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Vila
da Praia (Francisco Borja de Garção Stockler, barão da).
n. 25
de setembro de 1759.
f. 6 de março de 1829.
Fidalgo
cavaleiro da Casa Real; do conselho do rei D. João VI, comendador
da Ordem de Cristo, tenente-general do exército, secretário e
conselheiro do Conselho Ultramarino, governador do Algarve,
governador e capitão general dos Açores; secretario das imediatas
resoluções do rei relativas ao exército; membro da Junta do Código
Criminal Militar, e da Junta convocada para a formação do projecto
da Carta Constitucional em 1823; lente de matemática na Academia
Real de Marinha de Lisboa; deputado da Junta de Direcção da
Academia Militar do Rio de Janeiro, secretário da Academia Real das
Ciências de Lisboa, sócio da Sociedade Real de Londres, etc. Nasceu
em Lisboa a 25 de setembro de 1759, faleceu no Algarve a 6 de março
de 1829. Era filho de Cristiano Stockler, natural de Lisboa,
cavaleiro da Ordem de Cristo, e de sua mulher, D. Margarida Josefa
Rita de Orgiens Garção de Carvalho.
Seu
avô, Cristiano Stockler era natural de Hamburgo, homem de negócios
estabelecido em Lisboa nos princípios do século 18. Tendo
escolhido a carreira militar, foi depois matricular-se na faculdade
de matemática na Universidade de Coimbra em 1784, quando já
contava vinte e cinco anos de idade. Tomando o grau de bacharel
nessa faculdade, foi nomeado lente da Academia Real de Marinha.
Nomeado sócio da Academia Real das Ciências pouco depois, foi a academia
que em 1791 mandou publicar a sua primeira obra, que era um Compendio
da teoria dos limites, ou introdução ao método das fluxões.
Dedicou-se com grande ardor a trabalhos académicos; e nos tomos I e
II das Memórias da Academia publicou as seguintes obras: Memórias
sobre os verdadeiros princípios do método das fluxões; a Demonstração
do teorema de Newton sobre a soma das potências das raízes das
equações; a Memória sobre as equações de condição das funções
fluxionaes; a Memória sobre algumas propriedades das coeficientes
dos termos do binómio de Newton. Nomeado secretário da
Academia proferiu sucessivamente os elogios históricos de Pascoal
José de Melo Freire dos Reis, de José Joaquim Soares de Barros e
Vasconcelos, de Roberto Nunes da Costa, de Martinho de Melo e
Castro, de Bento Sanches de Orta, e de Guilherme Luís António de
ValIeré. De todos. estes discursos só foi publicado em separado, o
elogio de Pascoal José de Mello, que saiu em 1799, sendo mais tarde
reimpresso no tomo II das obras do autor os outros, juntamente com o
elogio de Alembert, que pode dizer-se que apenas se limita a ser a
tradução do elogio escrito por Condorcet, com uma Memória
destinada a provar a originalidade dos descobrimentos portugueses no
século 15, com uma, carta a Mr. Felkel acerca do seu método para
determinar os factores dos números naturais, constituíram o 1.º
volume das obras completas de Stockler publicado em 1805. No ano de
1800 publicara ele em francês: Lettre a Mr. le Redacteur du
"Monthly Review"; ou réponse aux objections qu'on a
faites dans ce journal à la methode des limites des fluxions hypothétiques.
Em
1801 foi Stockler chamado a servir em campanha debaixo das ordens
nominais do duque de Lafões, mas deu nessa infeliz campanha, como
é notório, os mais tristes documentos da sua ciência militar:
Apesar disso não deixou de ser nomeado membro do Conselho Ultramarino
e membro da Junta do Código Criminal Militar. Em 1807 era ainda
secretário da Academia, quando Junot invadiu o reino. Não se
mostrou Stockler muito avesso ao novo domínio, desejou sobretudo de
conservar os seus postos e rendimentos, e tendo a Academia eleito
para seu sócio honorário o general Junot, recusando-se contudo a
nomeá-lo seu presidente, como parece que Stockler desejava, apesar
de se ter associado à manifestação contraria que se fez no seio
da Academia, foi nomeado para ir apresentar o diploma ao
conquistador, fazendo lhe nessa ocasião um discurso laudatório.
Encarregara-o o mesmo Junot do comando da bateria de Areia, cujo
fogo impediu vários navios portugueses de se irem juntar à
esquadra que levava para o Brasil a família real. Estas provas de
confiança do general francês, o valimento de que gozava junto
dele, e a desgraçada missão académica, de que foi incumbido, não
contribuíram pouco para a animadversão que o governo português
lhe mostrou, logo que os franceses evacuaram Portugal. A regência
privou o de todos os seus cargos, e o conde de Linhares, ministro do
príncipe regente no Brasil, em resposta a um requerimento de
Stockler, que já então era brigadeiro, fulminou-o com o seguinte
oficio dirigido ao patriarca presidente da regência, a pedir-lhe
que informasse acerca do requerimento:
"Ex.mo
e rev.mo sr. Tendo levado à augusta presença de S. A.
R. o príncipe regente nosso senhor a carta inclusa e mais papeis
do brigadeiro Francisco de Borja Garção Stockler, cujos talentos
militares verificados na campanha de 1801, são assaz constantes
ao mesmo senhor, em cuja real presença é além disto mui pouco
acreditado pela missão em que foi mandado a Junot, e depois pelo
comando da bateria da Areia junto à torre de Balem, donde
barbaramente fez atirar sobre navios portugueses, que se faziam à
vela para saírem do Tejo; contudo S. A. R. ouvindo os sentimentos
da sua incomparável justiça e piedade, é servido que os
governadores do Reino informem, interpondo o seu parecer e depois
de ouvir o marechal general ou o marechal do exército se haverá
algum lugar activo em face do inimigo, onde o suplicante possa ser
empregado, e neste caso o proponham para esse posto, afim de que
se verifique se ele tem realmente grandes talentos militares, ou
se nesta matéria como nas outras se avalia muito além do que
vale; o que é assaz conhecido quando, como matemático, quis
associar-se ao tão justamente célebre Lagrange. Palácio de
Santa Cruz em 25 de Novembro de 1809. Conde de Linhares."
Este
ofício irónico mostra os ódios profundos com que Stockler tinha
de lutar. Entretanto, contudo era promovido a marechal de campo,
provavelmente porque lhe competia por antiguidade.
José
Acúrcio das Neves publicava então a sua Historia geral da invasão
dos franceses, e como ali se referia dum modo desagradável à
campanha de 1801, Stockler respondeu-lhe numa obra intitulada Cartas
ao autor da Historia Geral da invasão dos franceses em Portugal.
Eram 9, e Stockler apresentou-as em 1811 à Academia, mas esta não
as quis mandar imprimir: Como José Acúrcio também tratava na sua
História do caso da escolha de Junot para sócio honorário da
Academia, Stockler trocou com ele várias cartas particulares,
protestando contra o papel que José Acúrcio lhe atribuía. A
correspondência a que este. caso deu lugar foi publicada por
Stockler no Investigador Português. Em 1812 partiu Stockler
para, o Rio de Janeiro, e por tal modo se insinuou nas boas graças
do príncipe regente, que não só conseguiu que lhe fossem restituídos
todos os cargos de que a regência o esbulhara, mas foi nomeado
ainda governador e capitão-general dos Açores. Durante a sua
estada no Rio de Janeiro imprimiu ali, em 1813, as referidas cartas
que a academia em 1811 se recusara a publicar. Achava-se no Brasil,
quando por morte da rainha D. Maria I, o príncipe regente foi
aclamado rei; e em nome da Academia escreveu um Discurso dirigido
em nome da Academia Real das Ciências a S.M. o Senhor D. João VI,
por ocasião da sua exaltação ao trono; foi publicado no tomo
VI, parte I das Memórias da Academia. Regressando à Europa
para ir tomar posse do governo dos Açores, imprimiu em Paris no ano
de 1819, o seu Ensaio histórico sobre a origem e progressos das matemáticas
em Portugal, obra de que os críticos falaram com muito louvor,
entre eles José Silvestre Ribeiro na Resenha de Literatura Portuguesa,
tomo I, pág. 16 e seguintes. Nos Anais das Ciências, das Artes
e das Letras, no tomo V, pág. 138 a 156, também vem um extenso
e elogioso artigo.
Em
1821 mandou imprimir em Londres as suas Poesias líricas,
constando o volume de dezoito odes horacianas, doze salmos
traduzidos, duas epístolas, etc., e um canto dum poema filosófico,
as Aves, que fora principiado pelo grande poeta brasileiro
Sousa Caldas, mas que Stockler refundiu e aumentou muito. Além
disso, há também no volume uma larga dissertação sobre o ritmo e
a poesia hebraica. Este volume fora por Stockler submetido à
censura da academia para ser por ela mandado publicar. Encarregou-se
de dar parecer a esse respeito o dr. frei Patrício da Silva, que
depois foi cardeal patriarca, e este veio com uma censura em que
mostrou, que na dissertação acima indicada se aventavam ideias
paradoxais, e princípios menos ortodoxos, e que careciam de correcção.
O parecer era datado do convento da Graça, de 28 de maio de 1819.
Stockler
não quis conformar-se com este parecer, que a Academia aprovara, e
retirando o seu manuscrito, mandou o depois imprimir em Inglaterra,
sem lhe fazer a menor alteração. As Poesias líricas foram
efectivamente condenadas, mais tarde, em Roma, por decreto da
Sagrada Congregação do Index de 23 de junho de 1836, como
pode ver se no Index librorum prohibitorum, da edição de
1854. Havia rebentado em Portugal a revolução de 1820, e chegava
aos Açores a noticia. Sotckler aproveitou a ocasião para dar
penhores da sua fidelidade ao regime absoluto, já que fora acoimado
de jacobino por causa da sua subserviência a Junot. Efectivamente não
quis proclamar o regime da revolução. Garrett, moço ainda e
estudante de Coimbra, apareceu em Angra nesse tempo, e começou a
agitar os espíritos para os sublevar contra Stockler. Este mandou
avisar a família de que, se Garrett fizesse a mais leve demonstração
política, iria logo para a cadeia. Contudo, chegou a esse tempo a
fragata Pérola comandada por Marçal José da Cunha, e este
intimou Stockler para que reconhecesse o governo liberal. Stockler
insurgiu-se contra a intimação e resistiu, mas não encontrou o
apoio que esperava na população, e foi mandado preso para
Portugal, organizando-se na Terceira um governo provisório.
Mandou-lhe o governo instaurar processo, e deu isso lugar a longos
debates pela imprensa, escrevendo Stockler um Memorial dirigido
ao Ill.mo sr. Luís Manuel de Moura Cabral, desembargador
da Casa da Suplicação, etc., ilustrado com algumas notas, Lisboa,
1822; e além disso, muitas obras que assinava com pseudónimos ou a
que punha o nome do filho, António Nicolau de Moura Stockler, que
então contava apenas dezassete anos de idade. Essas obras são Cartas,
(1.ª, 2.ª e 3.ª) sobre os acontecimentos da ilha Terceira, por
um Cidadão imparcial; a Nota ao n.º 75 do Campeão
Lisbonense por um Amigo do general; Observações ou notas ilustrativas
do folheto intitulado «Voz da Verdade provada por documentos»;
Carta sobre o n.º 2 do folheto intitulado a «Voz da Verdade», etc
; Analise critica ao libelo famoso intitulado «Noticia resumida
dos acontecimentos da ilha Terceira na instalação do seu governo
constitucional», tudo isto com o nome de seu filho. Finalmente
o próprio, general respondeu com o seu nome num folheto a umas Notas
escritas por Vicente José Ferreira da Costa, a um ofício que
ele dirigira ao conde dos Arcos, ofício que os seus inimigos
publicaram em 1823. Estas questões e o processo terminaram com a
queda do governo constitucional em 1823, ficando o comportamento de
Stockler ilibado à face da lei, pois se tornava em acção meritória
o que até então lhe imputavam como delito. Foi novamente nomeado
governador dos Açores, como capitão-general, sendo também
agraciado com o título de barão da Vila da Praia, por decreto de
29 de setembro de 1823. Pouco tempo se demorou nos Açores. Em 1825
voltou para Portugal, e ofereceu à academia a sua obra Método
inverso dos limites ou desenvolvimento das funções algorítmicas. Ainda
desta vez o parecer académico foi muito desfavorável à publicação
da obra. Era a terceira vez que o desfeiteavam assim. Stockler então
irritou-se, mandou à academia a demissão de sócio, e imprimiu a
obra por sua conta. Em 1826 publicou o 2.° volume das suas obras
completas, que já principiara a imprimir-se na tipografia académica,
saindo o 1.º tomo em 1805, mas fora interrompida a impressão por
causa da invasão francesa. Encerra os elogios de D. Tomás Caetano
do Bem e de Pascoal José de Melo, o apêndice ás cartas ao autor
da Historia da invasão francesa, uma Carta sobre a liberdade
de imprensa um Esboço dum plano de Código Criminal Militar,
uma demonstração do seu proceder de 1807 a 1812, um projecto sobre
o estabelecimento da instrução pública no Brasil, e uma carta a
Jacome Ratton. Quase tudo havia já sido publicado Em 1827,
finalmente, quando se debatiam em Portugal as questões
constitucionais, escreveu Stockler, uns Elementos de Direito
Social, ou princípios de Direito natural, que devem servir de base
á constituição das sociedades civis. Stockler, como se
depreende, foi um dedicado partidário de D. Miguel, que o nomeou
governador das Armas na província do Algarve, e no exercício desse
cargo faleceu. Além das obras mencionadas, ainda escreveu uma Analise
da Memória publicada pelo dr. José Martins da Cunha Pessoa em o n.º
LII do Investigador português em Inglaterra, saiu também em
nome do filho, sendo publicada em 1816 no Rio de Janeiro; Lição
duodécima dos elementos de Geometria, a qual tem por titulo das
correlações que existem entre as operações elementares da tecnica
geométrica e da tecnica algébrica. Lisboa,: 1819; Breve
noticia da vida e obras de Francisco Dias Gomes; saiu no
principio das Obras poéticas do mesmo Gomes, mandadas
publicar pela Academia; Anotações e aditamentos ás obras do
padre António Pereira de Sousa Caldas, impressas em Londres.
O
barão da Vila da Praia casou duas vezes: a primeira, a 3 de janeiro
de 1796 com D. Inês Gertrudes de Mendonça e Moura, filha de D. João
Francisco de Moura, cavaleiro da Ordem de Cristo e escrivão da Mesa
Grande da Alfândega de Lisboa, e de sua mulher, D. Ana Catarina da
Silva e Távora; a segunda vez com D. Maria Margarida Stockler, sua
sobrinha, filha de António Xavier Sotckler, e de sua mulher D. Rita
Inácia de Brito Lambert.
Francisco
Borja de Garção Stockler - barão da Vila da Praia Academia
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