D. Afonso Henriques em Lisboa
 
D. Afonso Henriques em Lisboa

 

De 910 a 1910

 

Da génese da Monarquia Portuguesa ao início da República

 


 

 Ver o currículo do AutorJoão Silva de Sousa*

 

“Com centro em Portugal, junto à foz do rio Douro, viria a constituir-se,  a partir dos finais do século IX, uma entidade político-administrativa cuja área se estendeu de sul do rio Minho,  até à chamada Terra de Santa Maria, já a sul do Douro”.

Nota de Bernardo Vasconcelos e Sousa.

 

1.

Foi durante o governo de Afonso III das Astúrias (866-911) que se deu início a duas situações muito importantes para o futuro Reino de Portugal independente, e para dar início, em 1179, à Monarquia Portuguesa que iria vingar até 1910, embora o seu espírito e as instituições criadas ao longo dos últimos anos perdurassem no sistema republicano e ainda hoje, por muitos, vivamente saudadas. Aliás, os benefícios que se aguardavam desde logo com o advento da República, só muito mais tarde foram parcialmente sentidos, não tendo ainda sido possível desgarrar a experiência monárquica de mil anos das bases estruturais e de convívio (a todos os níveis) que hoje saudamos no Portugal republicano. Infelizmente, quanto mais avançamos no tempo, mais nos sentimos engolidos pelas grandes potências e, no interior do País, vamos dando a devida nota a situações só comparáveis com o que de pior nos apresentou, ocasionalmente, o regime monárquico. Poderíamos dar aqui conta de muitos factores originários da desordem do Reino e da ira dos partidos opostos ao conservadorismo e mesmo ao constitucionalismo monárquicos. Recordemos tão-só a violenta morte do rei de Portugal e do Príncipe herdeiro, por um ódio que germinou com as consequências do Ultimatum que nos foi colocado pela Inglaterra. Curiosamente, fez-se o 25 de Abril por inúmeras razões, mas também para nos desfazermos das colónias e da guerra que as sustentava e que já não tinham razão de ser. Aquilo por que chorámos nos anos finais da monarquia veio a tornar-se um factor de desagrado e instabilidade generalizados durante o Salazarismo e o Marcelismo.

*

Em 910, o último monarca das Astúrias – retirado do governo um ano depois –, Astúrias essas que constituíram o último reduto da Cristandade hispânica fugida e refugiada dos Sarracenos, nos Montes Catábricos, – havia avançado nas conquistas até à linha do rio Douro1. Visualiza-se uma primeira feição geográfica do que viria a ser a futura Galiza2, além rio Minho e Portucale, aquém este, entre ele e o rio Douro. A faixa de terra entre estes dois cursos de água seria o berço de Portugal, como veremos adiante3. Ainda foi este monarca o primeiro a ser reconhecido como o Magno: como se de um imperador se tratasse ou de um basileus – como era chamado pelos filhos –, um soberano que acumulava todo o seu poder num só Reino, embora diminuto, o derradeiro monarca de uma lista de doze que mantiveram a união na progressão4.

Após um reinado brilhante, foi forçado a abdicar e a deixar toda a sua herança unitária dividida pelos filhos que assumiram a chefia dos reinos separados: Garcia I com Leão, Ordonho II com a Galiza e Fruela II com as Astúrias (911-925)5. Tratava-se de um espaço geográfico que não justificava a necessidade de repartição. Diz-se, em abono deste esquema um tanto arriscado face ao inimigo e ante a notória fragilidade dos Cristãos, que a prática Goda havia vencido a necessidade de união: divide-se o espaço pelo número de filhos do falecido monarca.

 

Brasão de D. Afonso Henriques

E assim foi sucedendo, com Fernando Magno, o primeiro da dinastia de Navarra (1037-1065), bisavô de D. Afonso Henriques (1109-1185), primo de Afonso VII (1105-1157), um rei que se intitulava de Imperador, a este o Infante portucalense incomuniado, e a cuja morte o território voltou a passar pela experiência da separação, ficando cada um dos dois filhos com a sua parte: Fernando II (1137-1188) que herdou Leão e a Galiza e Sancho III (1134-1158) que conservou Castela por um ano, tendo-lhe sucedido seu filho Afonso VIII (1155-1214). Os dois reinos permaneceram separados até 1230 e o título imperial foi, consequentemente, posto de lado.6

Ainda assim, a ideia imperial hispânica não conviria ser travada, na acepção de historiadores Espanhóis. Eles explicam, por outras palavras, a existência de duas frentes, as quais convinha travar, quer nos seus movimentos expansionistas, fosse no poder crescente que iam tendo no espectro político mundial. Um era o Califa de Bagdad, representado, na Hispânia, pelo Emir de Córdova, “dos Crentes” no Livro, em Deus e no seu Profeta. O Califa e o Emir tinham uma força militar fora do comum, facilmente perceptível pelo facto de, em 622, após se terem unificado as tribos na Arábia, através da Jihjad, espalharem a palavra de Deus no Mundo. Em cem anos, dominarem todo o Oriente, o Mediterrâneo, o Norte de África e, sem custo, a Península. A outra era representada pelo Imperador do Sacro Império Romano Germânico que, inclusivamente, disputava o Poder com a própria Santa Sé que nele havia delegado a temporalidade. O problema situava-se no facto de não estar determinada a fronteira entre os poderes espiritual que cabia ao Sumo Pontífice e o temporal da incumbência do imperium laico. Uma terceira força impunha-se, pois, na Hispânia, acatando os deveres para com Roma e limitando, cada vez mais, a intromissão do Imperador na gestão interna de cada reino peninsular. 

Quadro 1

Ascendência de D. Sancho I, incluindo D. Henrique da Borgonha e D. Teresa de Leão7

                      Roberto I

            (Rei de França, c. 866)

                            |

                   Hugo, o Magno

(Marquês da Neustria, Duque de França, 

                    895-956)

                             |

                  Hugo I Capeto

          (Rei de França, 941-996)

                             |                                                                                    Sancho III, o Magno

                  Roberto II, o Pio                                                                  Rei de Navarra, 991-1035

          Rei de França, 972-1031                                                                             |

                             |                                                                                    Fernando I, o Magno

                 Roberto I, o Velho                                                        Rei de Leão e Castela, 1016-1065

    Duque da Borgonha, 1011-1076                                                                       |

                             |                                                                                           Afonso VI

             Henrique de Borgonha                                                     Rei de Leão e Castela, 1039-1109

                   1035-1074                                                                                          |

                            |                                                                                                 

             Henrique de Borgonha                                   c.c.                        Teresa de Leão

      Conde Portucalense, 1066-1112                             |                               1080-1130

                                                                                       |

                                                                   D. Afonso Henriques,      c.c.        D. Matilde

                                                                     1.º Rei de Portugal,          |           1125-1157

                                                                        1109-1185                     |

                                                                                                    D. Sancho I

                                                                                        Rei de Portugal, 1154-1210

 

Portugal, desde o início do seu “Estado” –, por sua vez, a tentar também, a separação política do sistema imperial hispânico –, foi palco e resultado de manobras levadas a termo por adeptos da unidade de Portuscale: o conde D. Henrique (1066-1112), a rainha D. Teresa (1080-1130) e o filho de ambos, o infante D. Afonso Henriques (1109-1185)8, cada um na sua altura própria. A experiência Goda nunca fora pensada, muito menos posta em prática. A principal atitude política do governante teve por base a continuidade da “reconquista”, ou seja a guerra, e, sempre a esta aliada, uma linha imparável, desenhada pela necessária diplomacia, porque a Igreja em Portugal tinha de ser una e independente e o território também. A Castela a Sé que lhe pertencia e a nós a bracarense que os Suevos haviam implementado desde S. Martinho de Dume (518-579)9.

Henrique, cuja origem provém dos reis de França, – descendendo de Roberto II e de Henrique I – chega à Península num dos contingentes da sua terra natal que, pelos finais do século XI, antecedendo o movimento geral das cruzadas do Oriente, por aqui passaram, com o objectivo de restituir à Cristandade as terrae tomadas pelos Muçulmanos. Casou com Teresa, em 1093, filha ilegítima de Afonso VI, a qual, por este facto, travou um tanto a independência do futuro Reino que, à época, teria como limites os rios Minho e Vouga.  

Sinal da Bandeira de D. Henrique. Mais tarde, da primeira bandeira do Reino de Portugal

Caracterizadamente uma senhora de política activa e concepções de estratégia militar, Teresa de Leão revelara-se grande auxiliadora da política do marido, mas não pôde nunca esquecer a situação feudal que se acercava então dos governantes dependentes do imperador castelhano-leonês. Mulher e marido levaram o território até à linha do Tejo, por 1096, flectindo para Noroeste, por perto de Abrantes. Este novo espaço, já perdido com Raimundo, não podia voltar às mãos do inimigo e assentaram residência, por uns tempos, nos Paços em Viseu, onde veio à luz D. Afonso Henriques, em Agosto de 110910. De acordo com os apanágios que Henrique e Teresa receberam do sogro e pai, Afonso VI de Leão, deitaram eles também mãos a acções semelhantes, fazendo doações de fundus territoriais a quem previam poder desenvolver a terra, base da economia na época e demonstração evidente de que o Cônsul havia recebido a Terra, pro sua hereditas, na categoria de feudo, podendo dispor dela dentro dos limites costumeiros, entre eles doações, vendas, trocas, compras, constituições de novas terras, confirmações e privilégios.

Falecendo Henrique, em Astorga, em 1112, ficou a sós D. Teresa, tendo-se, provavelmente, recolhido a Coimbra e deixado à vontade seu filho que fora escolhido para, com dezanove anos, ficar a constituir o símbolo máximo de uma revolta que tomou lugar em Guimarães, a 24 de Junho de 1128, onde as tropas feudais que secundaram Afonso venceram as de sua mãe, – aliada a Fernão Peres de Trava (1100-1161?), um representante de uma das principais famílias galegas, – conde de Trava e Trastâmara – e que com ela vivia. Em Guimarães, nasceu Portugal e grandes passos se deram conducentes ao início das tentativas que ocasionariam a independência do futuro Reino, a cujo governo presidiria o Infante D. Afonso. Recolheu-se D. Teresa, vencida, a Zamora, onde veio a falecer em 113011.

O local da batalha é-nos dado pela Chronica Gothorum, onde se diz que “commisit  prelium  in  campo  Sancti  Mametis  quod  est prope castellum de Vimaranes et contriti sunt”, – referindo-se aos inimigos12. Assim, o recontro de 1128, travado no triângulo formado pela veiga de Creixomil, campo de S. Mamede e Ataca, em que se defrontaram as hostes de D. Teresa com as do infante Afonso Henriques, seu filho, pôs praticamente termo ao dissídio entre as duas facções rivais, com a vitória do Príncipe e a sua investidura no governo da terra Portucalense.

Foram numerosos e aguerridos os confrontos políticos de Afonso de Portugal com seu primo Afonso de Leão, recentemente eleito Imperador de Leão e Castela (1135). Irrequieto, Afonso Henriques invade a Galiza, toma terras, tem ainda tempo para mandar construir barreiras de defesa e, desapossado de tudo, regressando aquém Minho, Afonso VII, concerta um tratado em Tui, assinado a 4 de Junho de 1137, cujos termos não foram respeitados pelo jovem Afonso Henriques que voltou a invadir a Galiza.

Pela parte portuguesa, confirmam o pacto, o arcebispo de Braga, D. Paio Mendes (1118-1137), e o bispo de Porto, nessa altura já João Peculiar (1136-1138) e, do lado leonês, conforme a Historia Compostellana, os bispos de Lugo, Tui e Orense, aos quais se aliaram os de Burgos, Palência e Segóvia, sendo de crer que fossem estes seis prelados quem trabalhasse, então, na concórdia entre o Condado Portucalense, a Galiza, Leão e Castela e os seus príncipes13.
Que dizia, então, o texto desse pacto? Que o infante D. Afonso prometia fidelidade e amizade ao Imperador, a quem nunca provocaria morte ou dano; que o infante prometia, ainda, respeitar os territórios portugueses do primo, de tal modo que os não tornaria a invadir, e se algum dos seus barões o fizesse, ele ajudaria lealmente a restituí-los e que se os filhos do Imperador quisessem manter a paz, D. Afonso ficava obrigado a fazer o mesmo. Selando este importante acto, Afonso VII concedeu ao primo o senhorio de Astorga, (que já havia pertencido a seu pai), pelo qual D. Afonso Henriques, se constituía vassalo de Afonso VII.

Esta reacção militar constante por parte de D. Afonso Henriques adveio do simples facto de, ao herdar a terra de sua mãe, a área apenas compreendesse, aproximadamente, os actuais distritos do Norte de Portugal a Viseu14.

A evidente submissão que este acto representa para D. Afonso Henriques, é surpreendente, face até à anterior vitória militar que obtivera em Cerneja15. Não há que questionar esta aparente contradição, nem colocá-la em dúvida, dado que, a 5 de Outubro de 1143, em Zamora, Afonso havia, como vimos, posto em causa todo o clausulado fixado em Tui, na presença de um emissário papal, o cardeal Guido de Vico. Nesta assembleia, Afonso VII reconhecia o primo como rei e a terra portucalense como reino, embora mantendo todas as cláusulas de auxílio militar, sempre que preciso16. Não seria ainda a aguardada independência, mas era já um longo passo em frente, face a quanto Portugal e o seu Rex pretendiam.

O infante Afonso Henriques apressou-se a solicitar a Inocêncio II a confirmação das importantes decisões aí tomadas, escrevendo-lhe a carta Claues regni coelorum, prometendo-lhe vassalidade – tornava-se, deste modo, vassalo lígio do Papa –, uma tença paga anualmente, no valor de 120 gramas de ouro e a progressão no teatro de guerra, lutando contra os “infiéis”. Inocêncio II (1130-1143) já não era do número dos vivos, quando o documento chegou a Roma. Sucederam-lhe, num ano, dois outros Pontífices: Celestino II (1143-1144) e Lúcio II (1144-1145). Roma não apoiava tentativas de separação. Pretendia, ao invés, a união política sob uma chefia suprema que não pusesse, de forma alguma, em causa a luta contra os Mouros. Além do mais, Afonso VII de Leão era um estadista favorito da Santa Sé, que lhe atribuíra a rosa de ouro. Foi Lúcio II quem lhe respondeu, endereçando a carta Deuotionem tuam, em 1144, aceitando a tença, a continuidade na luta da “reconquista” e a vassalidade, mas tratando-o por dux portugalensis e a Portugal por terra. Aquela importante decisão tomada na conferência e a resposta papal que nada confirmava não eram o que Afonso Henriques pretendia17.

Algo muito importante que se deu, entretanto, e teve a ver com o facto de D. Afonso Henriques ter dilatado, consideravelmente, o território português, após a construção do castelo de Leiria, tomando a cidade, em 1147 e, depois de Santarém, Sintra e a cidade de Lisboa18, o que fez ecoar o feito e o seu nome por todos os Reinos europeus mais próximos e, naturalmente, em toda a Hispânia19. Expandiu-se depois para o sul do rio Tejo, onde conquistou Palmela, Alcácer, Évora, Beja, Serpa e Juromenha20.

Não é de estranhar, portanto, que o rei de Portugal, depois da morte de seu primo Afonso VII, verificada em 1157 – provavelmente em Viso del Marqués – e da divisão do Império em dois reinos, pelos filhos do Imperador, se sentisse com os mesmos direitos e deveres que os reis de Leão e Castela, seus primos em 2.º grau. Este ano de 1157 constituiu, como é fácil depreender-se, o segundo grande momento para a nossa independência e consequente satisfação dos desideratos de Afonso Henriques. O Príncipe, dado que seria necessária uma bula papal de reconhecimento, só veio a ter o documento pretendido, quando quadruplicou a contia a pagar à Santa Sé todos os anos e a começou a solver, enviando cerca de meio quilo de ouro. Veio a 23 de Maio de 1179, com Alexandre III (1159-1181), a ansiada bula Manifestis probatum21, altura em que o poder papal colidia com os excessos políticos do Imperador do Sacro Império Romano Germânico, Frederico I (1152-1190), Barba Ruiva, rei da “Itália”, duque da Suábia. Nascia, deste modo, mais um Reino independente na Europa, o de Portugal22, “cum integritate honoris regni et dignitate que ad reges pertinent”.

Outro factor não menos decisivo reside na primazia alcançada por Braga, com o seu arcebispo (D. Godinho), em relação a Toledo (D. Cerebruno). Era também a independência da Igreja Portucalense que continuava a estar em causa, não obstante os esforços dos pais de Afonso I de Portugal. Ainda a atenção dada, desde cedo, às ordens religiosas, como a de Cister, o seu melhor exemplo23. A fronteira metropolitana fora pois fixada de acordo com as fronteiras portuguesas já estabelecidas e ainda a definir doravante. Na prática, ao tempo do nosso primeiro rei, Braga mantinha a sua supremacia sobre todo o território português, mas a situação, nada pacífica, havia ainda que dar que falar.

Desde sempre, a par da política de conquistas e da acção diplomática patente nos três principais exemplos acima referidos, impunham-se medidas de povoamento. Este significava, resumidamente, a consolidação da Igreja, o desenvolvimento da economia, a defesa das fronteiras e a constituição de um exército que levasse a bom porto quanto ainda havia para tomar aos “infiéis” e ir defendendo as novas linhas de fronteira que se impunham definir e assegurar, com o avanço militar dos Portugueses e a sua cada vez mais alargada potestas territorial. A par da guerra, havia ainda o sistema das presúrias e dos fossados que eram constantes em território inimigo, à semelhança das contínuas algaras que eles nos faziam, irrompendo, de surpresa, pelo nosso rectângulo dentro.

Foram a Agricultura – pão, vinho e leguminosas –, a pastorícia, a pesca e a conservação do pescado, e a consequente troca de produtos as mais importantes manifestações económicas da época e que vieram a dar a epígrafe ao nosso Reino de uma Monarquia Agrária.

A região de maior densidade populacional era a que ficava entre os rios Minho e Douro: “a região de entre Lima e Ave tinha 576 freguesias na segunda metade do século XI. Na mesma altura, as terras de Guimarães e Montelongo tinham umas 90” 24. É, pois, difícil entender, como Guimarães, então vila, não tivera o seu bispo, dependendo de Braga, dado o desenvolvimento que, à época, já demonstrava e quanto a mesma representava para a consolidação do País, o Norte, sobretudo, e a “defesa” dos princípios da Igreja Nacional: da arquidiocese bracarense, em relação a Toledo e depois também a Santiago de Compostela, na Galiza.

As paróquias, de um modo geral, não seriam muito populosas, mas o seu avultado número é demonstrativo de certa dispersão populacional, que ainda hoje caracteriza essa zona.

Nas regiões costeiras “desde Viana a Vila do Conde e nas terras chãs e mais produtivas (…), as freguesias ficam próximas e distribuem-se quase uniformemente por toda a superfície (…) Nas regiões mais montanhosas, como em boa parte dos concelhos de Ponte da Barca, Póvoa de Lanhoso, Terra do Bouro, Vila Verde (…) as freguesias distribuem-se, de preferência, pelos vales dos rios e dos afluentes”25. A par de freguesias próximas, encontramos outras distantes, separadas entre si por largas zonas montanhosas quase totalmente ermas.

Conforme se vai andando em direcção a Leste, verifica-se, documentalmente, o predomínio do tipo de povoamento das áreas serranas, de povoações concentradas com um alfoz relativamente extenso de solos cultivados e aproveitados, em sistema de cultura extensiva, pastoreio e fruição pela colectividade dos vizinhos, embora consideravelmente distantes umas das outras.

Vemos, assim, uma zona densamente povoada que corresponde à Comarca do Minho e ao Vale do Douro, inclusive, a Beira Alta. A rarefacção populacional faz-se depois, um tanto na Beira Baixa e na Beira Litoral, de hoje, e pela Estremadura até ao Tejo. Atingia, por certo, a sua densidade mínima, na zona ocidental de Trás-os-Montes (serras do Marão e Barroso); no triângulo Vagos, Coimbra e Leiria; na zona do Vale do Vouga, nas serras da Estrela e Lousã e do rio Tejo para Sul26.

O povoamento teria de ser uma das principais preocupações dos monarcas até D. Afonso III, ou mesmo por diante, naturalmente, dada a necessidade de defesa das áreas que iam reconquistando e o indispensável incremento da economia. Foram estas e outras as questões que prosseguiram através dos séculos e que já vinham de trás: a defesa militar pelos milites e apeados, e o desenvolvimento económico, levados a cabo por chefias entregues por D. Sancho I aos ricos-homens, cuja primeira referência pode ver-se no foral de Lisboa de 1179: “Milite, ulixbone cui meus dives homo benefecerit de terra sua vel de habere suo per quod eum habeat, ego eum recipiam meo diviti homini in numero suorum militum”27. Este rico-homem faz a parte de governador ou tenente do respectivo “distrito”.

D. Sancho I (1154-1210) sucedeu ao pai em 1185 e foi conquistando e perdendo, o que aconteceu sempre, chegando a Silves e deitando mãos a uma consolidação da amizade e segurança com a Santa Sé, à imagem da política levada a bom termo por seu pai: a exclusiva vassalidade com Roma retirava os deveres de obediência, auxílio militar e conselho para com Leão e Castela.

Todavia, as etapas principais da luta entre “Estado” e Igreja, começaram, com uma forte oposição do monarca aos bispos do Porto e de Coimbra. Parte do Clero colocou-se ao lado do rei D. Sancho, tal como os burgueses do Porto, revoltando-se contra o bispo. Roma apressou-se a castigar o monarca, excomungando-o. Era uma das duas únicas “armas” que a Sé Apostólica detinha sobre os Príncipes: a excomunhão pessoal e o interdito territorial. O soberano português tratou de desculpar-se perante o Papa – Inocêncio III (1198-1216) –, ao sentir chegar a sua morte.

O seu sucessor, Afonso II (1210-1223), logo que subiu ao trono, encarregou-se menos das lutas contra o inimigo, mais da Administração um tanto esquecida outrora. Os primeiros anos do seu reinado foram marcados por violentos conflitos internos entre si e as suas irmãs Mafalda, Teresa e Sancha (a quem seu pai legara em testamento, sob o título de rainhas, a posse de alguns castelos no centro do País - Montemor-o-Velho, Seia e Alenquer -, com as respectivas vilas, termos, alcaidarias e rendimentos), numa tentativa de centralizar o poder régio, o que foi resolvido apenas com o confisco dos bens e exílio para Castela ou recolhimento a mosteiros por parte das infantas.

A ele ficaram a dever-se as primeiras leis gerais (para todo o Reino) e abstractas (para toda a população) que foram promulgadas na Cúria de Coimbra de 121128. Tomadas Santarém, Lisboa, Almada, Palmela, Alcácer, investindo-se para o Alentejo (em 1147 e depois), e já no Algarve, num fossado contra Silves (D. Sancho I), faltava a tomada definitiva de toda a área Sul, para além da qual, só existia o Norte de África, o que, realmente, ainda não sucederia no seu governo, dado que o soberano deitou mãos a novo estilo de governação, contrário à tendência belicista dos seus antecessores. Afonso II não contestou as suas fronteiras com Galiza e Leão, nem procurou a expansão para Sul (não obstante, no seu reinado, ter sido tomada aos Mouros a cidade de Alcácer do Sal, em 1217, mas por iniciativa de um grupo de nobres liderados pelo bispo de Lisboa), preferindo, outrossim, consolidar a estrutura económica e social do País.

O monarca organizou ainda, e sempre no mesmo sentido, um sistema de Inquéritos que pretendia levar a todo o Reino, alçadas ou tribunais móveis, a fim de inquirirem acerca da situação das propriedades reguengas e dos abusos senhoriais quer laicos quer eclesiásticos que punham em perigo as terras da Coroa e ainda os direitos de padroado.

A reorganização da vida em sociedade, com a implementação mais forte e sólida da hierarquia eclesiástica, vai dar azo aos concílios de Leão, Coiança e Gerona, no século XI, para reivindicar a favor dos bispos a jurisdição exercida pelos leigos sobre as igrejas e os religiosos, em geral. Contudo , essa reivindicação limitar-se-ia ao âmbito espiritual, deixando, no século seguinte, os proprietários das terras como padroeiros, patronos ou patrões das igrejas por eles mandadas erigir e dotar, não apenas os direitos patrimoniais que exerciam, à excepção do de dispor dos próprios templos, como a faculdade de apresentar ao bispo os nomes dos religiosos que pretendiam, a todo o custo, e, ainda, ver canonicamente instituídos, como párocos, abades ou curas de almas. O direito de “padroado” assim nasceu “transaccionavel como outro qualquer bem e adquirido por herança”29. Promulgar as primeiras leis de desamortização contra o clero que, pelo Direito Canónico, as tinha de “mão morta”, excluídas ao comércio, sem as devolver, em caso algum, à Coroa e as poder vender, a fim de tão extenso património, pelo menos, em pequena parte que fosse, entrasse no circuito comercial comum, tal como as dos senhores feudais: honras e coutos – e as alodiais.

Principiou um tanto a medo e não avançou mais muito, ficando determinado que “nenhuma cousa de Religiom nom compre nenhuma possisson”, porque, fundamenta a lei, poderia acontecer que os mosteiros e as Ordens viessem a comprar “tantas possissões que se tornaria em grande dano nosso e do reino”30. Impedindo, deste modo, que o clero adquirisse terras por compra, – parece-nos – pouco enfraquecia o poder da Igreja, dado que a maior parte do seu património tinha sido adquirido aquando da “Reconquista” (e continuaria a sê-lo) e por doações, as quais, inclusive, por motivos vários, eram feitas pela própria Coroa31. A recompensa por serviços prestados fora uma delas. Ainda a cura da alma, o dote pelo ingresso de um filho ou filha, ou até mais do que um ou uma, numa instituição…

Contudo, o novo rei conseguiu levantar todo o Clero contra si e os seus partidários que, uma vez mais, incluíam moradores e vizinhos das cidades, como Coimbra, por exemplo. As tentativas de centralização do poder régio iniciadas naquele ano de 1211, com as leis gerais que, pela primeira vez, eram publicadas e incorriam contra o património da nobreza e do clero, fizeram com que ele falecesse excomungado, no dito ano de 1223, por Honório III.

Tendo D. Sancho II (1207-1248), sucedido ao pai, logo nos primeiros meses do seu governo, ele assina acordo com as tias para resolver a antiga questão a que acima aludimos – adveniente da oposição do “centralizador” Afonso II ao testamento de Sancho I –, dando-lhes tudo aquilo que D. Afonso II não pretendera reconhecer-lhes, principalmente, no que se refere aos castelos, conseguindo também a inclusão de D. Branca, não contemplada no legado do pai, com bens imóveis, e agora transformada em herdeira de Teresa na parte de Montemor e Esgueira. Vão somar ainda à posse dos castelos às infantas Teresa e Sancha a muito elevada quantia de 4 000 morabitinos anuais, a solver sobre os direitos de Torres Vedras que entre si havia que repartir. Ficam, desta feita, com a totalidade das rendas de outro dos centros urbanos mais importantes da Comarca da Estremadura, reforçando a sua influência numa área onde a penetração senhorial era reduzida e que, tradicionalmente, fazia parte do domínio directo do rei32. Crê-se que tanto este acordo como o celebrado pouco tempo depois com o Arcebispo de Braga, D. Estêvão Soares, já tivessem sido planeados, nos últimos dias de D. Afonso II, mas que se haviam posto de parte, aguardando a sua morte. Sancho II ataca ainda os bispos de Braga, Coimbra e Porto, os mais poderosos do Reino, vindo a ser também, e muito a propósito, excomungado. O seu reinado caracterizou-se pela turbulência senhorial, na qual o monarca não conseguiu ter mão. A sua autoridade chegou a ser desrespeitada e o monarca revelou-se impotente para manter a ordem. As violências generalizaram-se por todo o Reino, sob a forma de vinganças, guerras privadas, terras usurpadas e que pertenciam à própria Coroa e disputas entre senhorios. Deixou de haver a necessária segurança nem quanto a pessoas, nem no que respeita os seus direitos. São múltiplos os exemplos arrolados por Herculano33.

Consta da bula Grandi non immerito, de 24 de Julho de 1245, que o rei oprimia e permitia a opressão das igrejas e mosteiros e, de um modo geral, “por sua frouxidão deixava perder castelos, vilas, propriedades e outros direitos reais e alienava-os frequente e ilicitamente por se deixar convencer por conselhos malignos; com pleno conhecimento tolerava que fossem mortos eclesiásticos e seculares, nobres ou não, sem respeito pelo sexo, pela idade ou pela condição religiosa; multiplicavam-se os roubos, os incestos e os raptos das mulheres, tanto religiosas como seculares, e as violências sobre os aldeões e os mercadores para lhes extorquir dinheiro”34.

Foi, então, chamado ao Reino, seu irmão, D. Afonso, conde de Bolonha, por todos estes motivos e a pedido de muitos dos concelhos do País, de Norte a Sul, barões – os mais importantes do Reino –, cavaleiros e eclesiásticos. O papa, tendo em conta que o País era feudatário da igreja romana (cum sic Romanae Ecclesiae censuale), nomeou o conde de Bolonha para implementar reformas e regular a Administração, dispensando os vassalos da fidelidade e obediência ao rei, e exortando-os a prestar conselho, auxílio e favor ao novo regente. Ainda casado, prestou juramento em Paris das suas novas funções perante um grupo de eclesiásticos e nobres, e ficou com a Regência até à morte do irmão, D. Sancho II, verificada em 1248.

Subindo ao trono, nesse ano, governou, como rei, vindo a falecer em  1279. Referimo-nos a D. Afonso III (1210-1279) que regeu o País, dando uma atenção muito especial à organização militar, económica, administrativa e centralizadora, tudo por junto.

Atingimos, definitivamente, o Algarve com a conquista de Faro, em 1249 e o novo rei promulgou mais leis que iam reduzindo o número das normas orais e dispersas pelos povoados, e substituindo-as por regras escritas apenas alteradas por revogação quando necessário. Prosseguiu com as Inquirições gerais, a promulgação de leis de desamortização que iam contra os desafios materiais da Igreja, no que respeita ao aumento desmesurado da sua propriedade e com ela o poder económico, as normas reguladoras do direito de jurisdição e as confirmações gerais.

O rei reivindica os seus direitos: “E vós deveis saber que é direito e uso e costume geral dos meus reinos que todas as doações que os reis fazem a alguém que sempre fica aguardado as apelações para os reis, e a Justiça maior e outras coisas muitas que ficam aos reis em sinal e em conhecimento de maior senhorio”35.

Regulou-se a moeda que devia vigorar no Reino, substituindo o sistema libra-soldo-dinheiro e apagando-se do mapa os últimos morabitinos, vindo D. Pedro I e D. Fernando I a mandar cunhar moedas de ouro e prata com o seu nome. Recordemos as dobras e os torneses, copiados dos modelos castelhanos e franceses, quer no nome quer no valor36. Uma gradual complexidade da vida e da política tornou necessária a criação de novos cargos de governo, a proliferação de concelhos constituídos através de cartas de foral ou confirmando a formação de anteriores com o mesmo tipo de diplomas37, a autorização dada ao estabelecimento de feiras que criavam diferentes indícios de uma economia de mercado38, aligeirar o pagamento de impostos e defender também os da Coroa, fazendo igualmente voltar a esta as terras que estivessem com irregularidades marcantes.

Ficou nos anais da História o estabelecimento das primeiras cortes, uma criação de um sistema parlamentar dividido em duas casas ou braços: a nobreza e alto clero convocados para o efeito, e o povo, por outro lado, representado por dois procuradores de concelhos que se apresentassem com as suas queixas, reivindicando soluções. De periodização irregular, passou a uma situação em que cada vez se tentavam reunir por períodos de tempo um tanto mais certos. Prosseguiram, como não podia deixar de ser, as reuniões ordinárias da cúria régia que tratavam de assuntos mais prementes e foi, por sorte, um deles, a desvalorização da moeda, com implicações no preço dos bens a comercializar que subia em flecha, que de lei de 1253 passou à reunião de Cortes, no ano seguinte, as primeiras e que tomaram lugar em Leiria.

Apesar de o monarca afirmar, sem cessar, que resolvia os assuntos “de motu próprio e seu poder absoluto” ou de sua “certa ciencia e poder absoluto”, fez-se, pela primeira vez, coadjuvar de um “Primeiro-ministro” que concorria com os poderes exagerados do chanceler. Falamos do Escrivão da Puridade, que passava a assistir o rei nos seus assuntos mais íntimos e em decisões imediatas, sendo, por regra, ouvido pelo soberano, sempre que necessário, pois vivia na sua puridade, na sua intimidade.

Desta feita, podemos referir sem problemas de interferir com sequências cronológicas, que, a par desse Primeiro-ministro que o rei de Portugal não mais deixou de escolher como seu auxiliar na governação, o chanceler tinha abaixo dele os livradores do desembargo, uma espécie de secretários de estado que informavam o seu superior hierárquico e o monarca de quanto se passava, cabendo-lhes igualmente a preparação dos assuntos a serem decididos. Seriam, de preferência, homens de leis cada vez mais controlada a sua escolha pelo monarca, dado que se pretendia que fossem especializados em direito civil e canónico e, muitas vezes, detendo graus universitários.

Na Corte, encontramos também sobrejuízes e, mais tarde, ouvidores. Surgiram, deste modo, três níveis de funcionários: aqueles aos quais cabia a jurisdição civil, os relacionados com o crime e os que tomavam a seu cargo todo e qualquer negócio que interferisse com o tesouro real e os bens do rei o que seria o mesmo que dizer com a Coroa e dentro desta com o fisco ou tesouro do Reino. Vieram estes últimos a ser tomados sob a designação de vedores da fazenda, autênticos ministros das finanças. Enfim, após toda esta massa que compunha uma das parcelas mais importantes do funcionariato administrativo, constituíram-se três tribunais: um fixo, em Lisboa (quando muito deslocando-se para Santarém em casos de peste): a casa do Cível; um segundo que transitava pelo Reino, acompanhando o rei nas suas deslocações: a casa da Suplicação; e um último que tratava apenas da propriedade régia.  Um oficial surgiu ainda, especialmente encarregado da polícia: o corregedor da corte. Fácil é de ver o germinar da Administração que seria, contudo, reorganizada, nos séculos últimos da monarquia, acompanhando a administração régia ao longo dos séculos.

Sublinhavam-se, desta feita, como vimos ao longo das páginas anteriores, que os poderes e deveres do rei, residiam sobretudo nos seguintes princípios: “Rex eris si recte faceris” e “constituit te Regem ut faceres judicium et justiciam”: este segundo, conforme a Bíblia39, a dar fé ao primeiro em curso. Quer dizer a função da justiça era essencial, cabendo-lhe a suprema administração da mesma, como um dos quatro direitos reais que fomos beber ao Fuero Viejo castelhano-leonês. Tenhamos em conta que a comunicação dos súbditos dos senhorios com o monarca estava mediatizada pelo senhor, o que tornava difícil a própria súplica ou queixa, a quaerimonia de que falam alguns forais40; a chefia militar, a Justiça, lato sensu, a protecção da Igreja, a regulação da economia.  

Realizando-se, no seu reinado, a conquista definitiva do Algarve, como referimos acima, as discórdias com Castela quanto ao domínio algarvio só findaram com o tratado de Badajoz em 1267, no qual ficou estipulado que o Guadiana, desde a confluência com o Caia até ao mar, constituiria a fronteira luso-castelhana. Casou em França, em Maio de 1239, com D. Matilde, condessa de Bolonha e viúva de Filipe, o Crespo, que tinha falecido em 1234, não tendo havido descendência, pelo que foi repudiada em 1253. Por um segundo casamento, feito em S. Estêvão , termo de Chaves, precisamente neste ano, com D. Beatriz (1242-1303), filha natural de Afonso X, rei de Castela (1221-1284), deixou sucessão. Entre os filhos, D. Dinis (1261-1325) que lhe sucedeu.  

 

1.º Rei de Portugal e do Algarve

1.º Rei de Portugal e do Algarve: 1279-1325

No final da sua vida, viu-se também envolvido em conflitos com a Igreja, tendo sido igualmente excomungado, em 1268, à semelhança dos reis que o precederam. O clero havia aprovado um libelo contendo quarenta e três queixas contra o monarca, entre as quais se achavam o impedimento aos bispos de cobrarem a dízima e a redízima, utilização dos fundos destinados à construção dos templos, obrigação dos clérigos a trabalhar nas obras das muralhas das vilas, prisão e execução de clérigos sem autorização dos bispos, ameaças de morte ao arcebispo e aos bispos e, ainda, a nomeação de judeus para cargos de grande importância.

O rei, protegido pelo seu povo, que havia sido privilegiado com a isenção de atalaias (imposto que obrigava às velas e roldas) e anúduvas (imposto do trabalho braçal gratuito, que obrigava as gentes a trabalharem na construção e reparação de castelos e palácios, muros, fossos e outras obras militares), recebeu apoio das cortes de Santarém, realizadas em Janeiro de 1274, onde foi nomeada uma comissão para fazer um inquérito às acusações que os bispos faziam ao rei. A comissão, composta, maioritariamente, por adeptos do monarca, absolveu-o. O Papa Nicolau III, porém, não aceitou a resolução tomada nas cortes de Santarém e mandou que se excomungasse o soberano e fosse lançado interdito sobre o Reino em 1277. À sua morte, em 1279, D. Afonso III jurou obediência à Igreja e a restituição de tudo o que lhe tinha tirado. Face a esta atitude do monarca, o abade de Alcobaça levantou-lhe a excomunhão e Afonso III veio a ser sepultado no Mosteiro de Alcobaça.

Com o advento de D. Dinis (1279-1325), e como, desde cedo, foi envolvido nos aspectos de governação pelo seu pai, o País encontrava-se em conflito com a Igreja Católica.

O novo rei procurou normalizar a situação assinando um tratado com o papa Nicolau III, onde jurou proteger os interesses de Roma em Portugal. Salvou a Ordem dos Templários no Reino, através da criação da Ordem de Cristo, que lhe herdou os bens, depois da sua extinção, e apoiou os cavaleiros da Ordem de Santiago, ao separarem-se do seu mestre castelhano.

 

        

D. Dinis de Portugal

D. Dinis de Portugal

Nada seria posto de lado. D. Dinis foi essencialmente um rei administrador e não guerreiro: envolvendo-se, por acidente, em guerra com Castela em 1295, desistiu dela em troca das vilas de Serpa e Moura. Pelo Tratado de Alcanises, em 1297, firmou a Paz com Castela, definindo-se, nesse convénio, as fronteiras actuais entre os dois países ibéricos. Por este tratado previa-se também uma paz de 40 anos, amizade e defesa mútuas. Foi a D. Dinis que seu avô, o rei de Castela, doou as alcaidarias dos castelos e o território algarvios.

 

A sua prioridade governativa foi essencialmente a organização do Reino: continuou a vertente legisladora dos monarcas anteriores, desde D. Afonso II e de seu pai D. Afonso III, com um avultado número de leis gerais, compilações de leis e do direito consuetudinário municipal, alteradas e reformuladas pela Coroa, ou repostas a escrito.

 

Com efeito, a incidência de questões de âmbito processual com igual peso ao carácter de direito positivo das suas normas denuncia a crescente preocupação do soberano em enquadrar o direito consuetudinário no âmbito da Coroa e em efectivar um reforço de peso no seu poder no terreno. As determinações sobre a actuação de alvazis (oficiais concelhios), juízes, procuratores (pessoeiros ou persoeiros) e vozeiros (advocati) são, a nosso ver, as que melhor demonstram e definem um grande avanço no sistema administrativo judicial, já que um poder meramente nominal sobre todos os habitantes do Reino, como era típico na Idade Média, não era consentâneo com o indispensável esforço em esmiuçar os trâmites jurídicos, ou em moralizar o exercício da justiça. A criação de corregedores denuncia também, muito claramente, o início do processo de territorialização do direito, o mesmo é dizer, da jurisdição da Coroa, extravasando os domínios régios, a par da crescente importância da cidade de Lisboa, agora a “capital” do Reino.

 

Estava instituído o sistema das coimas (penas pecuniárias por prática de crimes, as quais não substituíam a sanção física pronunciada pelo judex), os direitos reais e com eles a suprema administração da justiça, da qual fazia parte um sistema de base altamente influenciado pelo direito castelhano41, o sistema da lei oral passar por uma primeira fase de recolha e sistematização e daqui, numa segunda à lei escrita e, necessariamente, numa terceira fase ao Código selectivo que tanto interessava; e o sistema da substituição da pena de morte e da simples prisão em cadeia, pelo degredo para terras de fronteira e outras que teriam de ser activamente exploradas, com vista a torná-las habitadas (povoadas) e produtivas (rentáveis). As “malfeitorias” que perturbavam e punham, pois, em causa, a paz interna do Reino constituíam um desacato à autoridade, Também os delitos contra a moral sexual e familiar, o adultério, por exemplo, o rapto, o lenocínio e a barregania e a homossexualidade são castigados com degredo que, frequentemente, passa de temporário a perpétuo, constituindo-se, a par, coutos de homiziados42. Se numa primeira fase, poderemos pensar em terras de fronteira continental, após 1415, é de ter em conta o importante papel de Ceuta neste caso vertente, como teve Timor, no final da Monarquia e na transição compulsiva para o sistema republicano.

 

Com efeito, o governo – no seu todo – foi levado a termo pelo soberano, acentuando a predilecção por esta cidade, como local de permanência da corte régia. Não existe uma capital, propriamente dita, mas a localização de Lisboa, o seu desenvolvimento urbano, económico e mercantil vão fazendo dela o local mais viável para se afirmar como centro administrativo por excelência, como já o tinha sido ao tempo de seu pai.

A articulação entre o Norte e o Sul do Reino fizeram da cidade centro giratório para tornar Portugal viável43. Entre o Norte, onde a malha senhorial é mais densa e apertada, e o Sul, onde o espaço vasto conquistado aos “infiéis”, implanta sobretudo os domínios régios e as ordens religiosas-militares, assim como vastos espaços de res nullius ou terras de ninguém, e torna Portugal um Reino onde duas realidades diferentes se complementam.

Preocupado com as infra-estruturas do País, D. Dinis ordenou a exploração de minas de cobre, prata, estanho e ferro. Fomentou as trocas com outros Reinos, assinou o primeiro tratado comercial com o rei de Inglaterra em 1308 e criou o almirantado, atribuído como privilégio ao genovês Manuel Pessanha, e fundando as bases para uma verdadeira marinha portuguesa ao serviço da Coroa.

 

A cultura foi um dos seus interesses pessoais. D. Dinis não só apreciava Literatura, como foi ele próprio um poeta notabilíssimo e um dos maiores e mais fecundos trovadores do seu tempo. Aos nossos dias chegaram 137 cantigas da sua autoria, distribuídas por todos os géneros (73 cantigas de amor, 51 cantigas de Amigo e 10 cantigas de escárnio e de maldizer), bem como a música original de 7 dessas cantigas (descobertas casualmente em 1990 pelo Prof. Harvey L. Sharrer).

 

Os derradeiros anos do seu reinado foram marcados por conflitos internos. O herdeiro, futuro D. Afonso IV, receoso de que o favorecimento de D. Dinis ao seu filho bastardo, D. Afonso Sanches o espoliasse do trono, exigiu o poder e combateu o pai. Nesta luta teve intervenção apaziguadora a Rainha Santa Isabel que, em Alvalade, se interpôs entre as hostes inimigas já postas em ordem de batalha.

 

O rei daria grande atenção à marinha, como salientámos acima e não menos à agricultura, protegida, segundo consta, pelo plantio de uma cercania de pinheiros que protegia os campos cultivados dos ventos e das areias que da Costa eram levados a longas distâncias. O Povo, por isso, talvez, chamou-o de O Lavrador.

 

Visou ainda a economia de mercado, com um forte impulso ao comércio a longa distância e de feiras ditas semi-franqueadas em que os impostos das entradas e saídas – portagens e costumagens – eram aligeirados e reduzidos. O sistema das Inquirições e Confirmações prosseguiu. Das primeiras, ainda as sabemos no governo de D. Duarte (1433/1434), tendo D. Dinis considerado como “velhas” todas as honras criadas de modo abusivo, como por exemplo, pelo amádigo e pela deslocação de marcos que aumentavam a terra originariamente cedida em área44; e, de “novas” as cedidas do seu advento em diante. Confirmações houve-as sempre. Foi um governo que ficou na História, pela perseverança do monarca, pelo papel conciliador da rainha de Portugal, sua mulher, D. Isabel, pelas lutas civis a que deu origem D. Afonso Sanches, senhor de Albuquerque, que colocou o herdeiro do trono, o futuro D. Afonso IV contra o rei, a fim de lhe tomar o poder, e pela existência de um filho bastardo, o primeiro grande intelectual da época, D. Pedro Afonso, conde de Barcelos, que se retirou para a Beira, para Lalim, onde, como trovador, deu origem a belíssimos poemas, a quem se atribui a feitura da Crónica Geral de Espanha e ainda do Nobiliário que tem acrescentamentos posteriores, mas onde não há dúvidas de que importantes passagens tivessem sido escritas ou ditadas por si mesmo.

 

O estabelecimento do primeiro Estudo Geral em Lisboa45 foi o ex-líbris dionisiano, o rei trovador, como também era conhecido, instituto de alta cultura que passou para Coimbra, transitando entre a capital e a cidade do saber, só se fixando aqui, de vez, ao tempo de D. João III, em 1537. Os privilégios incomuns asseguravam-lhe larga autonomia, cerceando-a à fiscalização e controle geralmente aplicáveis à restante população de Lisboa.  Na capital, este facto acumulou tensões, sentindo-se os comerciantes prejudicados com desacatos provocados por estudantes. Com a fundação confirmada em 1290, a 9 de Agosto, por Nicolau IV, através da bula De statu regni portugallie, logo em 1308, é decidida a sua transferência para Coimbra, cidade já com tradição escolar e com ambiente mais tranquilo, preferível para o trabalho intelectual. O Estudo Geral ficaria instalado na parte alta da cidade, junto da alcáçova, mais precisamente em casas sobre as quais seria posteriormente construído o Colégio de S. Paulo46.

 

João das Regras veio a ser o primeiro nomeado para o cargo de Protector do Estudo, função posteriormente desempenhada pelo Infante D. Henrique. Para além de financiar o Ensino, incluindo o de Teologia, foram, nesta fase, criadas novas áreas de estudo, transformando-se a universidade numa ferramenta importante, no desenrolar da crise dinástica que levou D. João I ao trono e no processo da expansão ultramarina. O País dotava-se com o ensino que lhe promoveria a capacidade de responder, a prazo, aos desafios que os novos empreendimentos exigiam. D. Pedro, irmão do Infante e regente do País (1438-1448), assumiria mesmo o desejo de criar uma segunda universidade em Coimbra, aproveitando ali as experiências anteriores. Para esta aspiração em ver Portugal duplicar a sua capacidade em termos de ensino superior também contribuíram os interesses dos priores da região conimbricense bem como seus estudantes, que, desta feita, encontrariam alternativa à já congestionada Lisboa, cidade onde os efeitos da peste ainda se faziam sentir. No entanto, este projecto para um segundo Estudo Geral acabaria por não ter seguimento, mesmo que Afonso V ponderasse ainda tal hipótese.

 

Não obstante as bolsas patrocinadas pelo monarca e o processo de centralização régia enveredado depois por D. João II e reforçado por D. Manuel I, este último, terminando mesmo com a eleição dos reitores e com as extravagâncias nas roupagens dos alunos, os problemas em Lisboa avolumar-se-iam, estagnando-se o seu ensino numa cidade mais interessada na já aberta rota das Índias do que nas problemáticas do espírito. Até finais do século XIX (altura da criação do Curso Superior de Letras por D. Pedro V), Lisboa não tornou a ter Universidade.

 

Também as reformas introduzidas na Justiça foram de grande impacte no futuro do País, acompanhando sempre o Processo Civil e Criminal nas Ordenações do Reino, passaram as Filipinas e incorporaram-se ainda nos novos códigos oitocentistas. A adopção de novas formas de introduzir perante os juízes as questões que estes devessem instruir e julgar foi levada a termo de harmonia com o Direito comum, romano-canónico, transcendente para a época, e afastaram, progressivamente, os antigos costumes. É do seu governo a reforma de 1314. D. Afonso IV prosseguiu a tarefa rodeando-se de jurisconsultos e reiniciou-as em 1330, fazendo várias ordenações de justiça: 1330, 1352, 1355. Prosseguiu D. Fernando I, em 1379, com uma nova tentativa de abreviar a duração dos pleitos e de conseguir a sua decisão de acordo com a verdade material. Esta questão do tempo está hoje a ser de novo encarada, dado o número de processos e a fraca quantidade de especialistas que possam encarregar-se dos maços de páginas que já atrapalhavam o sistema nos finais do século XIV. Nem hoje nem ontem ficou o problema solucionado.

 

Opondo-se a todas as medidas de incremento económico e cultura que anotámos relativamente ao governo de D. Dinis, inicia-se em 1325 o reinado de D. Afonso IV, o qual teve de suportar um ano de peste, a Peste Negra, e o resto do seu reinado com as consequências que advieram de uma mortandade em altíssima percentagem da população activa e ainda o espectro que pairou sobre as crianças que tão cedo não podiam esquecer aqueles quadros goiescos de meter pavor.

 

As medidas foram em número desmesurado, tendentes a invectivas a favor do fomento da agricultura, do artesanato e da criação de gado lanígero e vacum, começando, de imediato, por uma circular de 1348 que veio a verificar-se incluída na Lei das “Sesmarias” de D. Fernando I – promulgada a 28 de Maio de 1375, criada para combater a crise agrícola e económica que atingia o País e a Europa, e que a peste negra agravara. “Sesmaria” vem de “sesmo”, que deve, por sua vez, ter provindo de seximus, o sexto, e advinha da divisão das terras a repartir em seis fracções, ficando cada uma delas a cargo do chamado “sesmeiro”, conforme os dias da semana, com exclusão dos domingos. Haveria, pois, seis “sesmeiros” de início. Após a redução da quantidade das terras a repartir, deixou de praticar-se esse uso e passou a haver apenas, no concelho, um “sesmeiro” ou dois (eram suficientes, por certo),  nomeados e/ou confirmados pelo soberano. Quando o vizinho a quem era atribuído, a título gratuito, o seu lote não o aproveitasse convenientemente, perdia-o e a terra ia reverter outra vez para o concelho, o qual a podia entregar a outrem. Isto é, a terra era concedida sob condição de aproveitamento. E assim foi, então, levada a efeito a reforma agrária dos finais do século XIV em Portugal: a terra a quem a trabalhasse47.

A grande novidade desta lei foi a instituição do princípio de expropriação da terra caso a mesma não fosse aproveitada. Procurava-se repor em cultivo mini ou latifúndios que já o haviam tido e que os factos mencionados tinham transformado em baldios. A lei das Sesmarias foi como que uma reforma agrária. No entanto, não se sabe com clareza até que ponto foi cumprida e em que medida contribuiu para uma reestruturação da propriedade e para a resolução da crise, dado que as Ordenações Afonsinas (1448) continham ainda medidas tomadas por D. João I e D. Duarte, patentes nas com disposições que levavam os trabalhadores às suas terras ou os seus herdeiros e à proibição da venda de gado que era útil ao trabalho. O País regrediu 180.º, e voltou-se a uma monarquia agrária, não existindo medidas capazes promulgadas por D. Pedro I nem as de D. Fernando dariam mostras de aplicabilidade, mesmo as que promoviam a navegação, legislando acerca de seguros e tonelagens dos barcos



Notas

* Professor de História da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa; Académico Correspondente da Academia Portuguesa da História; Membro de L’Institut des Hautes Études Médiévales, Paris ; Membro da Asociación Hispánica de Literatura Medieval.

1. Ver Claudio Sánchez-Albornoz, La Espeña Musulmana , tomo II, Madrid, 1978.

2. Cláudio Sánchez-Albornoz, Estudios sobre Galicia en la Temprana Edad Media. La Coruña , Fundación Barrié, 1981: Ramón Villares, História da Galiza, Lisboa, Livros Horizonte, 1991.

3. Ver acerca do repovoamento e organização dos espaços paulatinamente retomados aos Sarracenos Salvador Moxó, Repoblación y Sociedad en la España Cristiana Medieval, Madrid,  Ed. Rialp, 1979; José Angel Carcía de Cortázar, “Del Cantábrico al Duero”, Organización social del espacio en la España medieval. La corona de Castilla en los siglos VIII a XV, Barcelona, Ed. Ariel, 1985.

4. Cf. A. de Almeida Fernandes, Território e Política Portugalenses (sécs. VI-XII), sep, de O Tripeiro, IV série, Anos X-XII, 1970-1972; Do Porto veio Portugal, história, Porto, 1065; Notas às Origens Portugalenses, história, Porto, 1968; Portugal Primitivo Medievo, Arouca, Câmara Municipal de Tarouca, 2001. José Mattoso, História de Portugal, Vol. I. Antes de Portugal, Lisboa, Círculo de Leitores, 1992; Bernardo Vasconcelos e Sousa, “Do Condado Portucalense à Monarquia Portuguesa (Séculos XI-XII), in História de Portugal, dirig. por Rui Ramos, 2.ª ed., Lisboa, A Esfera dos Livros, 2010, pp. 17-196.

5. Angus Mackay, La España de la Edad Media desde la frontera hasta el imperio (1000-1500), 3. ª ed., Madrid, Ed, Cátedra, 1985; Maria Ângela Beirante, ‘A “Reconquista” Cristã’, in Portugal. Das Invasões Germânicas à “Reconquista”, coordenação de A. H. de Oliveira Marques, in Nova História de Portugal, direcção de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, Vol. II, Lisboa, Ed. Presença, 1993, pp. 251 e ss..

6. Maria Ângela Beirante, ibidem.

7. O presente quadro encontra-se correcto, em alguns pontos distinto de outro equivalente, com erros tipográficos, apresentado na p. 82, do n/ artigo “Viseu na Alta Idade Média e na Dinastia da Borgonha (722-1383), in Viseu – Cidade de Afonso Henriques, Viseu, Avis – Associação para o debate de ideias e concretizações culturais de Viseu, 2009.

8. Ver A. de Almeida Fernandes, Viseu, Agosto de 1109. Nasce D. Afonso Henriques, 3.ª ed., prefácio de Maria Alegria Fernandes Marques e fixação de texto de João Silva de Sousa, 3.ª ed., SACRE, Fundação Mariana Seixas, 2007.

9. Pedro Calafate, História do Pensamento Filosófico Português. Vol. I. Idade Média; Avelino de Jesus da Costa, S. Martinho de Dume. (XIV Centenário da sua chegada à Península), Braga, Ed. Cenáculo, 1950; Lúcio Craveiro da Silva, Estudos de cultura portuguesa, Braga, Centro de Estudos Humanísticos da Universidade do Minho, 2002; Luís Ribeiro Soares, A linhagem cultural de S. Martinho de Dume, Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1997; A. Miranda Barbosa, O senequismo moral de S. Martinho Dumiense, Braga, 1954.

10. A. de Almeida Fernandes, Viseu. Agosto de 1109. Nasce D. Afonso Henriques, 3.ª ed., Viseu, Fundação Mariana Seixas, 2007; “Viseu – Pátria de D. Afonso Henriques”, in Afonso Henriques (1109/1185) “O Pai da Pátria”, Viseu, Avis, Colecção Visienses de boa Memória, dir. por Júlio Cruz, Viseu, 2009, pp. 9-30; João Silva de Sousa, “D. Afonso Henriques (Infante, Príncipe, dux e Rei. 1109-1185)”, ibid., pp. 33 e ss.

11. Marsilio Cassotti, D. Teresa. A Primeira Rainha de Portugal, Lisboa, A Esfera dos Livros, Agosto de 2008. D. Francisco de S. Luíz. Memórias chronologicas e historicas do governo da Rainha D. Tereza. Lisboa, Academia Real das Sciencias, 1841.

12. Ver Portugaliae Monumenta Historica, Scriptores, Vol. I, Lisboa, ed. da Academia Real das Ciências de Lisboa, 1856 (reimpressão de Kraus Reprint, Nendeln, 1967.

13. Afonso Henriques ocupou Tui, mais tarde, em 1159, Perderia, pouco depois, a cidade, a favor de Fernando II de Aragão, voltando a dominá-la entre 1162-1169. Ver Amélia Aguiar Andrade, Vilas, Poder Régio e Fronteira: O Exemplo do Entre-Lima e Minho Medieval, dissertação de doutoramento apresentada à FCSH da UNL, Lisboa, 1994, p. 171. O facto parece traduzir, segundo a autora “o significado que atribuía à cidade episcopal tudense, como ponto-chave de toda a sua estratégia na fronteira galega”.

14. Para melhor conhecermos a relação existente entre o rei e as cidades, vejam-se o Chronicon Conimbricense, a Chronica Gothorum, a Memória Anónima da Torre do Tombo, as Crónicas Breves de Santa Cruz de Coimbra, a Vida de D. Telo, a Vida de S. Teotónio, o De Expugnatione Scalabis, a Carta do Cruzado Inglês, a Carta de Duodechino, o Relatório anónimo da Conquista de Lisboa, a Carta de Arnulfo e a Crónica da Fundação do Mosteiro de S. Vicente, publicados parcialmente por Alfredo Pimenta em Fontes Medievais da História de Portugal, Vol. I – Anais e Crónicas, Lisboa, Livraria Sá da Costa, 1948. Alguns textos não fragmentados, podem ler-se nos Portugaliae Monumenta Histórica, I. Scriptores. Lisboa, Academia Real das Ciências de Lisboa, 1856 ss. (reimpressão de Krauss Reprint, Nendeln, 1967).

15. Com base no cronista árabe Ibn Sahibi-s-salat, Herculano diz-nos que a maior parte das conquistas de D. Afonso Henriques foram levados a cabo através de cometimentos nocturnos. História de Portugal, tomo III, 9.ª ed., Lisboa, Livraria Bertrand, s/d, p. 58.

16. Cfr. João Silva de Sousa, Conferências Descentralizadas, in Comemorações dos 900 Anos do Nascimento de D. Afonso Henriques em Viseu, Viseu, Câmara Municipal de Viseu, 2009.

17. Ver Miguel de Oliveira, “Factores Religiosos da Independência de Portugal”, in Congresso do Mundo Português, II Vol., Lisboa, 1940, pp. 73-97.

18. Ver Anais de D. Afonso Henriques – (Annales D. Alfonsi Portugalensium Regis, ed. crítica Mónica Blöcker-Walter, Alfons I von Portugal. Studien zu Geschishte und Sage des begründers der portugiesischen Unabhägigkeiten, Zürich, Fretz und Wasmuth Verrlag, 1966; Chronica da Tomada desta Cidade de Lisboa aos mouros e da fundação deste Moesteiro de Sam Vicente, Estudo e Edição de Joaquim Mendes, Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 1991; The conquest of Lisbon [De Expugnatione Lyxbonensi], edição, tradução e notas de Charles Wendell David, New York, Columbia University Press, 2000; A Conquista de Lisboa aos Mouros. Relato de um Cruzado, ed., trad. e notas de Aires do Nascimento e introdução de Maria João Violante Branco, Lisboa, Veja, 2001.

19. Vide Georges Jehel e Philippe Racinet, La ville Médiévale. De l’Occident chrétien à l’Orient musulman (V-XV siècle), Paris, a. Colin, 1996.

20. É do conhecimento geral que, de Alcácer para Sul, as conquistas não tivessem ficado consolidadas, sendo o domínio dos territórios alentejanos e a posse do Algarve duramente disputados nos governos seguintes. Elvas e Juromenha só, em 1229, foram definitivamente ocupadas pelos Cristãos.

21. Bullarium Collectio, quibus serenissimis Lusitaniae et Algarbiorum Regibus jus Patronatus a Summis Pontificibus liberaliter conceditur, Lisboa, 1958; Monumenta Henricina, Vol. I, Coimbra, 1960.

22. Cf. João Silva de Sousa, ibidem.

23. Ver As Beiras e a presença de Cister. Espaço, Património edificado, Espiritualidade. Actas do !.º Encontro Cultural S. Cristóvão de Lafões, coordenação de Maria Alegria Fernandes Marques, S. Cristóvão de Lafões, 2006. Tem sido, precisamente Maria Alegria Fernandes Marques quem mais atenção tem dado a Cister e às Beiras, num importante Capítulo de Estudos Medievais acerca desta vertente.

24. Avelino de Jesus da Costa, O Bispo D. Pedro e a Organização da Diocese de Braga, Vol. I, Coimbra, Faculdade de Letras, 1959, p. 207.

25. Id., ibidem, Vol. I, p. 253.

26. A. H. de Oliveira Marques, “A população portuguesa nos fins do século XIII”, in Revista da Faculdade de Letras de Lisboa, III série, n.º 2, 1958 e Ensaios de História Medieval Portuguesa, Lisboa, 1955. Ver Marcello Caetano, História do Direito português. Séculos XII-XV). Subsídios para a História das Fontes do Direito em Portugal no século XVI, Lisboa, Verbo, 2000, pp. 177-178.

27. Traduza-se por “O cavaleiro de Lisboa ao qual o meu rico-homem beneficiar com terra sua ou com bens seus para o contar entre a sua gente será por mim aceite no número dos cavaleiros do meu rico-homem”. Assim, mutatis mutandis, se constituíam também as assuadas e delas os que ficava a depender do rei ou do senhor laico ou eclesiástico.

28. In Livro das Leis e Posturas, ed. por Nuno Espinosa Gomes da Silva, e Maria Teresa Campos Rodrigues, Lisboa, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 1975.

29. Cândido A. Dias dos Santos, O Censual do Cabido da Mitra do Porto, 1973, p. 102.

30. Livro das Leis e Posturas, p. 13.

31. Portugaliae Monumenta Historica, cit., Inquisitiones.

32. Hermenegildo Fernandes, D. Sancho II: Tragédia, Círculo de Leitores, 2006, pp. 27-79.

33. Ver nota XVII, do Vol. IV da  História de Portugal de Joaquim Veríssimo Serrão..

34. Ver a bula em Lopes Praça , Colecção de Leis e Subsídios…, Vol. I, p. 21. Além da bula enviada a D. Sancho II, há, pelo menos, mais duas, iniciadas pelas mesmas palavras, acerca da deposição, que na Summa do Bullario Portuguez, de Santos Abranches, têm os n.os 124 (endereçada ao Infante D. Pedro) e 1917 (dirigida às ordens religiosas e militares).

35. Era esta a doutrina do Direito Imperial.

36. Ver Maria José Pimenta Ferro Tavares, Estudos de História Monetária Portuguesa (1383-1385), Lisboa, 1974; Subsídios para o Estudo da História Monetária do século XV (1448-1495), sep. da NUMMUS, 2.ª série, Vols. IV, V e VI, Porto, Sociedade Portuguesa de Numismática, 1981-1983.

37. António Matos Reis, Origens dos Municípios Portugueses, Lisboa, Livros Horizonte, 1990; História dos Municípios [1050-1383], Lisboa, Livros Horizonte, 2007 (1.º Prémio de História Medieval A. de Almeida Fernandes).

38. Virgínia Rau, Feiras Medievais Portuguesas. Subsídios para o seu Estudo, Lisboa, Ed. Presença, 1982.

39. Livro III dos Reis, 10, 9.

40. Ver Luís Garcia de Valdeavellano, “La vassalité et les immunités en Espagne », no Vol. da Société Jean Bodin, Les liens de vassalité et les immunités, 2.ª ed., 1958.

41. J. Lalinde Abadia, Iniciación Histórica al Derecho Español, Barcelona, Ariel, 1978, p. 655. E. Dumont, Théorie des Peines et des récompenses, ouvrage extrait des manuscrits de M. Jérémie Bentham, jurisconsulte anglais, 3.ª ed.., t. I, Paris, Bossange Frères, 1825, livro 1, cap. II. Francisco Freire de Mello, Discurso sobre Delictos e Penas. Qual foi a sua proporção nas diferentes épocas da nossa Jurisprudência, principalmente nos três séculos primeiros, 2.ª ed., Lisboa, Typographia de Simão Thaddeo Ferreira, 1822, cap. VII. Marcello Caetano, História do Direito Português, I, Lisboa, Verbo, 1981.

42. Acerca do conceito de malfeitorias, veja-se Hilda Grassotti, “Textos para um futuro estudo de la malfetria”, in Miscelânea de Estúdios sobre Instituciones Castellano-Leonesas, Bilbao, Ed. Najera, 1978, pp. 107-117. Como no-lo chama a atenção Maria Ângela Beirante, a autora nota que, embora o termo malfeitorias possa aplicar-se a vários actos delituosos, como forças, roubos entre outros, tem também um significado político por corresponder à destruição da paz. Maria Ângela Beirante, Obr. Cit., p. 103. Veja-se ainda Humberto Baquero Moreno, Elementos para o Estudo dos Coutos de Homiziados instituídos pela Coroa, sep.ª de Portugaliae Historica, Lisboa, 1974. Veja-se ainda J. Gauthier-Dalché, “Communes, libertés, franchises urbaines: le problème des origines », in Les Origines des Libertés Urbaines, dir, por B. Guillemain, Rouen, Publications de l’Université de Rouen, 1990, pp. 67-95.

43. Ver A. H. de Oliveira Marques, Novos Ensaios de História Medieval Portuguesa, Lisboa, Editorial Presença, 1988. Pierre Lavedan, Histoire de l’Urbanisme. Antiquité-Moyen Age, Paris, 1926; Jacques Heers, La Ville au  moyen Age en Occident, Paris, A. Fayard, 1990 ; Maria Ângela Beirante, O ar da cidade. Ensaios de História Medieval e Moderna, Lisboa, Edições Colibri, 2008. Carlos Guardado da Silva, Lisboa Medieval. A organização e a estruturação do espaço urbano, Lisboa, Edições Colibri, 2008.

44. A protecção legal dada aos limites das propriedades rústicas vem já expressa no Código Visigótico, Livro X, tít. III – “De los términos et de los fitos”, in Fuero Jusgo ó Libro de los Jueces, Madrid, La Real Academia Española, 1815.

45. O Dr. António Garcia Ribeiro de Vasconcelos encontrou, em 1912, na posse de um particular um documento, que depois se veio a apurar ter sido subtraído do Arquivo da Sé de Viseu, e que publicou como sendo o acto de criação régia da Universidade de Lisboa. Cfr. Revista da Universidad4e de Coimbra, Vol. I, p. 363 e Vol. II, p. 254, e posteriormente em Escritos Vários , Vol. I, p. 11.

46. Ver Jacques Le Goff, Para um Novo Conceito de Idade Média – Tempo, Trabalho e Cultura no Ocidente, trad. port., Lisboa, Estampa, 1980, p. 379.

47. Ordenações Afonsinas, livro IV, tít. 81.

 

 

 

De 910 a 1910

 

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