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Martim Afonso de Sousa
Martim Afonso de Sousa

Sousa (Martim Afonso de).

 

n.    [ c. 1490 ].
f.     21 de julho de 1564.

 

Um dos nossos mais ilustres guerreiros e navegadores. 

Nasceu em Vila Viçosa, nos fins do século 15 ou princípios do 16; faleceu em Lisboa a 21 de julho de 1564. Era filho de Lopo de Sousa, criado da Casa de Bragança, e de D. Brites de Albuquerque. 

Foi senhor do Prado e de Alcoentre, alcaide-mor de Bragança e de Rio Maior. Educado no paço daqueles fidalgos, fez parte da casa de D. Teodósio, filho do duque de Bragança. Da casa de D. Teodósio passou para a do príncipe D. João, e depois, quando este subiu ao trono, soube conciliar-lhe o afecto e granjear também as simpatias do conde de Castanheira. É certo que fez rápida carreira, que foi admitido ainda novo no conselho do rei, e que desejando o governo mandar uma expedição de certa importância ao Brasil, por causa principalmente dos espanhóis que principiavam a visitar o Rio da Prata, e dos franceses que para aqueles lados dirigiam também as suas navegações, a Marfim Afonso de Sousa foi confiado o comando dessa expedição, que constava duma esquadra de cinco navios e quatrocentos homens. 

Não foi exclusivamente ao favoritismo que Marfim Afonso de Sousa deveu o comando que lhe foi confiado, mas também, e principalmente ao seu merecimento. Fora ele um dos mais aproveitados discípulos de Pedro Nunes, e nesta viagem fez muitas e importantes observações, que depois comunicou ao grande matemático, da mesma forma que lhe submeteu várias dúvidas que se tinham levantado no seu espírito acerca dos métodos indicados por Pedro Nunes, dúvidas a que este sábio respondeu nos tratados das cartas de marear, que andam juntas com o Tratado da esfera, impresso em 1534. Martim Afonso de Sousa partiu de Lisboa, passou pela baía de Todos os Santos, onde encontrou o português Diogo Álvares, que recebera dos índios o nome de Caramurú, e seguindo para o Sul entrou numa esplêndida baía, a que deu o nome de Rio de Janeiro, por julgar a baía a foz dum grande rio, e por ter entrado nela no dia 1 de janeiro de 1532. Como Martim Afonso levava largos poderes, sendo autorizado a repartir terras por quem as quisesse, a dar sesmarias, a criar oficiais de justiça e tabelionatos, a fundar enfim colónias como governador da Nova Lusitânia, segundo o título que lhe fora conferido, fundou em 22 de maio de 1532 numa ilha a primeira colónia portuguesa a que deu o nome de S. Vicente, por ser o santo do dia em que ela se fundava. Auxiliou-o muito na fundação dessa colónia um português, João Ramalho, que vivia com os índios no interior, e que, atravessando a serra, veio pôr-se à disposição de Martim Afonso com os índios seus amigos, e auxiliá-lo eficazmente. Na baía do Rio de Janeiro demorara-se Martim Afonso três meses, e ali construiu dois navios. Fundando a colónia de S. Vicente, deu-lhe foros de vida, mandou construir na sua vizinhança o primeiro engenho do açúcar que houve no Brasil, e que foi montado por madeirenses. Em seguida, guiado por João Ramalho, fundou no interior a vila de Piratininga, que é hoje a cidade de S. Paulo. Nomeou guarda-mor de esta última vila o próprio, João Ramalho, e guarda-mor da primeira Gonçalo Monteiro. Estimado pelos índios, fez com que dois chefes chamados um Pelyreça, e o outro Ararigboia, se convertessem ao Cristianismo, tomando ambos no baptismo o nome de Martim Afonso. 

Em 1533 voltou a Lisboa, e do bom resultado da sua expedição lhe provieram duas vantagens: em primeiro lugar: nomeado capitão-mor do mar da Índia, partindo para o seu destino a 12 de março de 1539; em segundo lugar ser contemplado nesse mesmo ano na distribuição das capitanias do Brasil que D. João III fez com a concessão de uma das mais belas a capitania de S Vicente, que hoje corresponde às províncias do Rio de Janeiro, S. Paulo, etc. Martim Afonso de Sousa partiu então para a Índia, e chegou quando Nuno da Cunha, que era então o governador, estava todo empenhado na construção da fortaleza de Diu. O sultão de Cambaya, Bahdur, não lhe quis conceder Diu, concedeu-lhe Baçaim, e Nuno da Cunha encarregou Martim Afonso de ir tomar posse dessa possessão. Foi Martim Afonso, mas pouco tempo depois o caprichoso sultão, que simpatizara com ele, e era homem extremamente volúvel, decidiu-se a fazer a concessão para se levantar a fortaleza de Diu. Era essa notícia esperada em Portugal com tanta ansiedade, que apenas a licença foi concedida, logo Martim Afonso expediu um despacho para o rei D. João III e outro para Nuno da Cunha. O sultão quis, porém, em troca à viva força que alguns portugueses o acompanhassem a Ahmedabad para o defenderem contra os mongóis, e exigiu que fosse Martim Afonso de Sousa o comandante. Partiu este efectivamente com ele, seguido de um terço de cavaleiros fidalgos e por uma escolta de espingardeiros. Na verdade, os nossos puderam medir-se com alguns mongóis, e completamente os destroçaram. Bahdur, satisfeitíssimo, não largava Martim Afonso, que foi pôr são e salvo em Ahmedabad, e regressou para Goa. Como a sua reputação de oficial valentíssimo se espalhara já por toda a Índia, numa contenda que se levantou entre o rajá de Calecut e de Cochim, foi Martim Afonso enviado em socorro de este nosso antigo aliado. Apenas Martim Afonso chegou, o rajá de Calecut achou mais prudente retirar-se mas Martim Afonso não queria deixar as coisas indecisas. Tratava-se entre os dois soberanos de saber se o de Calecut se havia de coroar ou não numa pedra sagrada que existia na ilha de Repelina. Para cortar de vez a questão, o que a Martim Afonso pareceu mais decisivo foi ir atacar a ilha de Repelina e trazer para Cochim a pedra sagrada. Prometeram auxilia-lo os chineses, mas diante do inimigo achou-se Martim Afonso sozinho com os seus soldados europeus. Não hesitou, deu assalto à ilha, tomou-a, arrasou-a, não só antes que chegassem os índios seus aliados, mas também reforços portugueses. O rajá de Calecute quis vingar-se, e caiu sobre o rajá de Cranganor, que também ambicionava a aliança portuguesa. Martim Afonso correu logo em socorro do rajá atacado, e estando à frente apenas de noventa portugueses, achou-se em frente de um do exército de cinco mil indianos. Não hesitou em combater, apesar da fuga dos índios de Cranganor que iam com ele, o que, o rajá, a que os nossos cronistas chamam Mangate, imitaria também se Martim Afonso o não segurasse com a sua própria mão. O ímpeto português ainda de essa vez triunfou. A derrota no inimigo foi completa. Entretanto, as coisas complicavam-se em Diu, e Nuno da Cunha mandou chamar para ali Martim Afonso de Sousa. O heróico oficial partiu logo, mas ao chegar a Diu já encontrou Bahdur assassinado, crime que abertamente condenou, não por julgá-lo atroz, mas porque o achava impolítico. 

Entretanto chegava em 1538 o novo governador da Índia D. Garcia de Noronha, e Martim Afonso tinha de ocupar-se de novo do rajá de Calecut. Pusera este em campo uma poderosa armada comandada por um índio espertíssimo, que os nossos cronistas classificam de corsário, e a quem chamam Patemanar. Martim Afonso logo o bloqueou no rio Passane, mas o inimigo escapou-se dum modo hábil. Mandou-o desafiar para o mar alto, mas em termos tais, que Martim Afonso, picado, aceitou o desafio, e abandonando a foz do rio, foi esperar Patemanar em sítio próprio para o combate naval. Como pode imaginar-se, Patemanar nem pensou em procurá-lo. O que fez foi mandar apresar alguns navios portugueses que andavam desgarrados, a comerciar, fiados na protecção da esquadra de Martim Afonso. Este não descansou enquanto não o encontrou em sítio azado. Escoou-se-lhe mais uma vez por entre as mãos, mas afinal foi apanhado por Martim Afonso para além do cabo Comorim, e sofreu uma derrota memorável. Marfim Afonso antes de regressar a Cochim, ainda destroçou mais três esquadrilhas, voltando enfim ao reino. 

Em 1510 morreu o vice-rei D. Garcia de Noronha, e ao abrirem-se as vias de sucessão, encontrava-se a nomeação de Martim Afonso de Sousa; ele, porém, não estava na Índia, e por isso abrindo-se a imediata, encontrou se o nome de D. Estêvão da Gama. D. João III logo em 1541 tratou de nomear de novo Marfim Afonso de Sousa governador da Índia. Saiu, pois, este de Lisboa com uma esquadra em que ia o apóstolo S. Francisco Xavier. Martim Afonso receava que D. Estêvão da Gama lhe não quisesse entregar o governo, mas D. Estêvão logo lho entregou a 6 de maio de 1542, que foi quando Martim Afonso chegou a Goa. Este governo foi um período de decadência e de corrupção; Martim Afonso mercadejava com tudo e com todos; fez uma expedição única. e exclusivamente para saquear um pagode. O exemplo tornava-se contagioso. Em Baticoli, que foi tomada por Marfim Afonso, a sofreguidão chegou a tal ponto que os portugueses desaviram-se uns contra os outros, mataram-se, de forma que os índios correram a retomar a cidade. Pois os portugueses fugiram, e deve se à habilidade e energia de Martim Afonso o ter conseguido ainda ditar a lei ao inimigo que pedia paz. Foi uma triste mercê a que D. João III fizera a Martim Afonso de Sousa nomeando-o governador da Índia, porque nem durante o seu governo teve uma expedição guerreira que lhe desse honra, nem mostrou a energia que manifestara antes de subir àquele altíssimo cargo, e deu ao mesmo tempo as provas mais deploráveis de avareza e de cinismo, que ainda mais em relevo se puseram na história por lhe ter sucedido, em 1545, D João de Castro, esse modelo de virtude e de austeridade. 

Martim Afonso chegou a Lisboa no princípio de 1546, e estava pacificamente ocupando o seu lugar no conselho de Estado, quando houve notícia que os turcos preparavam uma armada para vir atacar Lisboa e as costas do Algarve. Foi ele encarregado de tomar o comando da esquadra que havia de resistir a esse ataque, mas não lhe foi preciso dar novas provas do seu valor, porquê a armada inimiga não apareceu. Martim Afonso de Sousa foi casado com uma senhora espanhola, D. Antónia Pimentel.

 

 

 

Martim Afonso de Sousa, vice rei das Índias
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Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume VI, págs. 1061-1063.

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