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O Portal da História Dicionário > D. Pedro de Sousa Holstein, 1.º conde, 1.º marquês e 1.º duque de Palmela
Duque de Palmela
Duque de Palmela

 

Palmela (D. Pedro de Sousa Holstein, conde de Sanfré, no Piemonte, e 1.º conde, 1.º marquês e 1.º duque de).

 

n.       8 de maio de 1781.
f.        12 de outubro 1850.

 

13.º senhor do morgado de Calhariz, Monfalim e Fonte do Anjo; capitão da Guarda Real dos Archeiros, alcaide-mor da Sertã; grã-cruz das ordens de Cristo e Torre e Espada; cavaleiro da do Tosão de Ouro; grã-cruz das de Carlos III, de Espanha; da Legião de Honra, de França; de Santo Alexandre Nevsky, na Rússia; cavaleiro da de S. João de Jerusalém; par do Reino e presidente da respectiva câmara; presidente da Câmara dos Senadores; conselheiro de Estado, embaixador extraordinário e ministro plenipotenciário em diversas cortes estrangeiras; representante de Portugal no congresso de Viena, ministro e secretário de Estado, presidente do Conselho de Ministros e da Regência estabelecida na ilha Terceira; marechal de campo, sócio honorário da Academia Real das Ciências, presidente da Sociedade Arqueológica de Setúbal, etc. 

Nasceu em Turim a 8 de maio de 1781; faleceu em Lisboa a 12 de outubro de 1850. Era filho de D. Alexandre de Sousa Holstein, conde de Sanfré, embaixador às cortes de Copenhaga, Berlim e Roma, e de sua mulher D. Juliana de Sousa Coutinho Monteiro Paim, (V. neste vol., pág. 374). 

A família de seu pai, Sousa Holstein, estabelecera-se em Portugal e readquirira bastante prestígio, sem deixar de conservar a casa do Piemonte. Incorrera nas iras do marquês de Pombal, e seu avô morreu nos cárceres da Junqueira. A família de sua mãe também sofreu com as prepotências do omnipotente ministro. Sua mãe, conseguindo casar, depois do desterro do marquês de Pombal, com D. Alexandre de Sousa Holstein, acompanhou seu marido às missões diplomáticas de que foi encarregado, e estava em Turim, quando nasceu D. Pedro, o futuro e notável estadista duque de Palmela, conforme dissemos. Logo nos primeiros anos começou para D. Pedro de Sousa Holstein a vida a ser agitada. Seguindo seu pai nas diferentes missões diplomáticas, percorreu com ele a Europa, educado mais pelos Pais de que pelos mestres, até que em 1791, tendo dez anos de idade, foi colocado numa casa de educação em Genebra, onde esteve até 1795, estudando regularmente os preparatórios para as escolas superiores. No mesmo ano de 1795, contando já catorze anos, veio estudar para Coimbra, mas não pôde concluir o curso a que se destinava, porque os deveres da hierarquia o obrigavam a alistar-se no exército, por ser o primogénito duma casa nobre. Em 1796 assentou praça no regimento de cavalaria, denominado de Mecklemburgo; em 1797 foi promovido a capitão e nomeado ajudante de ordens do duque de Lafões. D. Pedro era insinuante, esbelto, simpático; facilmente cativava aqueles com quem tratava, e até aqueles que o viam apenas de passagem. Em Lisboa relacionou-se com as nobres damas da corte, com a grande poetisa marquesa de Alorna, que se lhe tornou muito afeiçoada, e com os poetas daquele tempo. 

Em 1806 foi despachado conselheiro da embaixada de Roma, onde seu pai era embaixador. Partindo para aquela cidade demorou-se algum tempo em Florença, e ali conviveu com o grande poeta Alfieri. Em Dezembro desse mesmo ano faleceu seu pai, mas já D. Pedro conseguira captar a estima do papa e do seu secretário de Estado, o cardeal Consalvi, que pediram com instância ao governo português, que deixasse ficar D. Pedro no lugar vago pelo falecimento de seu pai. Assim se fez; ficando D. Pedro como simples encarregado de negócios junto da Cúria romana, grande distinção para um rapaz de vinte e um anos de idade, o qual provava o seu grande valimento! Em Roma conheceu e tratou com o grande Humboldt, e com o célebre químico Gay Lussac. A este acompanhou-o numa excursão científica ao Vesúvio, desejoso sempre de alargar a esfera dos seus conhecimentos e de conviver o mais possível com os homens que se tornavam por qualquer forma eminentes em qualquer dos ramos do saber humano. Noutra viagem de recreio, numa excursão que fez para o norte de Itália, encontrou-se também com a célebre madame de Stael, que tinha de exercer na sua vida tão pronunciada influência. Exonerado em 1805 da missão de embaixador junto da Cúria romana, passou dois meses em Coppet, na casa da ilustre escritora madame de Stael, com quem entretivera longa correspondência desde o seu encontro na Itália. Em Coppet, vivendo em intimidade, relacionou-se com os homens eminentes que frequentavam a casa da célebre escritora: Mathieu de Montmorency, Frederico e Guilherme Schlegel, Benjamin Constant, Sismonde de Sismondi, Barante, e outros. Foi a instâncias de madame de Stael que D. Pedro de Sousa Holstein escreveu a sua tradução em francês de alguns fragmentos dos Lusíadas, que em 1814 fez publicar no Investigador Português, de Londres, acompanhada duma carta aos redactores sem o seu nome. Os dois meses que passou em Coppet entregue a preocupações literárias, à beira do lago de Genebra, na convivência duma mulher amada e soberana pela inteligência, e de amigos todos ilustres e notáveis, foi decerto o tempo mais agradável da vida de D. Pedro de Sousa Holstein. A sua tradução francesa dos Lusíadas é uma das mais estimadas. Madame Stael revia-se com prazer nessa primeira produção literária do seu predilecto diplomata, e no manuscrito da tradução há muitas notas autografas da distinta escritora, que mostram quanto, ela se interessava pela obra de D. Pedro. 

No fim do ano de 1806 voltou a Portugal, mas conservou-se afastado, não só porque precisava tratar nos negócios de sua casa, mas por lhe aborrecer a corte, onde se pensava unicamente em misérias fradescas, sendo o nome de Napoleão temido, como o conquistador da Europa. Veio a invasão francesa, e D. Pedro continuou em Lisboa na mais completa abstenção, o que lhe valeu não ser incomodado, mas o seu espírito patriótico assistiu com tristeza a todas as vergonhas dessa deplorável época, e em 1808, apenas Wellesley desembarcou, D. Pedro foi apresentar-se para servir no exército que devia libertar Portugal, e com o posto de major foi nomeado ajudante de ordens do coronel Trant encarregado em 1809 de organizar as Milícias portuguesas. Quando nesse ano a Regência apelou para o patriotismo dos portugueses ricos, a fim de suprir a. deficiência do tesouro, D. Pedro foi um dos que primeiro e mais generosamente subscreveram para as despesas da guerra. As suas grandes aptidões, porém, eram mais diplomáticas e estatísticas do que bélicas, e o governo da Regência assim o compreendeu, nomeando-o nosso. ministro em Cádis, em 1810. Ao partir para esta nova comissão casou em 4 de junho desse ano com D. Eugénia Teles da Gama, menina de doze anos, filha dos marqueses de Nisa (V. este título), que foi sempre a sua digna companheira. Partiu logo para Cádis, onde se conservou até quase ao fim da Guerra Peninsular. Interessava-se então muito o príncipe regente em que fossem reconhecidos os direitos eventuais de sua esposa, D. Carlota Joaquina, à coroa de Espanha, abolindo-se por isso a lei sálica, e também em que se desse a regência à mesma princesa. D. Pedro tratou desse assunto com o tino e com a habilidade que sempre manifestou em todos os assuntos, e conseguiu o que se pretendia, menos a nomeação de D. Carlota Joaquina para regente de Espanha, malogro que ainda assim foi devido exclusivamente à intervenção do ministro inglês. Ao mesmo tempo a esposa do nosso ministro, apesar da sua tenra idade, mostrava tão nobre abnegação e tanta coragem por ocasião da febre-amarela que em 1811 salteou Cádis, que em pouco tempo conseguiu D. Pedro um grande prestígio e uma grande influência. 

O governo do Rio de Janeiro recompensou os serviços de D. Pedro, dando-lhe o título de conde de Palmela, por decreto de 11 de abril de 1812. No Outono desse mesmo ano foi transferido de Cádis para Londres, em substituição de D. Domingos António de Sousa Coutinho. Era esse o lugar mais importante da nossa diplomacia, principalmente nesse tempo, e mostrava a elevadíssima conta, em que era tido o jovem diplomata pelo governo. Efectivamente havia muito tempo que a embaixada em Londres era o noviciado dos nossos ministros dos negócios estrangeiros O marquês de Pombal, Martinho de Melo, visconde da Anadia, visconde de Balsemão, conde das Galveias, todos tinham sido ministros portugueses em Londres, antes de subirem ao poderem Portugal. Com tanto acerto procedeu Londres que, terminada a guerra, foi nomeado nosso plenipotenciário no famoso congresso de Viena, em 1815, tendo por colegas Joaquim Lobo da Silveira, que foi depois conde de Oriola, e António Saldanha da Gama, que foi depois conde de Porto Santo. Achava-se numa situação embaraçadíssima o conde de Palmela. Longe de ter o apoio de Inglaterra, quando demais a mais o plenipotenciário inglês era o duque de Wellington que tudo devia a Portugal, viu-se pelo contrário completamente abandonado pelo célebre general e nem conseguiu a restituição de Olivença, nem quantia superior a 2 milhões de francos (360 contos) na repartição pelas potências aliadas da indemnização de guerra de 700 milhões (1.260 contos) que a França, fora obrigada apagar. Mas ainda assim obteve, e já isso não era fácil, que um protocolo (que aliás nunca se cumpriu) os membros do congresso se comprometessem a interpor os seus bons ofícios para que a Espanha restituísse espontaneamente a Portugal a praça de Olivença. Era o mais que ele podia fazer. O congresso nunca pôde considerar como representante de Portugal senão o duque de Wellington. Para toda a Europa Portugal não era mais do que um satélite da Inglaterra. Desde o momento que Wellington nos abandonava, Palmela na da podia fazer, apenas pôde adquirir entre os diplomatas reunidos naquela assembleia solene um grande prestigio pessoal, que de muito lhe serviu no resto da sua carreira, e logo depois numa nova negociação. O conde de Palmela partira de Viena para Paris, onde ainda se protraíram as negociações, e apenas regressou a Londres em 1816, a primeira coisa em que pensou foi ver sua mulher que deixara em Lisboa em 1812, e que não vira portanto havia quatro asnos. Muito pouco tempo se pôde demorar na sua pátria, porque a atitude hostil da Espanha, que se mostrava muito ressentida com a nossa intervenção em Montevideu, e que nos denunciava à indignação da Europa, tornava indispensável e urgente a sua presença em Londres. Partiu pois o conde de Palmela, e encontrou a situação grave para nós. As grandes potências davam razão a Fernando VII, louvavam a sua moderação, e intimavam asperamente o governo de D. João VI para que mandasse plenipotenciários a Paris afim de tratarem do assunto de Montevideu. Os plenipotenciários nomeados por D. João VI foram o conde de Palmela, nosso ministro em Londres, e o marquês de Marialva nosso ministro em Paris. A escolha foi excelente, porque o próprio marquês de Marialva se estava longe de ter os talentos do conde de Palmela, tinha contudo um grande prestígio em Paris pelas suas maneiras fidalgas e pela sua extremada cortesia. O conde de Palmela, antes de partir para Paris, sondara as intenções das diversas potências, e tivera a habilidade de preparar os espíritos para uma solução bem diferente daquela que ao princípio ameaçara Portugal. Efectivamente, não foi pequena a surpresa de Fernando VII quando viu que o congresso dos negociadores chegara a um acordo, que lhe impunha a obrigação de entregar Olivença a Portugal, de lhe pagar uma indemnização pecuniária pelas despesas da ocupação do Montevideu, recebendo. das tropas portuguesas essa sua antiga colónia americana. Infelizmente a revolução de 1820 em Espanha, iniciada exactamente pelas tropas que deviam ir ocupar Montevideu, impediu a realização deste vantajoso convénio. 

Logo depois desta negociação, e por morte do conde da Barca, foi o conde de Palmela nomeado ministro dos negócios estrangeiros em 1817. Não agradou essa nomeação ao ilustre diplomata que preferia e muito a sua residência, como embaixador, num dos grandes centros intelectuais da Europa à partida para a cidade americana que estava sendo capital da vasta monarquia portuguesa. Demorou portanto, com vários pretextos, a sua residência na Europa, dando-se o facto curioso de chegar a haver em Londres dois ministros portugueses igualmente acreditados. Como demais a mais em 1817 sua jovem esposa fora juntar-se com ele, o conde de Palmela, achando-se bem em Londres, estava muito pouco disposto a ir meter-se no Brasil. 

Em 1820 enfim não teve remédio senão ceder às instâncias de D. João VI, e partir para Lisboa donde devia seguir para o Brasil. Chegou a Lisboa exactamente na ocasião em que rebentava no Porto a revolução de 1820. Pediu a Regência aterrado, conselhos ao diplomata, que lhos deu sensatíssimos, dizendo que era indispensável que tomasse a Regência a direcção do movimento, fazendo as concessões indispensáveis e prometendo convocar cortes. Essa resolução ia desnorteado a junta revolucionária, que pensou por um momento em se dissolver, mas, rebentando a revolução em Lisboa também, e fundindo-se numa só as duas juntas de Lisboa e Porto, a Regência teve de ceder. O novo governo não dispensou também os conselhos e os serviços do conde de Palmela, e aos seus bons ofícios se deveu entregar Beresford, que vinha do Rio de Janeiro, as somas que trazia para pagamento das tropas. Partiu logo depois para o Rio de Janeiro, em Outubro do mesmo ano de 1820, levando a notícia dos acontecimentos de Lisboa, e os conselhos que deu a D. João VI foram os mais sensatos possível. Hesitou o rei em segui-los em transigir francamente com o movimento liberal, até que a noticia das revoluções da Baía, Pernambuco, Pará e Maranhão veio confirmar completamente os conselhos do conde de Palmela. Resolveu-se então D. João VI a seguir a sua opinião, mas com as suas eternas hesitações ainda a modificou em pontos essenciais, e os decretos publicados no dia 21 de fevereiro de 1821, não sendo perfeitamente conformes com os que o conde de Palmela indicara, levaram-no a pedir energicamente a sua demissão que lhe foi dada a 26 de fevereiro desse mesmo ano. A 26 de abril de 1821 partiu a família real para a Europa, e o conde de Palmela acompanhava-a. D. João VI reconhecendo cada vez mais quanto eram sensatos os conselhos  e opiniões do conde de Palmela, não se fartava durante a viagem de o consultar a respeito de tudo, e como el-rei e o conde iam em diferentes navios cruzavam-se os escaleres no mar, a levar de um para outro lado as perguntas de el-rei e as respostas do conde de Palmela.  Como esses conselhos tinham sempre sido dados no sentido liberal, legitimamente se surpreendeu o conde de Palmela, sabendo que as cortes proibiam o seu desembarque em Lisboa, e em seguida que lhe ordenavam que escolhesse, para sua residência uma terra situada a vinte léguas de Lisboa. Profundamente magoado com esta injusta determinação, que assim o confundia com os inimigos do rei, retirou-se para Borba, obedecendo serenamente, e como ele, quando partira para o Rio de Janeiro, previra logo que não se demoraria lá muito tempo; e não levara sua esposa, esta correu logo a juntar-se a ele, e ambos em Borba viveram tranquilos, mostrando-se o conde inteiramente alheio aos negócios públicos, mas apesar do modo como fora tratado, continuou a nutrir os mesmos princípios liberais, e quando em maio de 1823 se deu o movimento da Vilafrancada que restabeleceu o regime absoluto, assinou em Borba o auto da aclamação do rei com rima referencia, explicita à promessa duma Constituição. Na verdade, D. João VI tinha sinceros intentos de cumprir o que prometera, e provara-o chamando aos conselhos da coroa o conde de Subserra e o conde de Palmela, a quem entregou a pasta do ministério dos estrangeiros. Estes dois estadistas trataram de nomear uma comissão, que se encarregasse de elaborar um projecto de Constituição, e isto desagradou profundamente à rainha D. Carlota Joaquina e a seu filho, o infante D. Miguel. Começou então para o conde de Palmela uma vida de tribulações e desgostos. Via os perigos da violenta reacção promovida pela rainha e seu filho; conhecia o ânimo frouxo do rei, que não podia nem queria resistir; adivinhava nas imensas desordens que num futuro próximo viriam assaltar a pátria. A Santa Aliança, em Paris, intimava por seu lado Portugal, a que não se afastasse dos vigorosos princípios do governo tradicional. Palmela, que entre todas as pessoas influentes era o único que queria o estabelecimento do governo constitucional, não podia arcar sozinho com as imensas dificuldades que por todos os lados lhe embargavam o passo, tinha de lutar sem apoio algum, contra a inércia do rei, a indiferença dos seus colegas, o ódio da rainha, do infante e aos seus partidários, e enfim; contra a oposição dos gabinetes estrangeiros, com excepção única da Inglaterra. Para conseguir que o rei efectuasse a sua promessa duma Carta Constitucional, fez quanto era possível, chegando a conseguir que se nomeasse uma junta por ele presidida,. para apresentar as bases desta forma de governo. Depressa, porém, se convenceu, que não só não alcançaria a realização da promessa real, mas nem sequer o estabelecimento das antigas cortes, com os dois braços do clero e da nobreza reunidos, e convocados periodicamente. O rei nem ao menos sancionou esta proposta da junta. A reacção violenta da Abrilada, em abril de 1821, patenteou o desgosto dos realistas, por. não terem conseguido; que a restauração de 1823 produzisse os efeitos que esperavam. Nesse movimento foi o conde de Palmela um dos primeiros indivíduos presos no paço da Bemposta; conduziram-no à Torre de Belém, e só a energia de sua mulher deveu o ser, quase imediatamente posto em liberdade. Depois do exílio de D. Miguel, D. João, VI continuou a conservar no ministério o conde de Palmela, mas por pouco tempo. Assoberbavam-no decididamente os mesmos que o tinham prendido na Bemposta, e o haviam forçado, a refugiar-se no vapor Windsor Castle. A prometida Constituição não se outorgara, e os dois ministros liberais, que a desejavam, foram demitidos em 1825. 

Por decreto de 3 de julho desse ano fora o conde de Palmela elevado ao título de marquês, sendo nomeado logo em seguida, para a embaixada de Londres, e nessa cidade estava quando recebeu sucessivamente a notícia da morte de D. João VI, da abdicação de D. Pedro IV em sua filha, a princesa D. Maria da Glória, e da outorga da Carta  Constitucional. . Estava ainda em Londres quando o infante D. Miguel ali, passou em, caminho de Portugal, afim de assumir; a regência que lhe fora confiada por seu irmão, com a condição dele casar com sua sobrinha D. Maria da Glória. Apenas teve notícia do golpe de estado de D. Miguel, o marquês de Palmela pediu logo a sua demissão, e sabendo pouco tempo depois que no Porto rebentara um protesto contra o golpe de Estado, combinou com Saldanha, Stubbs e outros generais irem tomar a direcção do movimento, e partiram para o Porto no vapor Belfast. Viram que o movimento fora prematuro, e que as tropas liberais não se poderiam sustentar em campo contra o general miguelista Póvoas, que já as batera em dois recontros. Tornaram então a embarcar um pouco precipitadamente, no Belfast, a 3 de julho de 1828, deixando numa triste situação as forças liberais, que a muito custo conseguiram passar a fronteira espanhola. Esta precipitação fez má impressão em todos os liberais, e o prestígio do marquês de Palmela sofreu bastante com isso. Pouco depois de regressar a Londres apareceu ali a rainha D. Maria ir, criança de dez anos que foi recebida no palácio Grillon, em Audley Street, onde morava o marquês de Palmela. A infantil rainha mal podia contar nesse tempo com uma restauração, as homenagens dos fiéis que estavam padecendo em Inglaterra por ela e pela liberdade. O ministério inglês mostrava-se hostil, a França guiada num sentido reaccionário pelos ministros de Carlos X, não favorecera também a nossa causa liberal, mas  um punhado de valentes proclamara nesse tempo na ilha Terceira a rainha D. Maria II e a Carta Constitucional, e o marquês de Palmela, não perdendo a esperança, reconhecido como chefe da emigração portuguesa, fazia verdadeiros prodígios para conseguir os meios indispensáveis para organizar duas expedições do conde de Saldanha e do conde de Vila Flor, que foram sucessivamente para os Açores, não conseguindo a primeira romper o bloqueio inglês, e conseguindo a segunda desembarcar o intrépido general que ia inaugurar com a vitória da vila da Praia a série, de triunfos que formam os diferentes cantos da epopeia liberal. Para organizar estas expedições empregou Palmela os maiores sacrifícios, porque mais duma vez teve de garantir ele próprio com o seu crédito pessoal os empréstimos que levantava. 

Em fevereiro de 1830 chegou a Londres D. Tomás de Mascarenhas com ordem de D. Pedro para que o marquês de Palmela fosse organizar na ilha Terceira a regência juntamente com José António Guerreiro e o conde de Vila Flor. Partiu logo o marquês num navio britânico Jack of the Lantern, deixando ficar em Londres com incumbência de dirigirem no estrangeiro os negócios das emigrações D. Tomás de Mascarenhas e Abreu de Lima, que foi depois conde da Carreira. Com imensas dificuldades lutou a regência da ilha Terceira presidida por Palmela, mas conseguiu enfim organizar uma expedição que tomou as outras ilhas dos Açores. Ao mesmo tempo chegava de França o duque de Bragança, D. Pedro com a expedição que organizara em Belle-Isle. Nessa mesma ocasião aportava à ilha de S., Miguel a marquesa de Palmela que trazia um filho moribundo, o conde de Calhariz, D. Alexandre, que veio a falecer com vinte e um anos de idade na ilha Terceira, a 21 de junho de 1832. O marquês tomou conta da pasta do ministério dos estrangeiros e interinamente da do reino, Mousinho da Silveira recebia as pastas da justiça e fazenda, Agostinho José Freire a da guerra, e o conde de Vila Flor tomava o comando do exército, o almirante Sartorius o da armada, e D. Pedro assumia a regência em nome de sua filha. Quinze dias depois da morte de seu filho, partia o marquês de Palmela na expedição que veio desembarcar no Mindelo em 9 de julho de 1832. A 29 desse mês e ano deixou a gerência da pasta dos estrangeiros e do reino, porque os seus serviços eram mais precisos fora do país do que dentro, das muralhas do Porto, apesar dele ser general. Duas vezes. efectivamente saiu do Porto, sempre. com o intento de alcançar dinheiro, que era o elemento essencial de que se precisava na cidade. Da primeira foi a Inglaterra, e encontrando-se com o seu amigo Carlos Napier, ouviu o plano que este lhe apresentava para fazer triunfar a causa liberal e, comunicou-o para o Porto, onde ferviam grandes intrigas contra ele, e quando o marquês saiu de novo para o estrangeiro no intento de alcançar as quantias necessárias para pagamento dos mercenários estrangeiros, imaginaram os seus inimigos, que se veria completamente perdido e nunca mais ousaria aparecer no Porto. Pois o marquês de Palmela não tivera nunca maior triunfo até então. Auxiliado pelo barão de Quintela, depois conde de Farrobo, Rodrigo da Fonseca, Henrique José da Silva, depois barão de Lagos, não só conseguiu levantar o dinheiro preciso, mas tendo sido aceites finalmente os planos e as condições de Napier, sendo uma delas que na expedição do Algarve fosse o marquês de Palmela seu companheiro, pôde organizar a esquadra que ia dar o golpe mortal na causa do despotismo. A 28 de maio de 1833 entrava o marquês triunfante no Porto, seguia logo sem demora para o Algarve, levando o encargo de organizar a administração Civil, com pleníssimos poderes, dos territórios que fossem sendo conquistados. Apenas chegou ao Porto a notícia do êxito completo da expedição, o entusiasmo foi enorme, e o marquês de Palmela aclamado com os maiores triunfos. 

D. Pedro o elevou ao titulo de duque do Faial, por decreto de 4 de abril de 1833, a qual foi depois substituído pelo de duque de Palmela, por decreto de 13 de julho do mesmo ano. O duque de Palmela entrava onze dias depois em Lisboa com as tropas vitoriosas do duque da Terceira. Apenas terminou a guerra, Palmela, que desde 1826 era par do Reino, foi elevado à presidência da respectiva câmara. Pouco depois morria D. Pedro, e a jovem rainha D. Maria II, que apenas contava quinze anos de idade, chamava o duque de Palmela para presidente de ministros, certamente por ultima disposição de seu pai. Nesse ministério o duque não tinha pasta; os ministros eram: o duque da Terceira da guerra, o cardeal S. Luís do reino, Ferraz e Vasconcelos da justiça, o conde de Vila Real dos estrangeiros, José da Silva Carvalho da fazenda e Agostinho José Freire da marinha: Este ministério composto de homens notáveis, foi contudo vivamente agredido. Os seus partidários foram alcunhados de Devoristas, porque o ministério distribuía por eles os empregos e as mercês; mais ferido por essa injúria que pela oposição política que se lhe fazia, o duque de Palmela, que a 16 de fevereiro de 1835 se encarregara da pasta dos estrangeiros que cedera de novo em 28 de abril ao conde de Vila Real, pediu a sua demissão a 4  de maio sendo substituído pelo conde de Linhares; e ao mesmo tempo pediu também a sua demissão de marechal de campo, posto que tinha no exército. Dias depois voltava ao poder, como ministro dos estrangeiros, no gabinete presidido pelo marquês de Saldanha, de 27 de maio. Este novo ministério durou pouco tempo, e o duque de Palmela foi um dos ministros que maior oposição levantaram, simplesmente porque, cumprindo o tratado da quádrupla aliança enviou a Espanha em socorro de D. Isabel uma divisão auxiliar que representou ali um brilhante papel. Deu isto lugar ao tumulto das Chagas, onde então residia o duque, e o nobre diplomata foi coberto de injúrias pelo povo, que não sabia compreender nem avaliar os grandes serviços prestados à causa da pátria e da liberdade. O duque achou-se então rodeado duma certa impopularidade. O governo caiu em 18 de novembro. No ano imediato rebentava a revolução de 9 de setembro de 1836, e o duque de Palmela lá teve de emigrar porque o seu nome era nesse tempo odioso à multidão. Homem, porém, como Passos Manuel e outros, não era possível que por muito tempo votassem o duque de Palmela ao ostracismo. Em 1837 o mesmo governo setembrista lhe pediu que aceitasse o cargo de embaixador extraordinário em Londres para assistir oficialmente à coroação da rainha Vitória em 28 de junho de 1838. Voltando depois a Portugal foi eleito senador e em seguida presidente da câmara dos senadores em 1841. 

Foi presidente do conselho no ministério organizado pela rainha D. Maria II a 7 de fevereiro de 1842, logo depois de Costa Cabral ter ido fazer a revolução do Porto em que restaurou a Carta. A rainha julgava apelar assim para a conciliação, nomeando um homem conhecido como cartista moderado mas as paixões estavam extremamente excitadas, e esse ministério, conhecido pela denominação de ministério do Entrudo, caiu dois dias depois em frente da atitude ameaçadora da guarnição de Lisboa, e foi substituído por um ministério francamente reaccionário presidido pelo duque da Terceira. Nesta ocasião sofria o duque de Palmela grandes desgostos domésticos por causa do projecto de casamento de seu filho com a filha do conde da Póvoa, projecto que se realizou depois do duque e da duquesa terem sido vítimas de muitas agressões e calúnias. A saúde de sua mulher ressentiu-se muito de todos estes dissabores e o duque de Palmela, que nem aprovava o procedimento do governo do conde de Tomar, nem aplaudia a insurreição de 1844, conservava-se afastado da política militante, cuidando dos seus negócios de família, e acompanhando sua mulher numa longa viagem à Itália, de que só voltou no fim do ano de 1845. Abrindo-se as câmaras em 1846, tomou uma atitude de oposição resoluta ao ministério que violara todas as regras liberais nas eleições do ano anterior, previu com a sua perspicácia a séria revolução que se aproximava, e quando efectivamente rebentou a insurreição da Maria da Fonte,  a rainha apelou de novo para a sua lealdade, e chamou-o ao poder no dia 20 de maio desse ano, dando-lhes a presidência do conselho, e colocando ao seu lado Mousinho de Albuquerque, conde do Lavradio, Sá da Bandeira, Joaquim António de Aguiar e Júlio Gomes da Silva Sanches, prometendo ao mesmo tempo que convocaria cortes constituintes. Infelizmente a rainha influenciada por maus conselhos, demitiu esse ministério em 6 de outubro de 1846, encarregando o marquês de Saldanha de formar outro governo. A notícia desse acontecimento transmitida, para o Porto foi a centelha que fez rebentar a mina de pólvora. A revolução da Junta do Porto veio pôr em dúvida mesmo a estabilidade do trono. O duque de Palmela não tinha temperamento revolucionário, mas não teve sequer tempo para se juntar aos revoltosos; como fizera o seu colega Mousinho de Albuquerque, porque foi mandado sair imediatamente de Portugal, tendo de deixar sua mulher doente e aflita. Era a segunda vez que o duque de Palmela tinha de emigrar depois de haver triunfado a causa liberal que tanto lhe devia. Só voltou depois de assinada a convenção de Gramido, em junho de 1847, que pôs termo à guerra civil. 

Enviuvou em 20 de abril de 1848; e nos dois anos de vida que ainda lhe restaram, conservou-se completamente afastado da política, pondo em ordem a sua correspondência oficial, recebendo na sua quinta do Lumiar os seus mais íntimos amigos. A morte do duque de Palmela foi muito sentida, e toda a imprensa lhe dedicou sentidas necrologias. 

Das suas obras e escritos mencionaremos as seguintes, além do que vai já citado: Manifesto dos direitos de Sua Majestade Fidelíssima, a senhora D. Maria II, exposição da questão portuguesa, Londres, 1829; nesta obra em que trabalhara igualmente José António Guerreiro, pertence ao duque a parte que diz respeito à questão histórica e diplomática; Manifesto de D. Pedro, duque de Bragança; deste manifesto houve duas edições, sem nota do lugar da impressão e nome do impressor; outra feita em Londres por Bingham, 1832, e outra de Lisboa, 1833; foi toda escrita pelo duque (então marquês) de Palmela, e aprovada sem alteração alguma por S. M. I.; Discursos parlamentares; proferidos nas Câmaras Legislativas desde 1834 até hoje, Lisboa, 1844, 3 tomos; Carta ao editor do «Diário do Governo» em resposta à «Curtíssima exposição de alguns factos», Lisboa, 1847. O duque de Palmela escreveu em diversos tempos muitos e variados artigos em jornais nacionais e estrangeiros sobre assuntos políticos e económicos com respeito a Portugal. Do muito que se tem escrito acerca do notável diplomata, citaremos o seguinte: Noticia histórica do duque de Palmela, por António Pedro Lopes de Mendonça, Lisboa, 18 9; Biografia, acompanhada de retrato, no Universo Pitoresco, vol. II, 1841 a 1842, pág. 296 e seguintes; Biografia e retrato no livro Varões ilustres das três épocas constitucionais, de Luís Augusto Rebelo da Silva, e na Revista Contemporânea de Portugal e Brasil, vol. V, pág. 399; Biografia, também com o retrato, Revista Contemporânea, 2.ª série, Novembro de 1857, pág. 41 a 46; Biografia por S. J. Ribeiro de Sá, na Revista Universal Lisbonense, tomo III da 2.ª série, 1850, pág. 61 a 65; um artigo necrológico com o retrato, na Revista Popular, tomo III, 1850, pág. 241 e 242; Retrato e fac-simile, na Ilustração, vol. II, 1846, pág. 53; Memórias históricas genealógicas dos duques portugueses do século XIX, por João Carlos Feio Cardoso de Castelo Branco e Torres e visconde de Sanches de Baena, Lisboa, 1883; Despachos e correspondência do duque de Palmela, coligidos e publicados, por J. J. dos Reis e Vasconcelos, tomo I, desde 9 de Abril de 1817 até 15 de Janeiro de 1825, Lisboa, 1851; tomo II, Desde 9 de Maio de 1825 até 26 de Dezembro de 1826, Lisboa, 1851; tomo III, Desde 3 de Janeiro de 1827 até 27 de Junho de 1828, Lisboa, 1854; tomo IV, Desde 1828 até 1835, Lisboa, 1869; Vida do duque de Palmela D. Pedro de Sousa Holstein, por D. Maria Amália Vaz de Carvalho, 2 vol. 1898-1899, etc. É também do maior apreço, no voto dos entendidos, a galeria de pinturas, reunida pelo duque à custa de longas e dispendiosas diligências. A este respeito pode ver-se o Catalogo dos quadres antigos e modernos, que formam parte da galeria do Ex.mo Sr. duque de Palmela em Lisboa, mandados á exposição filantrópica feita na Casa do Risco do Arsenal da Marinha em 1851, a beneficio das Casas de Asilo da infância desvalida; saiu na Revista Universal, tomo IV, 2.ª série, 1851 a 1852, pág. 143; continuado a pág. 153, e concluído a pág. 166. Por se não ter podido inserir no respectivo artigo o retrato de D. Isabel Juliana de Sousa Coutinho Monteiro Paim, mãe do grande estadista e diplomata, o 1.º duque de Palmela, aqui o publicámos juntamente com o de seu filho. 

O seu brasão de armas consta: Escudo esquartelado; no 1.º e 4.º quartéis as armas reais com o filete negro em contrabanda; nos 2.º e 3.º, em campo vermelho uma quaderna de crescentes de prata; timbre um castelo de ouro.

 

 

 

 

Pedro de Sousa Holstein, I. duque de Palmela
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Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume V, págs
. 416-421.

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