Princesa espanhola e rainha de Portugal.
Nasceu em Aranjuez a 25 de abril de 1775; faleceu em Queluz a 7
de janeiro de 1830. Era filha primogénita do rei Carlos IV de
Espanha e da rainha sua mulher; D. Maria Luísa Teresa de Bourbon.
Tendo apenas dez anos de idade, casou em 8 de maio de 1785 com o
príncipe D. João, filho de D. Maria I, o qual, em 1788, por morte
de seu irmão primogénito D. José, foi declarado príncipe
herdeiro, sendo mais tarde regente do reino, pela interdição de
sua mãe, e finalmente rei de Portugal, com o nome de D. João VI.
D. Carlota Joaquina passava geralmente por ser de ânimo perspicaz e
de dotes elevados de espírito, porém, as suas qualidades morais não
mereceram igual apreço. Ambiciosa, violenta, pretendeu logo dominar
a vontade de seu marido, e dirigi-lo nos negócios internos e nos do
Estado. Não se submetendo o regente, começou D. Carlota a olhá-lo
com desprezo e desdém, convertendo o lar doméstico em continua
luta, cujos menores incidentes eram discutidos e comentados nas praças
públicas.
D. Carlota dispôs as coisas de forma, que criou um partido seu,
e em 1805 divulgou-se que o regente descobrira uma conspiração
tramada contra ele por sua própria esposa. Dizia-se que ela, tendo
a seu lado vários nobres e eclesiásticos, projectava tirar o
governo a seu marido, e prende-lo, declarando-o incapaz de gerir os
negócios públicos. O conde de Vila Verde dispunha-se a abrir uma
devassa e castigar os criminosos, porém o regente, desejando evitar
maior escândalo, não consentiu, limitando-se a separar-se de sua
mulher, dando-lhe para residência o palácio de Queluz, onde antes
viviam juntos, passando ele a residir em Mafra, e a exilar alguns
fidalgos que mais se manifestavam afectos à princesa. A desgraçada
situação a que chegou Portugal, em 1807, fez com que os dois
esposos se reunissem por algum tempo, e a esquadra, que em Novembro
deste ano conduziu o príncipe regente e D. Maria I ao Brasil,
levava também a seu bordo a astuciosa princesa. No Rio de Janeiro
continuaram vivendo separados, cada um em seu palácio, reunindo-se
apenas, quando eram obrigados a comparecer nalguma solenidade pública.
D. Carlota Joaquina é que se não resignava à inacção política
a que se via condenada, decidida, como estava, a dominar como
soberana; e começando a lavrar no Rio da Prata os primeiros
sintomas de emancipação, concebeu o projecto de levantar para si
um trono nas províncias espanholas da América, ou pelo menos, de
governar como regente em nome de seu irmão Fernando VII. Auxiliada
pelo vice-almirante inglês Sydney Smith, e não encontrando oposição
em seu marido, foram enviados agentes ao Rio da Prata, onde formaram
um grande partido. As intrigas principiaram então a desenvolver-se
mais cruéis e enredadoras. O ministro inglês, lorde Strangford,
insinuou a D. João que o vice-almirante lhe desonrava o tálamo
conjugal. D. João pediu logo para Londres transferência do
vice-almirante. Satisfeito o seu pedido, Sydney Smith retirou-se,
vindo substitui-lo o almirante de Courcy. No entretanto, as divergências
eram enormes. No próprio governo havia correntes muito opostas. D.
João, cada vez mais abatido e com medo da mulher, pedia que não a
contrariassem sempre que as suas exigências não fossem impossíveis
de satisfazer. Anulados afinal os planos da rainha, nem assim ela
esmoreceu. Procurou ser agradável aos castelhanos, e conseguir, na
falta de seu pai e irmão, prisioneiros em Franca, ser nomeada
regente de Espanha, e vir talvez a ser a herdeira de Carlos IV,
abolindo-se a lei sálica que vigorava na monarquia. Para realizar o
seu projecto, teve de sustentar uma acerba luta com o embaixador
inglês, tendo a astúcia de alcançar que o governo da regência
lhe permitisse enviar secretamente ao general Élio, que estava em
Montevideu, víveres e dinheiro, para o que não hesitou em vender
as suas próprias jóias. Afinal, e visto não ser possível narrar
detidamente as variadas peripécias desta luta de orgulhos e de ambições,
o sonho que tanto seduzira D. Carlota Joaquina dissipou-se. Viveu
alguns anos afastada da política, sempre separada de seu marido,
que então, já havia sido aclamado rei, por ter falecido D. Maria I
em 1816, até que a revolução do Porto em 1820, que trouxe para a
Europa a família real, pôs novamente em evidência a rainha,
reunindo algum tempo os dois esposos.
Aliada aos frades, aos nobres, aos que se mostravam pouco simpáticos
ao novo regime, urdia a conspiração chamada da
rua Formosa, destinada a obrigar o rei a abdicar e a destruir a
Constituição. Falhando esse plano, as cortes de 15 de maio de 1822
decidiram deportar a rainha para o palácio do Ramalhão, por ela se
recusar a jurar a Constituição, alvitre que ela aceitou com júbilo,
pois lhe permitia continuar a sua obra perturbadora. Neste retiro
tramou ainda a queda da Constituição; e servindo-se do infante D.
Miguel, que ela educara, e com quem vivia intimamente, conseguiu
realizar o movimento conhecido por Vilafrancada
(V. este nome) em 26 do referido mês de maio. Derrubada a
Constituição e dissolvidas as cortes, foi levantado o desterro da
rainha, e o próprio D. João VI a foi buscar à quinta do Ramalhão,
conduzindo-a ao paço da Bemposta. Pouco tempo, porém, durou a
harmonia entre os dois esposos, porque a rainha mudou a sua residência
para Queluz, e tornou-se cabeça do partido absolutista que dentro
em pouco promoveu a Abrilada
(V. este nome) a 30 de abril de 1824. Tendo a rainha tomado
parte activa e manifesta nesse movimento, quando D. João VI,
apoiado nos embaixadores francês e inglês, se decidiu a mandar
sair do reino o infante D. Miguel, ordenou que sua mulher se
recolhesse ao paço de Queluz, e nunca
mais aparecesse na corte. A 10 de março de 18211 faleceu D. João
VI, tendo previamente nomeado uma regência presidida por sua filha,
a infanta D. Isabel Maria, e composta do cardeal patriarca, duque de
Cadaval, marquês de Valada, conde dos Arcos e os seus ministros de
Estado. D. Carlota Joaquina durante o governo de D. Miguel, que se
seguiu, auxiliou-o quanto pôde, vindo a falecer pouco tempo depois.
Instituiu
uma ordem exclusivamente destinada às senhoras, com a autorização
do príncipe regente, seu marido, por decreto de 4 de novembro de
1801, com a designação de Ordem das Damas Nobres de Santa
Isabel, cujos estatutos foram confirmados pelo alvará de 25 de
abril de 1804.