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Arsenal
do Exército.
É
uma designação genérica na qual são compreendidas grande número
de repartições, fábricas, depósitos e oficinas para fabrico,
arrecadação, concerto e fiscalização e direção superior da
maior parte dos artigos, que constituem o material do exército nas
suas múltiplas e numerosas variedades.
Desde
os mais antigos tempos se cuidou com muita atenção, no nosso país,
em fabricar armas e em estabelecer depósitos para as arrecadar, a
fim de que em tempo de guerra se não estivesse desprovido para
ocorrer ao armamento e municiamento das milícias populares, como
tantas vezes foi mister. No local, onde está hoje estabelecido o
Arsenal do Exercito, existiram as antigas tercenas (V. este
nome), chamadas das Portas da Cruz, que um incêndio
destruiu completamente na noite de 11 de julho de 1726. O rei D. João
V resolveu reedificar as tercenas, sob um plano mais vasto e
regular, mas o edifício ficou sem magnificência e bastante
acanhado para o fim a que se destinava. Anos depois, o mesmo
soberano encarregou o arquiteto francês, Mr. Larre, de aformosear o
edifício. Aquele artista delineou um lindo pórtico, ou antes, um
corpo central, para adorno do portão da entrada, porém adoecendo o
rei, da doença de que morreu, as obras ficaram suspensas, estando
quase em princípio. Quando se deu o terremoto de 1755, ainda
conservavam em grande atraso, e sofreram graves prejuízos.
Foi
então, em 1760, que o marquês de Pombal tomou a iniciativa de
construir o Arsenal do Exército. Nesse mesmo ano se lançou a
primeira pedra nos alicerces, e começaram as obras, não sofrendo
interrupção alguma, até se concluírem. Tratam da criação deste
arsenal e sua reforma o alvará de 24 de março de 1764: e o decreto
de 29 de junho de 1773. Encarregou-se dos trabalhos o
tenente-general de artilharia, que estava ao serviço do rei D. José,
Fernando deI Chegaray; depois melhoraram muito o edifício Amaro de
Macedo, o tenente-general Manuel Gomes de Carvalho, e Bartolomeu da
Costa. Por decreto do 1 de julho de 1834, o Arsenal do Exército
teve grandes melhoramentos e reformas, feitas pelos inspetores,
coronel Leão e os generais barão de Ovar e barão de Monte Pedral.
O arsenal era conhecido vulgarmente pela Fundição para se destingir do estabelecimento de
construções marítimas, com seus respetivos armazéns e arrecadações,
a que o vulgo exclusivamente consignou o nome de arsenal: Porém
a verdadeira fundição, chamada de Cima, hoje Fundição
de canhões onde se fundem as peças de artilharia, é contígua
ao palácio destinado para residência do inspetor, em terreno muito
mais elevado e com serventias ingremes, fronteiro ao templo
incompleto de Santa Engrácia, no Campo de Santa Clara, e no extremo
deste campo, ao nascente, estão colocadas as ferrarias e o depósito
dos reparos e petrechos concernentes à arma de artilharia. É esta
uma parte integrante do arsenal, como também o é, a maior
distancia, o laboratório de fogos-de-artifício, a Santa Apolónia.
Vê-se, portanto, que é um corpo com os membros dispersos, o que
sem dúvida foi devido às diferentes épocas da edificação de
cada uma das partes avulsas que o compõem, e que nasceram da
necessidade de ocorrer ao fornecimento permanente e regular. Não se
quiseram perder os trabalhos já feitos, e como o terreno adjacente
não dava largas, criaram-se pelas vizinhanças os estabelecimentos
complementares.
O barão de Monte Pedral foi
quem começou, em 1842, a organizar na repartição, de Santa Clara,
um museu onde se guardassem modelos de máquinas, aparelhos e
objetos raros e curiosos, organização que foi sancionada pelo
decreto que em 1851 reformou o Arsenal do Exército. Mais tarde,
quando foi dada nova organização à arma de artilharia, em 1869,
passou o museu a estar a cargo do diretor da fábrica de armas. Em
1876, sendo diretor geral de artilharia, o general António Florêncio
de Sousa Pinto, foi o museu transferido para o edifício da Calçada
Nova, onde esteve instalado O extinto colégio dos aprendizes do
Arsenal do Exército. Foi encarregado deste trabalho o capitão de
artilharia Eduardo Ernesto de Castelo Branco, nomeado em 5 de
outubro de 1876 diretor do Museu de Artilharia, cargo que
actualmente exerce. Foi neste edifício que, na melhor disposição
das diferentes coleções, se atendeu á parte decorativa do
referido museu. Em 1895, sendo grande a ruina do edifício da Fundição
de Baixo, onde estavam instaladas as repartições do comando geral
da artilharia, tratou-se de criar recursos para proceder a um
concerto radical, que o pusesse ao abrigo de uma destruição
completa. Cuidou-se primeiro de se reconstruir a parte antiga, e
depois da sua ampliação até ao largo dos Caminhos de Ferro. Foi
em outubro de 1896 que começou a
instalação das repartições do comando-geral da artilharia no rés-do-chão
do edifício, destinando-se o andar nobre e o pátio da Fundição
de
Baixo para a instalação do Museu de Artilharia. Nos fins de
novembro de 1900, foi autorizada a criação de novos recursos
propostos, para com eles se fazer uma frente para o largo dos
Caminhos de Ferro.
As
instalações do museu tornam-se notáveis pelas magníficas obras
de talha, estátuas e quadros de autores portugueses, como os de
Bruno José do VaIe e de Columbano Bordalo Pinheiro. Os quadros de
Bruno são cópias dos de Lebrun no palácio de Versailles e alegóricos
a feitos históricos, e os de Columbano dizem respeito a feitos
militares das armas portuguesas nas diferentes partes do mundo. A
ornamentação do museu é completada com decorações feitas com elementos de
material de guerra. O edifício do Arsenal do Exército é de agradável aspeto, construído de cantaria magnífica e bem
lavrada. Tem uma bela fachada. As colunas que adornam a porta são
da ordem coríntia e monólitos. Sobre a janela principal estão as
armas portuguesas, e o entablamento é coroado de troféus
militares, tudo de mármore. Em frente da fachada havia um pequeno terreiro, que em 1874 se alargou com o terreno conquistado
ao Tejo, tomando então o título de Largo da Fundição. No
pavimento inferior estão os vastos armazéns de arrecadação, que
constituem o primeiro depósito, segundo o regulamento de 1 de julho
de 1834. O arsenal distingue-se como museu militar e como
estabelecimento industrial. Vêem-se ali armas de todas as épocas,
armaduras antigas e bocas-de-fogo, que só hoje se admiram como
recordação e como espécimen do tempo em que foram fundidas. Como
estabelecimento industrial encontram-se ali os trabalhos metalúrgicos
mais perfeitos do país, muitos dos quais rivalizam com os melhores
do estrangeiro. No andar superior do lado do norte do corpo central,
estão a secretaria, a contadoria, o arquivo e outras secções da
inspeção geral do arsenal. Do lado do sul vêem-se as cinco
importantes salas de armas, que compõem o Museu de Artilharia.
1ª. Europa, sala chamada da Rainha, que
primitivamente se chamou do Príncipe. Ao fundo tem o retrato
de D. Maria II num grande quadro pintado a óleo por Joaquim Rafael,
professor da Academia das Belas Artes. Este retrato está disposto
em meio de um troféu de bandeiras históricas. Por baixo do quadro
fica um estrado com uma soberba cadeira de espaldar. No teto vê-se
um quadro, intitulado Aljubarrota, trabalho de Bruno José do Vale,
feito em 1762. No centro está o génio da guerra, personificado por
uma figura possante de mulher alada, alçando na dextra o pendão
das quinas e cercada por atributos militares. Com a mão esquerda
indica um medalhão sustentado por dois anjos, onde se destaca o busto do condestável
D. Nuno Álvares Pereira. A sala tem muita obra de talha, sendo as
paredes revestidas de armeiros engenhosamente dispostos, contendo
250 bacamartes, 1.000 carabinas, 1.488 pistolas, 300 espadas, 12
armaduras, umas com lanças em punho e outras com espadas.
A 2.ª sala, África, intitulada do rei D. José I, tem o retrato
deste monarca, num magnífico quadro. Aos lados, colocadas entre os
vãos de quatro portas guarnecidas de lanças, estão quatro estátuas
alegóricas, esculpidas em madeira, representando: o Valor, a
Fidelidade, Vulcano e Marte. A sala encerra 12.600
espingardas, 1.000 carabinas e outras tantas espadas para cavalaria.
No teto vê-se o quadro, Ceuta, com duas figuras aladas, uma é
a Vitória, voando em direção de D. João I, meio envolto
na velha bandeira de Portugal. Aos pés dele se despenha do abismo o
poder maometano, representado por um mouro de aspeto torvo. Por detrás
do vulto pensativo do monarca, entrevê-se a figura tradicional do
infante D. Henrique, cravando no espaço o olhar profundo e
cismador, como a interrogar o infinito.
A 3.ª sala, Ásia, chamada de D. João V, tem o retrato deste
soberano, num quadro colocado entre duas estátuas de madeira
dourada, representando Minerva e Neptuno. Na sala existem 12.000
espingardas, 800 carabinas, e 1.000 espadas; as portas também são
guarnecidas de lanças. No quadro do teto, Goa, vê-se Vasco da Gama
apontando sobre o globo o seu itinerário glorioso. Junto dele
Afonso de Albuquerque indicando a figura de Goa, por eIe subjugada
ao poder português.
Voltada para essa figura, mostrando o dorso ao
espectador, a Abundância entorna a flux as gemas da sua
cornucópia. Na parte superior, o génio da Nação e
a Fortaleza coroam e saúdam os dois heróis. Á direita de Vasco da
Gama, o Oriente, personificado por opulento rajá, volve para eles o
olhar humilhado. Na parte inferior do quadro, um anjo erguendo belos
panejamentos de seda oriental, como a descobrir os heróis,
representa a Posteridade.
A 4.ª sala, América, conhecida pela das Armaduras, tem colocadas
simetricamente 32 armaduras de ferro, antigas, e um número igual ao
da 3.ª sala de espadas e espingardas, num total de 13.000 armas.
Servindo de ornato, também ali se vêm os bustos de André de Albuquerque
e de Duarte Pacheco. O quadro do teto, Brasil, representa a Fortuna
descobrindo aos olhos encantados de Pedro Álvares Cabral a
terra de Vera Cruz, figurada por um índio da América meridional.
As nuvens escuras indicam que a tempestade concorreu para arremessar
o herói às plagas do
Novo Mundo. Ao
fundo do quadro ainda se contempla, armado em guerra, o vulto de João
Fernandes Vieira, que durante a restauração do
1640 arrancou o Brasil das mãos dos holandeses.
A 5.ª
sala, alegórica às campanhas da
Liberdade, torna-se notável pelas quatro magníficas estátuas
douradas, postas entre as quatro portas revestidas de espadas;
encerra também 18.000 espingardas e 1.000 espadas para cavalaria, e
os bustos de D. João de Castro, do condestável D. Nuno Álvares
Pereira, D. Duarte de Meneses e Afonso de Albuquerque. No quadro do
teto vêem-se dois anjos pintados em fundo de nuvens, um dos quais
empunha a palma da vitória e ergue com a outra mão a bandeira azul
e branca. No teto da escada há belas pinturas. O quadro do centro
é trabalho de Bruno José do Vale, e as quatro partes do mundo, dos
quatro ângulos, são de Pedro Alexandrino de Carvalho e de Bernardo
Pereira Pegado. Nestas cinco salas, além dos retratos de D. Maria
II, D. José I e D. João V, em que já se falou, encontram-se também
os de suas majestades o rei senhor D. Carlos e da rainha, senhora D.
Amélia. O retrato do general de artilharia Sr. Eduardo Castelo Branco,
foi colocado no Museu de Artilharia, por ordem do general Silveira
Ramos, diretor-geral do serviço de artilharia, em 3 de outubro de
1900, por ter sido o referido oficial quem tão dedicada e
inteligentemente tem organizado o Museu de Artilharia. Além
dos bustos já mencionados, também ali se encontram os de D. Pedro
V, de D. Luís I, e de sua majestade o rei senhor D. Carlos I.
Em
seguida a estas salas, onde se vêm as bandeiras dos antigos
regimentos e batalhões, depois de se atravessar um salão quadrado
todo forrado de magníficos armários e arcas, e onde funciona num vão
de janela uma pequena estação telegráfica em comunicação com o
ministério da guerra e com o quartel-general, encontra-se o
gabinete do diretor-geral da arma de artilharia. Próximo fica a
biblioteca, e por cima o arquivo onde se conservam valiosos
documentos. Na sala da biblioteca celebra as suas sessões a Comissão
de Aperfeiçoamento. A artilhada de sítio esteve depositada num
terreno contiguo e agora acha-se no grande pátio no interior do
edifício. É aqui que se vê a notável peça de Diu, achada pelos
portugueses, quando tomaram esta cidade, depois da morte do sultão
Badur. É de bronze e de tamanho colossal, de carregamento pela boca
e destinada a atirar balas de ferro de 110 libras de peso. Tem 6 m e
6 cm de comprido, e pesa 19.494 k. (V. Diu e Artilharia,
museu de). Este museu tem um catálogo curiosíssimo, elaborado
pelo Sr. general Castelo Branco, trabalho consciencioso e utilíssimo,
que já teve duas edições, sendo a última no ano de 1901,
intitulado: Catálogo das coleções do Museu de
Artilharia. No
Arsenal do Exército fabricam-se armas de toda a qualidade, para o
que possui excelentes oficinas estabelecidas num pátio, com porta
para o lado do sul, tendo na frente um cais de cantaria com
guindaste para serviço do edifício. Há bem organizadas oficinas
de diversos ofícios mecânicos, a alguns dos quais se pode dar o
nome de artes, como o de abridor de metais, e o de fabricante de
instrumentos bélicos e matemáticos. Houve um colégio de
aprendizes, que foi extinto. No Museu d'Artilharia, no Arsenal do Exército,
veem-se muitos e diversos modelos, entre os quais se contam os das
estátuas do rei D. José I, e do duque da Terceira. No Dicionário
Universal Português Ilustrado, editado por Henrique Zeferino de
Albuquerque, vol. II, pág. 1308, vem um importante artigo,
descrevendo minuciosamente o Arsenal do Exército. Atualmente,
dezembro de 1903, o comando-geral da artilharia anda procedendo a
importantes obras neste arsenal devido à iniciativa do Sr. general Castelo Branco.
O plano do novo pórtico da fachada oriental, em construção, é do
distinto escultor Teixeira Lopes. Para o lado do rio Tejo, também
se projeta uma fachada, ficando assim o edifício muito mais amplo e
vistoso. V. Artilharia (Museu
de).
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O arsenal do Exército por Sérgio Veludo Coelho Estudo publicano em Lagos Militar
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