Ivan IV, o Terrível

 

O primeiro czar da Rússia

 

Nasceu em 25 de Agosto de 1530, em Kolomenskoye, perto de Moscovo [Rússia], morreu em 18 de Março de 1584, em Moscovo.

Grande príncipe de Moscovo (1533-84) foi o primeiro monarca a ser proclamado czar da Rússia, em 1547. O seu reinado viu a criação de um Estado russo centralizado e o início de um império.

Filho do grão-duque Vassili III de Moscovo e da sua segunda mulher, Yelena Glinskaya,  foi o penúltimo representante da dinastia Rurik. Em 4 de Dezembro de 1533, imediatamente após a morte de seu pai, tendo três anos de idade, Ivan foi proclamado grão-príncipe de Moscovo. A mãe regeu a Rússia em nome do filho até à sua morte em 1538, possivelmente por envenenamento. A morte dos pais serviu para reavivar as lutas das várias facções de nobres pelo controlo da pessoa do príncipe e do poder. Os anos 1538-47 foram, por isso, um período de conflitos sanguinários entre os vários clãs da casta guerreira dos boiardos. As lutas permanentes para o controlo do governo em detrimento do reino causou uma profunda impressão no grão-duque, craindo-lhe uma aversão aos boiardos que se manteve ao longo de toda a vida.

Em 16 de Janeiro de 1547, Ivan foi coroado czar e grão-príncipe de toda a Rússia. O título czar foi obtido a partir do título latim caesar (César) e foi traduzido pelos contemporâneos de Ivan como "imperador". Em Fevereiro de 1547 Ivan casou-se com Anastasiya Romanovna, tia-avó do futuro primeiro czar da dinastia Romanov.

Ivan foi grandemente influenciado, pelo menos desde 1542, pelas ideias do bispo metropolita de Moscovo, Makari, que incentivou o jovem czar a estabelecer, como desejava, um estado cristão baseado nos princípios da justiça. O governo de Ivan iniciou um vasto programa de reformas e de reorganização da administração central e local. Os concílios da Igreja convocados em 1547 e 1549 reforçaram e sistematizaram a organização da Igreja, reforçando a ortodoxia e canonizando um grande número de santos russos. Em 1549 a primeira zemski sobor reuniu-se para exercer a sua capacidade consultiva – esta assembleia nacional era composta de boiardos, clérigos e alguns representantes eleitos da nova nobreza de serviço. Em 1550 um novo e mais detalhado código jurídico foi elaborado substituindo um datado de 1497. A administração central da Rússia também foi reorganizada em departamentos, cada um responsável por uma função específica do Estado. As condições de serviço militar foram melhoradas, as forças armadas foram reorganizados e o sistema de comando alterado de modo que os comandantes passassem a ser nomeados com base no mérito e não simplesmente em virtude de sua origem nobre. O governo também permitiu que os  administradores distritais fossem eleitos pela aristocracia local, criando assim uma ampla zona de auto-governo.
Um dos objectivos das reformas era o de limitar os poderes da aristocracia hereditária de príncipes e boiardos (que continuaram a manter as suas propriedades hereditárias) e promover os interesses da aristocracia de serviço, que recebeu as suas terras como compensação pelo serviço governamental e que passou a estar, assim, dependente do czar. Todas as reformas ocorreram sob a égide do chamado "Conselho Escolhido", um órgão consultivo informal em que as principais figuras eram os favoritos do czar Aleksey Adashev e o padre Silvestre. A influência do conselho foi diminuindo até que desapareceu completamente no início de 1560, após a morte da primeira mulher de Ivan e de Makari, altura em que as ideias de Ivan assim como o núcleo dos seus principais seguidores tinham mudado. A primeira mulher de Ivan, Anastasiya, morreu em 1560, e apenas dois herdeiros do sexo masculino, Ivan (n. 1554) e Fyodor (n. 1557), sobreviveram aos enormes rigores da infância naquela época.
A Rússia esteve em guerra durante a maior parte do reinado de Ivan. Os governantes moscovitas temiam desde sempre as incursões dos tártaros e, entre 1547 e 1550 foram realizadas várias campanhas sem sucesso contra o hostil Canato de Kazan, no rio Volga. Em 1552, depois de preparativos prolongados, o czar avançou contra Kazan, tendo o exército russo conseguido finalmente tomar a cidade de assalto. Em 1556 o Canato de Astracã, localizado na foz do rio Volga, foi anexado sem luta. A partir daquele momento, o Volga tornou-se um rio russo, e a rota comercial para o mar Cáspio passou a ser segura.

Com ambas as margens do rio Volga garantidas, Ivan preparou-se para uma campanha que desse à Rússia uma saída para o mar, a tradicional preocupação da Rússia litoral. Ivan percebeu que o comércio com a Europa estava totalmente dependente do livre acesso ao mar Báltico e decidiu voltar sua atenção para  oeste. Em 1558 decidiu-se pela guerra, numa tentativa de estabelecer o domínio russo sobre a Livónia (hoje em dia a Letónia e a Estónia). No início, a Rússia teve algum sucesso e conseguiu destruir o poder dos  cavaleiros da Livónia, mas a Lituânia, aliada dos cavaleiros, tornou-se em 1569 parte integrante da Polónia. A guerra arrastou-se e, enquanto os suecos apoiavam a Polónia contra a Rússia, os tártaros da Crimeia atacaram Astracã fazendo, em 1571, uma incursão profunda pelo interior da Rússia; queimaram Moscovo, deixando de pé unicamente o Kremlin. Quando Estêvão Bathory da Transilvânia se tornou rei da Polónia, em 1575, reorganizou os exércitos polacos sob a sua direcção, tornando-os capazes de levar a guerra até ao território russo, enquanto os suecos reocupavam partes da Livónia. Ivan acabou por pedir ao papa Gregório XIII para intervir, e através da mediação do núncio papal, Antonio Possevino, foi assinado um armistício com a Polónia em 15 de Janeiro de 1582. Nos termos do acordo Rússia perdia todos as suas conquistas na Livónia, e um armistício com a Suécia, em 1583, obrigou a Rússia a abandonar as cidades no golfo da Finlândia. A Guerra da Livónia, que durara 24 anos, fora infrutífera para a Rússia e tinha-a esgotado devido à sua prolongada duração.

As primeiras execuções de Ivan surgiram, aparentemente, devido à sua decepção com o curso da Guerra da Livónia e a suspeita da traição de vários boiardos. A deserção de um dos seus melhores comandantes, o príncipe Andrey Kurbsky para a Polónia, em 1564, parece ter perturbado o czar, que anunciou mais tarde a sua intenção de abdicar, devido à traição dos boiardos. Os moscovitas, no entanto, liderados pelo clero, imploraram-lhe que continuasse a governar e, em 1565, aceitou o pedido com a condição de que puderia lidar com os traidores como desejava. Seria autorizado a formar uma Oprichnina, isto é, a organizar um território que seria administrado separadamente do restante território do principado e colocado sob seu governo directo, como terra da coroa. Um corpo de guarda-costas de 1.000 a 6.000 homens, conhecido como oprichniki, foi recrutado, e cidades e distritos específicos em toda a Rússia foram incluídos no Oprichnina, sendo as receitas provenientes destes territórios atribuídas à manutenção da nova corte do czar e dos que o serviam; corte formada por um número cuidadosamente seleccionado de boiardos e de nobres de serviço. Ivan vivia exclusivamente no interior desta nova corte deixando a administração diária da Rússia (agora chamada zemschina, ou terra), que colocou nas mãos dos principais dirigentes boiardos e de administradores. Ivan deixou praticamente de comunicar com eles, enquanto o oprichniki atacava impunemente todos os que não faziam parte do círculo imediato do czar.
A maioria dos historiadores tende a considerar esta época do reinado de Ivan, o Terrível, como uma luta foi entre o czar e da antiga nobreza hereditária, que, com ciúmes de entregar o seu poder e privilégios, resistiu aos seus projectos de reformas interna e militar. O Oprichnina pode ter sido, assim, a tentativa de Ivan criar um Estado altamente centralizado e destruir os poderes económico e  político dos príncipes e da alta nobreza. Os boiardos, de facto, estavam cada vez mais ressentidos com a política de Ivan e conspiraram contra ele várias vezes, mas o reinado de terror que Ivan iniciou por meio do Oprichnina mostrou-se muito mais perigoso para a estabilidade do país do que o perigo que tinha intenção de suprimir. Em 1570, por exemplo, o czar conduziu pessoalmente as suas tropas oprichniki contra Novgorod, destruindo a cidade e executando vários milhares de habitantes. Muitos boiardos e outros membros da aristocracia morreram neste período, alguns executados publicamente com crueldade calculada. Mais tarde Ivan enviou para vários mosteiros memoriais (sinodiki) de mais de 3.000 das suas vítimas, a maioria dos quais foram executados no decurso do Oprichnina.
O Oprichnina durou apenas sete anos, de 1565-1572, data em que foi abolido como resultado do fracasso dos regimentos Oprichnina em defender Moscovo do ataque dos tártaros da Crimeia. O exército Oprichnina foi integrado no  zemschina, e algumas das propriedades confiscadas por apoiantes de Ivan foram devolvidos aos seus proprietários. Mas o episódio do Oprichnina deixou uma marca sangrenta no reinado de Ivan, causando dúvidas sobre sua estabilidade mental e dando a ideia de Ivan, O Terrível, ter sido um governante  desconfiado e vingativo.

No fim do seu reinado o czar manifestou interesse em estabelecer relações diplomáticas e comerciais com a Inglaterra, chegando mesmo a mostrar disponibilidade para se casar com uma mulher nobre inglesa. Em 1575, parece ter abdicado durante cerca de um ano em favor de um príncipe tártaro, Simeão Bekbulatovich. Durante a década de 1570 casou-se cinco vezes, em rápida sucessão. Finalmente, num acesso de raiva, matou o seu único herdeiro viável, Ivan, em 1581. Este assassinato despoletou a crise política que começou com a extinção da dinastia Rurik após a morte do seu segundo filho o doente Fyodor, em 1598.

As conquistas do czar Ivan foram muitas. Na política externa, todas as suas acções dirigiram-se a forçar a ligação da Rússia à Europa, uma linha que Pedro I, o Grande, continuou. Internamente, o reinado de terror de Ivan acabou por resultar no enfraquecimento de todos os estratos aristocráticos, mesmo da nobreza de serviço que ele tinha patrocinado. A longa e mal sucedida Guerra da Livónia ultrapassou os recursos do Estado e quase levou a Rússia à bancarrota. Estes factores, juntamente com as incursões dos tártaros, tiveram como resultado o despovoamento de várias províncias russas à data da morte de Ivan, em 1584. No entanto, deixou o país muito mais centralizado, tanto administrativa como culturalmente.

Fonte:

Encylopaedia Britannica

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