeiro Saraiva é ainda hoje um
trabalhador. Vive da sua pena. Para dar uma prova do seu carácter
basta dizer que se tiver de seu apenas uma libra, e um pobre, que
ele reconheça como tal, lhe pedir uma esmola, dá-lha, embora fique
sem nada para o dia seguinte. É assim. Os portugueses que vão a
Londres procuram sempre o venerado português e ele recebe-os com
jovial alegria e sincero afecto.»
O
sr. visconde de Castilho
publicou um artigo acompanhando o retrato do venerando diplomata, no
Occidente de 30 de maio
de 1900, comemorando a sua morte. Nesse artigo conta o que se passou
na visita que lhe fez em 1881, na sua passagem a em Londres, a forma
cavalheiresca e amistosa como foi recebido, e ainda mais quando o
reconheceu como filho do seu íntimo amigo da infância, o visconde
de Castilho. Nesse mesmo jornal vêm publicadas algumas das suas
poesias, trazendo também o retrato de António Ribeiro Saraiva,
tirado em 1849, o as gravuras do seu gabinete de trabalho, casa onde
vivia em Londres e a igreja e cemitério, em Ramsgat, onde foi
sepultado.
As
obras de Ribeiro
Saraiva consistem numa imensidade de opúsculos, cartas e artigos em
jornais Foi mais de dois anos correspondente do Journal de la
Haye; escrevia três vezes por semana, e tirava dali o seu
sustento no tempo que ele chamava o mais difícil, 1834 a 1837.
Escreveu. também regularmente durante algum tempo a parte da política
e noticias estrangeiras para a folha de Dublin The Telegraph,
e depois continuou na mesma folha a publicar longas séries de
artigos, que produziram principalmente na Irlanda seu efeito e sensação.
Escreveu em Londres no Morning Post, e nos jornais católicos.
Das
suas composições impressas, umas com o seu nome e outras anónimas,
mencionaremos as seguintes: A Nação Portuguesa por ocasião do
dia aniversário do fausto nascimento de S. M. I. e R. a Senhora D.
Carlota Joaquina de Bourbon; ode, seguida de um Comentário político-moral.
Paris, 1828; A Trombeta final, Londres, 1834; Analise sobre o tratado de
comércio de Portugal com Inglaterra, 1842; O
senhor Beirão e o seu discurso (defeccionario) de 28 de Julho,
Londres, 1842; Cartas conspiradoras (impressas em Londres,
1844), continuadas em diversos folhetos com numeração seguida; Lira
erótica, por A. R. S, estudante do quinto ano de Leis, Coimbra,
1821; O Contrabandista,
Londres, 1835; O Passado, presente e futuro, ou guia da salvação
publica em Portugal, Porto, 1835 (esta indicação é suposta,
porque se conhece que foi impresso em Inglaterra); A Península,
jornal publicado em Londres, cujo n.º tem a data de 15 de Abril de
1840; Quid faciendum? Considerações oferecidas aos partidos portugueses, ao presente
coligados para o bem nacional; por um
legitimista constitucional, Londres, 1842; este panfleto foi
reproduzido com algumas observações e notas refutatórias no Correio
Português, jornal de Lisboa, D.
Miguel em Roma, Londres, 1844; Noticia de serviços no
libertar-se o Brasil da dominação portuguesa prestados pelo
almirante Conde de Dundonald, marquês de Maranhão, etc.,
Londres, 1859; é tradução do inglês, e tem à frente uma advertência,
assinada pelo tradutor A. R. Saraiva; Saraiva e Castilho a propósito
de Ovídio, Londres, 1862; tem os retratos de Castilho
e do autor; compreende também uma curiosa correspondência havida
nos anos de 1860 a 1862, entre os dois antigos amigos e companheiros
de estudos na Universidade; Saudades
da pátria; nota apensa à versão dos Fastos, de
Ovídio,
por Castilho, no tomo II, pág. 390. Parece que também lhe
pertencem muitos artigos em prosa, e várias poesias políticas,
publicadas em 1839 e anos seguintes em diversos números do periódico
O Portugal velho, datados de Londres, e tendo por assinatura Portugal
velho sénior. No vol. VIII do Dicionário Bibliográfico,
publicado em 1867, a
pág. 296, lê-se que existia inédito um volume de poesias,
intitulado Musa quotidiana, escritas
nos anos de 1831 e seguintes, bem como muitas notas e artigos
em prosa, etc.
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Trecho
do DIÁRIO, 1831-1888 O Portal da História
Eu
não sou um Rebelde
O Portal da História
Saraiva de Morais Figueiredo, António Ribeiro (1800-1890) Politipédia
António Ribeiro Saraiva O Ocidente, nº 771 de 30 de maio de 1900
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