Evolução dos Uniformes

 

Os Uniformes no século XVIII


Soldado em 1740

Soldado de Infantaria, 1740


   © AHM

Soldados de Infantaria, 1762


Infantaria 1781

Soldados de Infantaria, 1781


Infantaria 1799

© AHM

Soldados de Infantaria, 1799


Os uniformes da infantaria portuguesa foram seguindo as evoluções da moda durante todo o século XVIII. No princípio do século, no reinado de D. João V, seguiam os uniformes das potências católicas - França, Espanha, Áustria, usando fardas de cor cinzenta clara - "alvadia" - de corte amplo, normalmente sem abas, com chapéus grandes, usados em tricórnio, com os granadeiros a usar barretes de pele.

Em 1762 os uniformes continuavam a seguir o modelo das potências católicas, sobretudo os do exército da Coroa austríaca, sendo que a cor das fardas tinha passado a ser branca, e as casacas tinham passado a ter todas abas de cor, que permitiam distinguir mais facilmente os regimentos. Com a declaração de guerra franco-espanhola de 1762, houve necessidade de aumentar os efectivos dos regimentos de infantaria, por estes estarem, desde 1754, com metade dos efectivos normais. A passagem de um efectivo de 360 homens por regimento para os 1.200 regulamentados em 1762 fez com que a produção de uniformes para o exército tivesse ficado completamente desorganizada, porque não havia nos armazéns militares uniformes suficientes para os recrutas que chegavam aos regimentos, nem tão pouco nas fábricas do Reino. Os regimentos  tiveram que se contentar com os panos que havia, e que se andava a procurar mesmo nas feiras do interior do País,  e por isso o exército português fez a «Guerra Fantástica» com uniformes de todas as cores - com os regulamentares brancos, mas também com azuis, verdes, amarelos, encarnados, etc. Ao longo do conflito parece ter-se conseguido uniformizar os regimentos com fardas brancas, azuis e castanhas. A maior parte dos 1.os batalhões dos regimentos receberam a farda regulamentar - branca -, sendo que alguns foram fardados de azul. Os 2.os batalhões foram uniformizados de castanho. Mas não é certo que tenha sido conseguido este tipo de uniformização para todo o exército. 

Com a assinatura da paz em 1763, era necessário distribuir novas fardas ao exército e dar aos vários corpos um uniforme. O modelo escolhido foi o prussiano. Fardas de cor azul escura, de corte apertado, com pequenos chapéus, usados em bicórneo. 

É a cor - "azul ferrete" - ainda utilizada nos uniformes de gala do Exército, e nos uniformes de parada da Guarda Nacional Republicana, e que foi enviada ao futuro Marquês de Pombal, e na altura já Conde Oeiras, em carta de ... A farda perdia o seu carácter espartano, que caracterizava o uniforme das potências católicas até ao fim das Guerra dos Sete Anos, e ganhava galões por tudo o que era sítio, tanto nas casas como nas dragonas, imitando também aqui a influência rococó nos uniformes da Coroa prussiana.

Este uniforme, que tinha como novidade - o toque português que alguns autores militares notam - a introdução de calções da cor da casaca, ao contrário do que era normal na época de serem da cor dos coletes, normalmente brancos, permaneceu até 1793 sem grandes  alterações.

É só em finais do século XVIII que o uniforme se começa a modernizar, devido possivelmente à experiência ganha na campanha do Rossilhão, entre 1793 e 1795, mas também, e sobretudo, porque se segue a moda e o usual nos outros exércitos. As abas dos uniformes da infantaria, que até aí só ocasionalmente eram fechadas, porque a construção da casaca, muito apertada, o não permitia, havendo mesmo regimentos que as não tinham nos seus uniformes, passaram a poder ser fechadas permanentemente, tendo os regimentos que não tinham "bandas" nas casacas dos uniformes passado a tê-las, protegendo assim o tronco das intempéries, o que obrigava a que a casaca fosse feita de uma forma mais ampla e confortável. Na mesma época a gola que se usava rebatida foi erguida.

Se essas modificações foram realizadas já no Rossilhão ou após o regresso da Divisão auxiliar a Portugal, não se sabe, mas o que é verdade é que em 1797 já existem exemplos dessa nova forma de fardamento. A preocupação com o combatente individual é uma das características do pensamento militar de finais do século XVIII, que reagia ao pensamento militar da época de Frederico II da Prússia, que tentara criar um soldado autómato por meio da imposição de uma disciplina brutal e de uma instrução militar repetitiva - o "drill".

É possível que os uniformes tenham sido modificados por sugestão do futuro Marquês de Alorna (ao tempo ainda conde de Assumar), imitando os uniformes que este escolheu para fardar o regimento de que era chefe em 1794. É o que parece poder entender-se da carta do Intendente Geral da Polícia, o célebre Pina Manique, ao secretário de estado da guerra, Luís Pinto de Sousa, quando escrevia que o «público» criticava

«o novo uniforme que adopta o conde de Assumar, de mandar fazer as fardas do seu regimento à imitação dos fardamentos franceses actuais, e isto é no modo com que são feitas as fardas, alterando o que manda o regulamento e o padrão que está nos armazéns do exército.»

O conde era chefe de um regimento de cavalaria, cujo uniforme se caracterizava pela inexistência de bandas nas fardas. As bandas não eram necessárias, e até eram prejudiciais, nos uniformes de cavalaria porque os soldados deviam usar peitos de couraça em serviço. Será que a imitação dos uniformes franceses, de que fala Pina Manique, é a introdução de bandas nos uniformes? É difícil de saber o que Intendente considera ser os «fardamentos franceses».

Em 1796, quando o conde de Assumar se tornou chefe (comandante com posto de oficial general) da Legião de Tropas Ligeiras, a farda será  curta e permitirá que se cruzem as bandas fechando assim a casaca. Em 1797 é também desta maneira que a Brigada Real de Marinha será uniformizada, assim como a Guarda Real de Polícia em 1802.

Possivelmente com esta evolução, foi com aquele uniforme mais amplo e confortável, que a infantaria portuguesa combateu os espanhóis em 1801 durante a "Guerra das Laranjas." 

Na cobertura da cabeça também houve modificações. O chapéu alto tão em moda na sociedade civil, introduz-se, com modificações, nos uniformes da infantaria, primeiro na Legião de Tropas Ligeiras, e na Brigada Real de Polícia, depois nas companhias de caçadores. Os primeiros exemplos do que irá cobrir em 1806, com o nome de barretina, toda a infantaria do exército português datam, na verdade, de 1797.

Todas estas experiências e modificações estão de acordo com as intenções do Duque de Lafões, que conhecemos por intermédio de um seu colaborador próximo, o Secretário do Exército  Francisco de Borja Garção Stokler, que escreveu as Cartas ao autor da História Geral da Invasão dos Franceses em Portugal e da Restauração deste Reino. Este autor afirma, na Carta V, que o Marechal General queria, no que toca aos uniformes, aumentar a protecção do soldado introduzindo os capacetes, os peitos de couraça de sola e as dragonas de metal em escamas, coisas que em 1796/1797 já estavam a começar a ser usadas. Na verdade, os uniformes dessa época passam a proporcionar aos soldados uma maior protecção, sobretudo aos oficiais e sargentos, gente que estava mais exposta às acções do inimigo, por não estar normalmente integrada nas fileiras da linha de combate, e que por isso precisavam de maior protecção individual. As dragonas de metal, tão características do plano de uniformes de 1806, fazem o seu aparecimento por esta altura.

Em 1797 dá-se outra pequena modificação no uniforme do exército.  O laço usado nos chapéus, de cor preta até esse ano, passa a ser das cores da casa real - o azul e o encarnado, exactamente o que tinha acontecido aos uniformes dos funcionários da casa real. Esta mudança vai fazer sentir-se em pequenas e grandes coisas, uma das quais está bem visível nas páginas deste local e que é a cor das bandeiras e estandartes do exército, que passam a ser de cor azul e encarnada.

O laço será utilizado por quase todos os corpos em cruz, e isto tanto nos chapéus como mais tarde, a partir de 1806, nas barretinas da infantaria e nos cascos da cavalaria, moda vinda com certeza da própria corte.

 

 

 

 

Os Uniformes da Infantaria de acordo com o plano de 1763

Denominação em 1801

em 1806

Gola

Canhão

Forro

Bandas

Vestia

de Lippe

nº 1

Carmesim

Carmesim

Carmesim

Azuis

Branca

de Lagos

nº 2

Encarnada

Encarnado

Encarnado

Amarelas

Amarela

1º de Olivença

nº 3

Branca

Branco

Encarnado

Brancas

Branca

de Freire

nº 4

Encarnada

Encarnado

Branco

Encarnadas

Branca

1º de Elvas

nº 5

Encarnada

Encarnado

Azul

Encarnadas

Azul

1º do Porto (1)

nº 6

Encarnada

Encarnado

Amarelo

Encarnadas

Amarela

de Setúbal

nº 7

Amarela

Amarelo

Amarelo

Azuis

Branca

de Castelo de Vide

nº 8

Branca

Branco

Encarnado

Azuis

Branca

de Viana

nº 9

Branca

Branco

Encarnado

Laranja

Branca

de Lisboa (2)

nº 10

Encarnada

Encarnado

Encarnado

Encarnadas

Encarnada

de Penamacor

nº 11

Amarela

Encarnado

Amarelo

Amarelas

Amarela

de Chaves

nº 12

Branca

Branco

Encarnado

Laranja

Branca

de Peniche

nº 13

Branca

Branco

Branco

Azuis

Branca

de Tavira

nº 14

Encarnada

Encarnado

Azul claro

Azuis

Branca

2º de Olivença

nº 15

Azul

Azul

Azul claro

Amarelas

Branca

de Vieira Teles

nº 16

Azul

Branco

Branco

Brancas

Branca

2º de Elvas

nº 17

Branca

Branco

Encarnado

Brancas

Branca

2º do Porto (3)

nº 18

Azul

Azul

Encarnado

Amarelas

Encarnada

de Cascais

nº 19

Azul

Azul

Azul claro

Azuis

Branca

de Campo Maior

nº 20

Azul

Azul

Azul claro

Azuis

Encarnada

de Valença (4)

nº 21

Amarela

Amarelo

Encarnado

Encarnadas

Azul

de Serpa

nº 22

Encarnada

Encarnado

Encarnado

Amarelas

Amarela

de Almeida

nº 23

Encarnada

Encarnado

Encarnado

Encarnadas

Amarela

de Bragança

nº 24

Amarela

Amarelo

Branco

Amarelas

Branca


(1) calções encarnados
(2) casaca e calções de cor Verde, como o antigo Regimento da Armada.
(3) calções amarelos
(4) calções encarnados

 

Fonte principal:
Carlos da Silva Lopes, "Contribuição para o Estudo dos Uniformes Militares Portugueses desde 1664 até 1806", in Documentos e Memórias para a História do Porto - XXIX: Exposição Histórico-Militar, em Homenagem a Mouzinho de Albuquerque, no 1.º Centenário do seu Nascimento, Porto, Publicações da Câmara Municipal do Porto, Gabinete de História da Cidade, 1958; pp. 47 - 183.

Soriano, História da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar, 1.ª Época, Tomo III, Documento n.º 21, págs. 93-96

continuação


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