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Sousa
(frei João de).
n.
1735.
f. 29 de janeiro de 1812.
Célebre arabista.
Nasceu na Síria, na cidade de Damasco,
em 1735, tendo seus pais nascidos na Índia Portuguesa.
Revelando desde muito. criança
grande vivacidade e notável talento, estudou com os barbadinhos
franceses, que tinham uma missão em Damasco, e aprendeu as línguas
francesa, italiana e espanhola. Entendendo que seria pena que se
esterilizasse naquele meio, longe dos grandes centros da civilização
europeia, essa viva inteligência, os barbadinhos franceses
aconselharam ao pai do futuro arabista, que o mandasse para a
Europa. Assim se fez, e o moço estudante, que não contava então
mais de dezasseis anos, partiu para a Europa, munido de cartas de recomendação
para algumas casas de comércio francesas; mas a viagem lhe não
correu propicia. Apanhou grandes temporais no arquipélago, andou de
arribação em arribação, esteve a pique de naufragar por várias
vezes, e finalmente, depois também de andar. corrido no Mediterrâneo,
veio arribar a Lisboa no anho de 1750, e aqui se resolveu a ficar,
confiando somente na providência, porque não tinha recursos nem
conhecimentos.
Um feliz acaso o levou a casa dum dos
fidalgos mais ilustrados desse tempo, João de Saldanha de Oliveira
e Sousa, morgado de Oliveira, que foi depois 1.º conde de Rio
Maior. Simpatizaram todos em casa do morgado Oliveira com o
desamparado adolescente, interessaram-se tanto por ele e a tal
ponto, que não tardou a ser considerado como filho da casa.
Quiseram que ele tomasse um dos seus apelidos, e foi assim que o
jovem damasceno se ficou chamando João de Sousa, deixando o seu
antigo apelido, que se ignora qual fosse. Em 1758 Gaspar de Saldanha
foi ser reitor da Universidade de Coimbra, e levou-o na sua
companhia como secretário. O lugar era importante e de
responsabilidade, porque Gaspar de Saldanha ia com instruções
especiais, e incumbido de estudar bem a Universidade, o modo como
nela actuavam as influencias jesuíticas, e de tudo relatar ao conde
de Oeiras, que nessa ocasião preparava a um tempo, as suas duas
grandes medidas: a expulsão dos jesuítas e a reforma da
Universidade. João de Sousa era o confidente do reitor, o seu
auxiliar dedicado e discreto, e efectivamente, incumbido de missão
tão espinhosa e delicada, Gaspar de Saldanha não podia fazer-se
acompanhar senão dum homem que estivesse para com ele nas condições
peculiares em que se achava João de Sousa. Voltando de Coimbra,
começou em 1770, sem se saber por que motivo a pensar em se
recolher ao claustro, e persistiu firmemente na sua resolução, por
mais que o morgado de Oliveira e sua família insistissem em o
demover daquele propósito. Havia, porém, uma dificuldade, que se
opunha não à sua entrada nas ordens, religiosas, mas à que nelas
ocupasse a situação a que tinha direito pelo seu reconhecido mérito.
João de Sousa; que conhecia as línguas orientais, como quem vivera
os primeiros 16 anos da sua vida no Oriente, que conhecia
admiravelmente as línguas da Europa moderna, que estava já sendo
um erudito, que conhecia a fundo os nossos clássicos, não sabia
latim. A educação que recebera, fora a de um homem que se destina
ao comércio, e portanto não se preocupara com a língua latina.
Escolhera a ordem terceira de S.
Francisco, de que era provincial frei Manuel de Cenáculo; que foi
depois arcebispo de Évora. Vendo, porém, que lhe era indispensável
para professar o conhecimento do latim; já queria ser apenas irmão
converso; mas frei Manuel do Cenáculo não lho consentiu, e instou
com ele para que se habilitasse, o que decerto conseguiria
rapidamente. Excedeu João de Sousa a expectativa do provincial,
porque em poucos meses, e sem abandonar as obrigações do
noviciado, se aprontou em língua latina, e professou. O empenho de
frei Manuel do Cenáculo em ter por confrade João de Sousa, era o
seu ardente desejo de promover o renascimento dos estudos orientais
em Portugal, que estavam numa decadência lamentável, e contava
muito para isso com o préstimo de João de Sousa. Na verdade, na
ordem terceira da Penitência havia uma aula de árabe regida por
António Baptista Abrantes, mas João de Sousa substituí-lo-ia com
vantagem, porque o árabe era para ele quase a sua língua materna.
Em 1773 quis o rei D. José mandar
uma embaixada ao sultão de Marrocos para tratar da paz definitiva,
que tinha por base a desgraçada cedência de Mazagão. Foi nessa
embaixada frei João de Sousa como secretário e intérprete; e
ficou lá, ainda depois de se terem concluído os tratados, não só
para estudar os usos, costumes e política de Marrocos, mas também
para se aperfeiçoar no dialecto árabe falado em Marrocos, dialecto
muito diferente do árabe falado na Ásia. Voltando a Portugal no
fim de 1771, pôde figurar nas festas que se celebraram na inaugurarão
da estátua equestre, em Janeiro de 1775: Colaborou activamente nas
homenagens prestadas então ao soberano pela ordem terceira. Fundada
em 1779 por, D. Maria I a Academia Real das Ciências, foi frei João
de Sousa um dos seus primeiros sócios correspondentes. Trabalhava frei João de Sousa ardentemente nos seus estudos arábicos e nas
suas investigações filológicas relativas a esta língua, quando a
Academia desejou ter conhecimento de muitos manuscritos árabes
existentes na biblioteca do Escurial, e que podiam efectivamente
esclarecer muito a história portuguesa. D. Maria I não hesitou em
proteger essa missão científica, em 1789, e frei João de Sousa,
ia partir para Madrid, quando circunstancias política urgentes o
fizeram partir para África. Já anteriormente, em 1736, ele fora a
Argel numa comissão especial, e em circunstâncias bem críticas,
porque então grassava ali a peste. Frei João de Sousa ia tratar de
missões diplomáticas por causa da eterna questão dos cativos,
questão que dessa vez teve de resolver-se pela força das armas,
bombardeando uma esquadra combinada portuguesa e espanhola a cidade
de Argel. Quando, porém; em 1789 estava para partir para Espanha, a
missão que o desviou, foi a Marrocos. Achava-se este império nas
mais lamentáveis circunstâncias. Morrera o imperador Sidi Mahammed
deixando 14 filhos, alguns dos quais disputavam entre si herança
paterna. Frei João ia, segundo parece, com intentos conciliadores,
que não deram resultado. Por essa ocasião também ofereceu asilo
em Portugal aos membros proscritos da família do imperador.
Em,
1789 publicou a sua obra: Vestígios
da língua arábica
em Portugal ou Léxico
etimológico
de palavras e
nomes portugueses
que tem
origem arábica, composto por ordem da
Academia Real de Lisboa. Esta obra saiu muito mais tarde, em 2.ª
edição, no ano de 1830, com adições e correcções de um grande
artista português frei João de Santo António Moura. Esta obra
deu-lhe uma reputação europeia: Ao mesmo tempo copiava na Torre do
Tombo os documentos arábicos que existem ali, e publicava 58 com a
tradução ao lado do texto original escrito em caracteres arábicos.
Saíram em 1790, com o título: Documentos arábicos
para a historia portuguesa, copiados dos originais
da Torre
do Tombo com permissão de Sua Majestade
e vertidos em português
por ordem da Academia Real das Ciências. Em 1794 foi nomeado
professor da cadeira de árabe no convento de Jesus, e em 1795
ordenou a rainha que essa aula passasse a ser pública, fixando para
isso ordenado ao professor e criando o lugar de substituto para que
houvesse quem a pudesse reger no impedimento do proprietário. Nesse
ano de 1795 publicou um Compendio
da gramática árabe, abreviado; claro e muito fácil
para a inteligência
da mesma língua. A nomeação para o lugar de
substituto da cadeira da língua árabe, recaiu em frei José de
Santo António Moura, já citado, que estivera 4 anos em África a
estudar o árabe, e desde então se determinou que houvesse sempre
em África um religioso estudando esse idioma. No tomo V das Memórias
da Literatura
da Academia, publicou uma Memória
de quatro inscrições arábicas
com suas traduções. Nada
mais publicou. Chegara a uma idade muito avançada, e o peso dos
anos, os trabalhos que passara, principalmente nas suas viagens a África,
a vida sedentária que levava, minaram lhe o organismo. Acrescia a
tudo isto que, apesar de ter vindo tão moço para a Europa, nunca
se aclimatara completamente nesta parte do mundo.
Estando
no convento de Jesus sobreveio-lhe uma afecção catarrosa, de que
morreu a 29 de janeiro de 1812. Ficaram inéditas muitas das suas
obras. Na Biblioteca de Évora existem, e figuram no respectivo catálogo
que foi publicado, de pág. 209 a 212 e de pág. 223 a 224, muitos
dos seus manuscritos, uns originais, outros copiados ou traduzidos,
já sobre assuntos de história e literatura árabe, já sobre as
negociações em que andou envolto, de Portugal com as potências berberes.
Frei João de Sousa foi nomeado por D. Maria I, em 1792, oficial da
Secretaria de Estado dos Negócios de Marinha. No seu convento foi
mestre de noviços e definidor, e morreu com as honras de ex-geral
efectivo. Frei João de Sousa também se dedicara apaixonadamente ao
estudo da numismática árabe. Escrevera uma Numismalogia,
descrevendo várias medalhas árabes dos califas, que em diversas
ocasiões, se tinham encontrado. em Portugal, e entre outras de umas
que apareceram a 19 de fevereiro de 1781 no termo da vila de Lagos.
Juntara a essa descrição uma noticia do reinado dos califas a cujo
tempo pertenciam essas medalhas, constituindo um estudo importantíssimo
que se perdeu.
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"Narração da arribada das
princesas africanas ao porto desta capital de Lisboa" de frei
João de Sousa O Portal da História
Processo de frei João de Sousa no Tribunal do Santo Ofício Arquivo Nacional da Torre do Tombo
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