Portugal - Dicionário

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Maria (D.). 

 

n.      30 de abril de 1644.
f.       7 de fevereiro de 1693.

 

Filha ilegítima de D. João IV e duma senhora cujo nome se ignora, mas de quem diz o monarca no seu testamento, limpa de sangue, e que pelo tempo adiante entrou no convento de Chelas e professou a vida religiosa. 

Nasceu em Lisboa a 30 de abril de 1644, faleceu no convento de Carnide a 7 de fevereiro de 1693. 

Até à idade quase de seis anos, foi educada em casa do secretário de Estado António de Cavide, e aos onze anos, a 25 de março de 1650, entrou na clausura de Carnide do instituto das carmelitas descalças, por ordem do rei, a receber as instruções da madre Micaela Margarida de Sant'Ana, filha do imperador Matias da Alemanha, e parenta do referido D. João IV. Esta senhora confiou a sua educação a uma religiosa chamada Margarida da Ressurreição, muito estimada e considerada pelas suas virtudes, inteligência e instrução. Com o magistério desta religiosa e indicações da madre Micaela, D. Maria tornou-se uma senhora muito distinta e muito prendada, mostrando grande dedicação pela vida do claustro. Não se lhe conhecia nenhuma afeição mundana, nem vaidade no trajar, vestindo sempre com simplicidade. Escolheu para seu confessor frei Martinho da Conceição, homem muito erudito, sobrinho de D. Martim Afonso de Mexia, bispo de Leiria, Lamego e de Coimbra, e governador do Reino. Era devota em extremo, e o seu maior prazer consistia em assistir com as freiras aos exercícios religiosos. Quando seu pai faleceu, em 1656, contava D. Maria pouco mais de doze anos de idade, ficou tão pesarosa, que a si própria cortou os cabelos, e vestiu-se desde então com o hábito de carmelita descalça. 

D. João IV, no seu testamento feito a 2 de novembro de 1656, a tinha reconhecido como sua filha, e fazia-lhe a mercê da comenda da Ordem de S. Tiago, das vilas de Torres Vedras e Colares, e dos lugares de Azinhaga e Cartaxo, que logo fez juntamente vilas com jurisdição aparte, e estas doações de juro e herdade para sempre sujeitas à lei mental; e se no decorrer do tempo houvesse dúvida, ordenava ao seu sucessor satisfizesse tudo em equivalente. Ordenava mais, que lhe dessem 50.000 cruzados em dinheiro, para estabelecer sua casa. D. Afonso VI confirmou a doação, por um decreto de 18 de novembro do mesmo anho, e D. Pedro II, numa carta escrita a 25 de novembro de 1677, dava-lhe o tratamento de alteza, ratificando também todas as disposições contidas no testamento de D. João IV. Apesar de todas estas provas de dedicação e respeito, D. Maria preferiu conservar-se no convento, e que por humildade fosse nomeada entre as religiosas por D. Maria Josefa de Santa Teresa. Para serviço da religião, assistia às enfermas, preparava-lhes a comida, sujeitando-se a serviços os mais ínfimos; rezava com as religiosas no coro os ofícios divinos; comia no refeitório comum com as freiras, exercia mortificações com elas, durante a comida ia substituir o lugar de leitora para esta tomar a refeição. Não foi religiosa por instituto, apesar de desejar, mas não se diferenciava das freiras nos exercícios religiosos, e no hábito apenas se distinguia por ser um pouco menos grosseiro, e vestir linho, por causa dos seus sofrimentos. Nunca largou o hábito nas três vezes, que, por conselho dos médicos, foi às Caldas da Rainha fazer uso dos banhos. Acabado o curativo recolhia-se à clausura, sem querer demorar-se nem um só dia por motivo de diversão e recreio. 

O duque de Cadaval requestou-a para sua mulher, rejeitou delicadamente; também não aceitou a dignidade de comendadeira de Santos, que lhe foi oferecida, como aquelas senhoras pretenderam com o beneplácito régio. A sua resposta foi que D. Maria Josefa de Santa Teresa não deixaria o convento de Santa Teresa, nem depois de morta. A rainha D. Maria Francisca Isabel de Sabóia foi visitá-la a Carnide, fazendo-lhe grandes honras. Dava contínuas e avultadas esmolas, sensibilizando-se sempre muito e chorando com as desgraças e infelicidades que os pobres lhe contavam nos seus pedidos. Fundou a igreja de Santa Teresa dos carmelitas descalços de Carnide, principiada em 15 de outubro de 1662, e concluída quinze anos depois, a 15 de outubro com um triduo soleníssimo. Adornou-a de excelentes pinturas, custosas alfaias, uma custódia preciosíssima, lâmpada de prata, fez a capela do Senhor dos Passos. Gastou para cima de 210.000 cruzados, e estabeleceu para seu fundo os rendimentos anuais de 40.000 cruzados. Com estes benefícios mereceu o título de padroado celebrado por escritura pública de 15 de outubro de 1685. No mesmo ano deu principio à fundação do convento de S. João, de carmelitas descalços no lugar de Carnide, lançando-se a primeira pedra com grande pompa a 24 de junho, a que assistiu a corte. A pedra tinha a seguinte inscrição: «Maria Filia Joannis IV, Lusitaniae Regis hoc edificavit Monasterium anno de 1685, regnante Petro ll, fratre suo amantissimo, et invictissimo.» Em testamento deixou o padroado destes dois conventos a seu irmão D. Pedro II, pedindo-lhe humildemente perdão de quanto o desagradasse. Legou o recheio de sua casa à infanta D. Luísa, sua sobrinha, filha de D. Pedro II, que aos oito anos fora entregue aos seus cuidados, a 21 de fevereiro de 1687, e vivia na sua companhia. Quando faleceu, o rei D. Pedro II tomou luto por um mês, assim como toda a corte. O seu corpo foi sepultado no coro de baixo, num mausoléu onde se colocou um epitáfio em latim.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume IV, págs.
827-828.

Edição em papel © 1904-1915 João Romano Torres - Editor
Edição electrónica © 2000-2015 Manuel Amaral