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Seabra
da Silva
(José).
n.
31 de outubro de 1732.
f. 13 de março de 1813.
Fidalgo
cavaleiro e moço fidalgo com exercício na Casa Real, por alvará
de 20 de setembro de 1753, grande estadista, etc.
Nasceu
em Vilela a 31 de outubro de 1732, faleceu a 13 de março de 1813.
Era filho de Lucas Seabra da Silva (V.
o artigo seguinte), e de sua mulher D. Josefa de Morais
Ferraz.
Aprendeu
em casa os estudos preparatórios da Universidade debaixo da direcção
de um douto eclesiástico chamado Manuel de Sousa, e passou depois a
matricular-se na Universidade de Coimbra,
quando apenas contava doze anos, como consta de dois documentos autênticos,
transcritos por um neto do estadista António de Seabra num folheto
que publicou para responder a algumas asseverações feitas por Simão
da Luz Soriano na sua História do reinado de D. José. Um
desses documentos é a cópia da certidão do baptismo, que o
declara nascido na data já mencionada, o outro é a certidão da
matrícula e do doutoramento que prova que ele se matriculou na
faculdade de Leis a 1 de outubro de 1744, e que se doutorou a 21 de
abril de 1751, tendo por conseguinte doze anos quando entrou na universidade,
e dezanove quando se doutorou. Deve notar-se, porém, que isto se
passava antes da reforma da universidade feita pelo marquês de
Pombal. Vindo para Lisboa, onde seu pai era desembargador, fez logo
a 1 de março de 1752 o seu exame vago ou de jure aperto,
como se dizia, e com tal brilho que o marquês
declarou nas respostas aos quesitos que se lhe fizeram, quando se
lhe instaurou processo depois da sua queda, que tendo assistido a
esse exame, desde logo o distinguiu e prometeu a si mesmo empregá-lo
em cargo de confiança.
Não
o favor que desde logo adquiriu de Sebastião, que estava bem longe
então de ser omnipotente, mas os privilégios que nessa época
desfrutavam os filhos dos altos magistrados judiciais, fizeram com
que fosse logo despachado desembargador do Porto por alvará de 1 de
janeiro de 1763, quando ainda não completara vinte e um anos de
idade. Logo, porém, que o marquês de Pombal começou a adquirir
mais preponderância, não se esquecendo nunca dos homens para quem
fora deitando as vistas como seus auxiliares prestantes que podiam
ser, chamou José de Seabra para junto de si, e primeiro, como ele
próprio diz, encarregou-o simplesmente de ser o seu amanuense
particular, de lhe minutar os papéis de menos segredo. Auxiliando-o
vivamente na sua campanha contra os jesuítas, foi conquistando cada
vez mais as boas graças de Sebastião de Carvalho, que o fez seu
ajudante de estado, e que principiou a pensar em o nomear ministro
adjunto à sua pessoa, uma espécie de sub-secretário de estado. Em
1765 foi nomeado procurador da coroa, e nessa qualidade continuou a
ser um poderoso auxiliar do marquês de Pombal na sua guerra contra
os jesuítas e contra os jacobinos ou sigilistas. Por isso, tendo
sido nomeado a 25 de abril de 1765, foi logo a 11 de novembro do
mesmo ano nomeado chanceler da Casa da Suplicação, a 29 de abril
de 1766 guarda-mor da Torre do Tombo, sendo já desde 1757 fiscal da
companhia do Grão-Pará e Maranhão, desde 1760 executor da real
fazenda da rainha D. Maria Ana.
A
carta régia de 25 de janeiro de 1770 fazia-o desembargador do Paço,
e finalmente a 3 de junho de 1771 era nomeado ministro de Estado
adjunto ao marquês de Pombal. José de Seabra esteve no poder três
anos, merecendo sempre a confiança mais completa do grande
ministro, até que de repente desabou sobre ele a mais extraordinária
e implacável calamidade que é possível imaginar-se. A 17 de janeiro
de 1774 ia a família real partir para Salvaterra, e José de
Seabra, que costumava acompanhá-la, chegou ao cais de Belém quando
o rei já estava na galeota. José de Seabra, chegou se à beira do
cais, beijou a mão ao rei, e pediu-lhe as suas ordens. D. José,
porém, sem lhe dizer como ele esperava: Venha, disse-lhe apenas: Vá
recebê-las do marquês de Pombal. José de Seabra ficou suspeitando
apenas que haveria algum negócio urgente de que não tinha ainda
conhecimento, quando o rei outra vez o chamou só para lhe apertar
as mãos mostrando-se comovido. Então é que José de Seabra se
começou a perturbar, percebendo que havia novidade de maior vulto.
Assim que o rei partiu, correu a casa do marquês; este mandou o
entrar, e apenas se viram sós, lhe lançou os braços ao pescoço,
e disse-lhe também comovido que estava demitido e desterrado.
Perguntou-lhe José de Seabra o motivo de tão inesperada desgraça,
e o marquês só lhe respondeu, que cumpria com o mais vivo pesar as
ordens positivas e terminantes do rei. A ordem era a seguinte:
"Cumpre
ao meu real serviço que haja como hei por escuso de todos os
empregos que nele ocupou o doutor José de Seabra da Silva, e lhe
ordeno que no termo de quarenta e oito horas haja de sair da cidade
de Lisboa e seu termo, e no de quinze dias peremptórios se
apresente no Vale de Besteiros para dele não sair até segunda
ordem minha. O marquês de Pombal, do meu conselho de Estado e
secretário e ministro dos negócios do reino, o tenha assim
entendido e faça executar, registando-se este decreto no livro a
que pertence, e averbando-se os que por ele ficam reduzidos de
nenhum valor. Palácio de Nossa Senhora da Ajuda em 17 de Janeiro de
1774."
Fulminado
com esta ordem e sem a poder perceber, recebia ao mesmo tempo a
ordem verbal de sair de Lisboa sem o dizer sequer à família.
Cumpriu a ordem rigorosamente como fora dada, porque bem sabia o
risco que corria se ousasse faltar fosse em que fosse. Foi para Vale
de Besteiros e ali esteve três meses. De repente recomeça a
perseguição. A 16 de abril de 1774 uma ordem escrita toda pelo próprio
punho do marquês de Pombal, manda ao juiz de fora de Tondela que
auxilie no desempenho duma importante e urgente comissão de serviço
o corregedor de Évora João Baptista da Fonseca Teixeira Coelho
Cardoso. Essa comissão é a de ir prender na sua casa de Vale de
Besteiros o desterrado José de Seabra. Chegam os dois magistrados
acompanhados por uma força de cavalaria a sua casa no dia 30 de abril,
e levam-no preso para S. João da Foz no Porto, onde chegou no dia 4
de maio, deixando-o ali sepultado nas masmorras do castelo. E
entretanto em Lisboa promulgava o rei D. José outro decreto ainda
mais áspero que o primeiro:
"Por
quanto, dizia o decreto de 6 de Maio de 1774, pelo decreto de 17 de
Janeiro do corrente ano houve por escuso de todos os empregos que no
meu real serviço ocupava
o doutor José de Seabra da Silva, sou servido que na secretaria do
Estado dos negócios do reino seja lavrado o decreto original de 6
de Julho de 1771, que pelo sobredito ficou de nenhum efeito e que o
registo dele seja trancado e abolido, de sorte que mais se não
possa ler, e que este decreto seja registado no livro a que
pertence, guardando-se o original na forma do estilo. O marquês de
Pombal, do meu conselho, e secretário e ministro dos negócios do
reino, tenha assim entendido e faça executar. Palácio de Nossa
Senhora da Ajuda, etc."
Ainda
aqui não parou a perseguição. O corregedor de Évora, quando o
prendeu, confiscou-lhe o dinheiro que ele tinha em casa, e que eram
três mil cruzados. A 4 de outubro foi tirado do castelo de S. João
da Foz, e conduzido debaixo de prisão para um navio que seguia para
o Rio de Janeiro, não levando consigo nem dinheiro nem fato quase
como se fosse um marinheiro qualquer. Chegando ao Rio de Janeiro foi
mandado para a ilha das Cobras, até que o meteram numa sumaca
armada em corveta, e o despacharam para Angola, chegando a Luanda a
1 de março de 1775. Não era ainda o termo da sua viagem, porque
foi mandado para Purgo-Andongo, ou presídio das Pedras Negras. Era
esse o desterro mais cruel, que então se podia dar a um homem. Além
das intempéries do clima, chegou a sofrer privações, e quase que
padeceu fome, e padece-la-ia de certo, se o governador D. António
de Lencastre lhe não valesse. Qual era o motivo, porém, desta tão
inesperada catástrofe? É esse um dos enigmas mais insolúveis da
nossa história. Apenas correu em Lisboa a notícia da queda de José
de Seabra, circularam vários boatos a respeito do motivo de tão
repentino desastre, mas no que mais se insistiu, que se considerou
até adquirido para a história, e que Jacome Ratton consignou nas
suas Recordações, foi que José de Seabra tinha
conhecimento de um plano que o marquês de Pombal formara, de
combinação com D. José, para afastar do trono a princesa D.
Maria, e para fazer subir a ele o príncipe D. José, neto do
soberano, e muito estimado pelo marquês, e deixara transpirar esse
segredo, e que fora dali que resultara a queda do infeliz ministro.
Muitas razões, ainda assim, fazem com que se acredite ser falso
também esto boato. Dizia-se que o cardeal da Cunha o intrigara para
com o rei; o facto é que nunca se pôde averiguar o verdadeiro
motivo de tão atroz perseguição. Sabendo José de Seabra que em
1777, pela morte do rei e aclamação de D. Maria I, podia voltar ao
reino, partiu logo. Foi em Outubro de esse ano que a notícia chegou
às Pedras Negras, e foi no fim desse mês que ele partiu para
Luanda, a 20 de dezembro do mesmo ano que saiu de Luanda para a Baía,
onde chegou a 29 de janeiro de 1778. Depois de ali se demorar alguns
dias embarcou para Lisboa, sendo aqui recebido com verdadeira ovação,
indo imensa gente acompanhá-lo a sua casa de S. Sebastião da
Pedreira. Poucos dias depois dirigiu uma representação à rainha,
em que pedia que lhe fossem restituídas as honras de ministro que
lhe cabiam por ter exercido esse cargo, e que o indemnizasse do que
perdera, como fosse do seu real agrado. Nessa representação não
se queixava do marquês de Pombal, e declarava que nunca fora réu
do crime honrado que lhe imputavam, de ter revelado o segredo em que
se pretendia excluir do trono a rainha D. Maria I. Tornou-se isso
menos importante à soberana, e o certo é, que tendo-se proposto em
conselho de ministros uma pensão seis mil cruzados por ano para José
de Seabra, a rainha estranhou a quantia, e afinal concedeu-se a
comenda de S. Miguel de Oliveira de Azeméis, da Ordem de Cristo,
que rendia apenas dois mil duzentos e cinquenta cruzados. José de
Seabra retirou-se descontente para uma quinta próximo da Figueira,
onde começou a passar uma vida patriarcal com sua mulher. O infeliz
ministro havia casado em 1764 com D. Ana Felícia Coutinho Pereira
de Sousa Tavares da Horta Amado Cerveira, filha única e herdeira de
Nicolau Pereira Coutinho de Sousa Meneses da Horta Amado e Cerveira,
senhor de diversos morgados, e de sua mulher D. Francisca Maria
Tavares de Sousa Coutinho.
No
seu retiro, contudo, muitas vezes o consultavam como homem
experiente e prático das coisas da administração. Em 1781 foi
surpreendido pela nomeação de presidente da Junta do Código;
finalmente em 1788, tendo falecido o visconde de Vila Nova da
Cerveira e Aires de Sá, ministros do reino e dos estrangeiros, foi
José de Seabra da Silva chamado ao ministério juntamente com Luís
Pinto de Sousa Coutinho, indo este para a pasta dos estrangeiros e
da guerra, e aquele para a do reino. Não foi feliz este ministério,
porque foi exactamente o que teve de dirigir os negócios do país
quando rebentou a revolução francesa, e não os dirigiu com
acerto. O Ministério do Reino compreendia também então as actuais
pastas da justiça e negócios eclesiásticos e obras públicas.
Tendo encontrado já criada a Academia Real das Ciências, tomou várias
providências a seu favor; com relação à Universidade do Coimbra,
mandou-lhe entregar os títulos dos bens que tinham pertencido aos
jesuítas, e procedeu a outras medidas de importância. Criou o
lugar de superintendente geral e a Junta Directora dos Estudos,
tomou várias providências com relação ao Jardim Botânico,
Museu, Laboratório e casa de risco da Ajuda, mandou formalizar a
descrição geográfica e económica do Minho, nomeou urna comissão
para estudar cientificamente o Brasil e mandou estudar ao
estrangeiro alguns moços de talento, e finalmente foi ele o
fundador da Biblioteca Pública. Em obras públicas também fez
coisas importantes, consignando avultadas verbas para as obras da
barra do Porto, mandou fazer as estradas de Lisboa ao Porto, do
Porto à Foz, e a do Alto Douro, etc. Aboliu as ouvidorias,
determinou e demarcou as novas comarcas. Perto de onze anos durou o
ministério de José de Seabra, mas de súbito novamente caiu sobre
ele o desagrado régio. Fora a 15 de dezembro de 1788, que entrara
no governo, e foi a 15 de agosto de 1799, que foi de novo demitido.
As causas desta vez são conhecidas e honradíssimas para José de
Seabra.
Em
1792, achando-se completamente louca a rainha D. Maria I e incapaz
de se aplicar de qualquer forma aos cuidados do governo, José de
Seabra e os seus colegas deliberaram em conselho, depois de ouvidos
os médicos, que era indispensável que o príncipe D. João
assumisse a regência, mas entendeu José de Seabra, e à exortação
que ele lhes tez nesse sentido aderiram completamente os seus
colegas, que o príncipe entrasse a
governar
o reino, mas sem tomar abertamente a regência, como em Inglaterra
se fazia também com a loucura de Jorge III. Assim se resolveu, e as
coisas neste sentido caminharam por mais do sete anos, recebendo José
de Seabra constantes provas de estima e de consideração do príncipe,
sendo uma delas o título de visconde da Baía conferido a seu filho
primogénito Manuel Maria Coutinho Pereira de Seabra e Sousa a 16 de
junho de 1796, título que foi conferido ao filho e não a ele,
porque era o filho que descendia, pelo lado materno, dos primeiros
donatários da Baía de Todos os Santos. Em 1799, porém, resolveu o
príncipe D. João assumir a regência, e José de Seabra opinou em
conselho que a regência não se podia assumir sem a convocação
das cortes. Foi uma barreira que desde logo se levantou entre o príncipe
regente e José de Seabra. Ao príncipe D. João dominava-o uma
preocupação constante, o medo que lhe acontecesse o mesmo que a Luís
XVI. Falar-se-lhe em convocar as cortes, quer dizer falar-se-lhe em
fazer o mesmo que Luís XVI fizera convocando os Estados Gerais, era
o mesmo que anunciar-lhe que viria atrás de si uma Assembleia
Constituinte, a república e o cadafalso. Por isso, com uma
severidade que não estava nos hábitos do príncipe, apenas José
de Seabra proferiu o fatal conselho, com que os outros ministros não
concordaram, foi logo demitido pela segunda vez de todos os seus
cargos, e mandado para fora de Lisboa, para a sua quinta do Canal
junto da Figueira com a proibição de voltar à corte.
Surpreendidos por esta súbita resolução, os amigos de José de
Seabra intercederam por ele. Animados ao verem que se permitia ao
visconde da Baía que frequentasse o Paço, animavam também o
ministro exilado, dando-lhe esperanças de que o príncipe
reconsiderasse e o tornasse a chamar. José de Seabra consolava-se
com essa esperança, vendo demais a mais que, a pedido de sua
mulher, o príncipe consentira que ele se transferisse para a sua
quinta de S. João da Ribeira, por ser mais sossegada. Com tal rigor
procedeu o príncipe regente, que nem permitiu a José de Seabra em
1803 que viesse a Lisboa assistir ao casamento do visconde da Baía,
seu filho, com uma filha dos condes de Rio Maior. O governo começou
a precisar muitas vezes de recorrer aos seus conselhos, como sucedeu
quando D. Carlota Joaquina se quis assenhorear da regência, dando
seu marido por incapaz de governar. Nessa época, porém, já José
de Seabra estava em Lisboa, porque, em atenção à sua provecta
idade, fora-lhe permitido que se recolhesse à sua casa de São
Sebastião da Pedreira, em março de 1801, mas continuando a ser-lhe
proibida a entrada na corte. José de Seabra nunca mais foi recebido
pelo príncipe.
As
suas obras publicadas foram todas escritas no desempenho dos seus
deveres oficiais como procurador-geral da coroa. Além da Petição
de recurso, que
apresentou à rainha, conforme dissemos, e que publicou, em 1767
imprimiu também em 1769 um Memorial
sobre o cisma
do sigilismo.
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Genealogia de José Seabra da Silva
Geneall
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