A CAMPANHA NO
ALENTEJO (cont.)
A defesa
da linha das fortalezas: Olivença e Juromenha
O
ataque espanhol foi desferido na madrugada de quarta-feira dia 20 de
Maio de 1801. As cinco divisões que compunham o exército espanhol da
Extremadura, comandado em pessoa pelo generalíssimo Manuel Godoy,
dirigiram-se para as fortalezas portuguesas da raia. A divisão de
Vanguarda, comandada pelo general Francisco Solano, general que
dirigirá em 1807 as forças espanholas que ocuparam o Sul do país
durante a 1.ª invasão francesa, atravessou o Caia pela ponte que
tinha sido construída a partir das duas horas da noite desse mesmo
dia e dirigiu-se para Elvas, sendo apoiada pela 1.ª divisão,
comandada pelo irmão mais velho do generalíssimo, o general Diego
Godoy. A 2.ª divisão, comandada pelo general Ignacio Lencastre
dirigiu-se para Campo Maior, apoiada pela 4.ª divisão dirigida pelo
general Francisco Xavier Negrete.
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História |
Quartel de
Cavalaria de Olivença |
A investida das praças de Olivença e Juromenha ficou a cargo da 3.ª
divisão, que era dirigida pelo marquês de Castelar, Ramón Rufino Patiño
Osório, que em 1808, enquanto capitão-general de Castela, comandará a
defesa de Madrid contra o exército francês dirigido em pessoa por
Napoleão Bonaparte, e que será em 1810 membro provisório da regência que
governou a Espanha na ausência de Fernando VII. A 3.ª divisão, composta
por 12 batalhões de infantaria e 3 regimentos de cavalaria, apresentou-se
frente a Olivença e a Jurumenha às primeiras horas da manhã. Em Olivença
estava como governador o marechal de campo Jules César Auguste Hèrcules de
Chermont, um velho oficial de artilharia francês, em Portugal desde 1762,
devido à seu mau comportamento em França, que em 1789, devido ao
patrocínio do marquês de Bombelles, então embaixador de França em
Lisboa, tinha sido nomeado coronel do regimento de artilharia de Estremoz, e
que de Novembro de 1796 a Março de 1801 fora governador da praça de
Almeida, com o posto de brigadeiro. Promovido a marechal de campo em 25 de
Janeiro de 1801 tinha sido transferido para o governo da praça de
Olivença, o que de facto era uma despromoção, já que passava do comando
de uma praça de primeira grandeza, de facto a terceira fortaleza terrestre
mais importante do país, a seguir a Elvas e Monção, para uma menor que
nem em estado de se defender estava. Passava do comando de uma fortaleza que
tinha uma guarnição em tempo de guerra de 4.000 homens de 1.ª linha, para
uma que em tempo de guerra não iria passar dos 500 homens de Milícias.
Mais, era substituído por um parente, o também marechal de campo Gustavo
Adolphe Hèrcules de Chermont, que tinha exactamente a sua antiguidade. Há
qualquer coisa de estranho nesta transferência, mas esta estranheza não
tem sido abordada por ninguém. Porquê a transferência de Almeida para
Olivença de um oficial general? Porquê colocar um marechal de campo a
governar uma fortaleza guarnecida por um único batalhão de milícias com
pouco mais de 500 homens? Porque não se querendo defender a fortaleza, não
se queria abandoná-la sem combate? Mas então porquê entregar o governo a
um marechal de campo? As dúvidas nunca poderão ser respondidas porque a
resposta não foi dada por ninguém. O que se sabe é que a fortaleza, que
não estava em estado de se defender, porque lhe faltavam as obras
exteriores, os bastiões e revelins que deviam proteger as cortinas, tinha
uma guarnição completamente insuficiente, composta pelo batalhão de
milícias de Vila Viçosa, para defender uma muralha demasiado ampla. Por
isso o general Jules César de Chermont, à primeira intimação do
comandante da divisão espanhola, aceitou entregar a fortaleza, não se
tendo cumprido as formalidades tradicionais, segundo parece. Chegou-se ao
caso de afirmar, como Garção Stockler, o secretário do quartel-geral do
duque de Lafões, que foi o próprio general que tendo acorrido às muralhas
fez sinal, com a sua bengala a que tinha atado um lenço de seda, às tropas
espanholas que queria parlamentar. O que interessa salientar é que, ao
contrário do que afirma Luz Soriano, Olivença não tinha condições para
se defender. E de facto Chermont, nesse mesmo dia 20 de Maio, por volta das
dez horas da manhã, assinou a capitulação, entregou a praça, e
dirigiu-se para Évora, onde se apresentou ao Governador das Armas do
Alentejo, o general Fernando da Costa de Ataíde Teive, que o mandou prender
e o enviou para Lisboa, tendo esperado o conselho de guerra no castelo de
São Jorge. No conselho de guerra, defendeu a sua actuação devido ao mau
estado das muralhas, e à incapacidade das tropas milicianas, tendo acabado
por ser absolvido. Outra parte da 3.ª divisão espanhola, comandada pelo
general napolitano Carrafa, que participará na 1.ª invasão francesa, em
1807 ao acompanhar o general Junot desde Alcântara até Abrantes,
apresentou-se em frente de Juromenha, na tarde desse mesmo dia 20 de Maio. A
fortaleza, governada pelo tenente-coronel Veríssimo António da Gama Lobo,
defendia a travessia do Guadiana, na aproximação a Vila Viçosa e
Estremoz. Com uma guarnição formada por duas companhias de infantaria de
1.ª linha e de meio batalhão das milícias do Crato, esperava-se que se
defendesse durante algum tempo, dificultando a progressão das forças
espanholas para o interior da província. Mas a verdade é que, como a
inspecção das fronteiras reportou em 1803, para ser defensável a
fortaleza precisava de novas obras exteriores, que em 1801 não tinha, nem
nunca viria a ter. O governador Gama Lobo, tenente-coronel desde 1797,
antigo oficial do regimento de artilharia de Lisboa, não prestava serviço
activo num regimento desde 1784, data em que tinha sido nomeado ajudante de
ordens do governador da armas do Alentejo, o general de infantaria visconde
da Lourinhã, tendo sido agraciado com o cargo de governador de Juromenha em
1789. Gama Lobo também não hesitou muito e entregou às 10 horas da noite,
muito rapidamente, a praça que dirigia. A sua atitude era difícil de
defender e por isso, julgado em conselho de guerra, foi condenado à morte,
tendo a sentença sido comutada em degredo para Angola em Janeiro de 1802,
onde morreu. Antes de abandonar a capital foi demitido do exército, em
frente da guarnição de Lisboa, numa parada realizada no Rossio. O dia da
invasão não começava bem para as armas portuguesas, sendo que se a
rendição das fortalezas não era de facto preocupante do ponto de vista
estratégico, nem tão-pouco táctico, já que dificilmente os espanhóis
poderiam aproveitar a conquista destas fortalezas para se infiltrarem no
interior do Alentejo, como de facto não aconteceu, a sua influência fez-se
sentir mais ao nível moral, não sendo de facto as más notícias
portadores de esperanças de sucesso.
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