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As Campanhas no Brasil - 6.ª parte
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A defesa da bacia do Paraguai, no Mato
Grosso
A capitania de Mato Grosso, criada em 1748, tinha tido, a partir de 1772, durante o governo de Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, governador de 1772 a 1789, um desenvolvimento muito importante. Foi este capitão-general que, no seguimento de uma política estabelecida por Luís Pinto de Sousa, o anterior governador, construiu os fortes e povoações que permitiram a fixação de população nos territórios do oeste brasileiro, acabando com o povoamento temporário, dependente dos ciclos da prospecção mineira.
Aquando do conflito de 1777, o governo de Assunção tinha atacado o forte de Nossa Senhora dos Prazeres do Iguatemi, presídio construído no vale do rio com o mesmo nome, que tinha estabelecido, a partir de 1767 a fronteira sudoeste da capitania. Destruído o forte, a progressão portuguesa nesse sector da fronteira estancou de facto. Para as autoridades espanholas tratava-se agora de tentar parar a progressão portuguesa no vale do Paraguai. Em 1801, ao saber-se em Buenos Aires da declaração de guerra da Espanha a Portugal, os espanhóis começaram a pôr em prática os seus planos bélicos. O governo do Rio da Prata estava em transição, já que em 20 de Maio tinha acabado de ser empossado um novo vice-rei, o general Joaquin del Pino Romero y Negrete, engenheiro militar, na América do Sul desde 1770, e que entre muitas outras funções tinha sido presidente da Real Audiência de Charcas, o território da actual Bolívia. Conhecia bem a região, tinha grande experiência da administração colonial e tinha conhecimento directo dos problemas criados pela progressão territorial portuguesa no interior da América do Sul. Conhecia evidentemente os problemas diplomáticos entre Portugal e Espanha na Europa, e da probabilidade de ser desencadeado um novo conflito, mesmo que, com o bloqueio britânico aos Portos espanhóis a correspondência entre as duas costas do Oceano Atlântico não fosse tão regular quanto o desejável. Por isso, as suas primeiras acções enquanto vice-rei visaram a organização e preparação das milícias, praticamente as únicas forças militares com que podia contar para a guerra, tirando o regimento do Rio da Prata, de que tinha sido oficial. A guerra, de que terá tido conhecimento provavelmente ao mesmo tempo que as autoridades portuguesas, em meados de Julho ou princípios de Agosto de 1801, apanhou o vice-rei da Prata no meio dos preparativos bélicos. Decidiu então atacar o Brasil no ponto que consideravam claramente o centro de infiltração mais perigoso para o território do vice-reino do Rio da Prata, mas também o ponto mais vulnerável nas defesas portuguesas. Enviou, por isso, uma força numerosa pelo rio Paraguai acima contra o forte Coimbra. A expedição comandada por D. Lázaro de la Ribera y Espinoza, governador da Intendência do Paraguai desde 1796, composta por mais de 500 homens - algumas fontes falando mesmo de 900 efectivos -, foi embarcada em 3 navios, transportando 12 canhões. O forte, construído na margem direita do Paraguai, numa zona não alagada do Baixo Pantanal do Mato Grosso, ou do Chaco, o seu nome em castelhano, ainda não estava terminado, faltando ainda construir a cortina Norte, tinha uma pequena guarnição militar composta por cerca de 40 militares, acompanhados de 60 civis, e era defendido por 6 pequenos canhões de calibre de 3 libras, estando algo isolado, já que Albuquerque, a norte, era uma pequena povoação. A presa parecia fácil e seria importante. A sua conquista permitiria aos espanhóis um ataque ou para Leste, contra o forte Miranda, ou para norte em direcção a Cuiabá, uma povoação em desenvolvimento que se tornaria pouco tempo depois a capital da província, ou para ocidente, em direcção aos estabelecimentos portugueses que defendiam a bacia do Amazonas. A frota demorou mais de quinze dias a subir o rio. Sabemo-lo porque foi o tempo que uma frota organizada durante a Guerra do Paraguai, em 1865, realizou o mesmo percurso, de Assunção até ao forte Coimbra, frota que incluía já alguns barcos a vapor. A expedição de 1801, demorou naturalmente mais tempo que esta, tendo por isso saído possivelmente de Assunção na última, ou mesmo na penúltima semana de Agosto. A expedição chegou ao forte em 16 de Setembro de 1801, tendo sido recebida a tiro de canhão, já que o comandante português tinha sido avisado, por índios aliados, da concentração espanhola no forte Bourbon. A flotilha fluvial respondeu ao fogo, tendo o duelo de artilharia durado até ao cair da noite. No dia seguinte, Lázaro Ribera escreveu ao comandante do forte Coimbra da sumaca Nossa Senhora do Carmo, um navio de dois mastros muito utilizado no rio da Prata. Na carta propunha ao tenente-coronel Ricardo Franco, uma rendição honrosa, já que as forças em confronto eram bastante desproporcionadas. O tenente-coronel Ricardo Franco de Almeida Serra, construtor desde 1797 do forte que comandava, oficial experiente, engenheiro geógrafo enviado para o Brasil em 1779, tendo sido nomeado para a 3.º divisão da demarcação do Tratado de 1777 encarregue da fronteira do Mato Grosso, respondeu-lhe rapidamente, não necessitando da hora que lhe tinha sido dada, e de forma digna e altiva escreveu:
Possivelmente, não haveria nenhum outro português, a viver naquelas remotas regiões do centro do continente sul-americano, que percebesse tão bem como ele a importância daquele local para o progresso do domínio português na América do Sul. Os dois comandantes conheciam-se bem, já que Lázaro Ribera tinha sido o 1.º comissário espanhol da demarcação do Mato Grosso. Por isso, baseados num sólido conhecimento científico, que se apoiava nos rudimentares meios técnicos de que disponham, e que os obrigava a tomar decisões com base numa grande dose de conhecimento prático e intuitivo, ambos sabiam bem da importância do local. O que fazia prever que o oficial espanhol não desistiria facilmente dos seus intentos. De facto, no dia seguinte, tentou um desembarque na ponta superior do forte, mas o fogo da artilharia portuguesa impediu as milícias paraguaias de conseguir tal objectivo. No dia 19 de Setembro atacou pelo lado contrário, do lado do antigo presídio de Nova Coimbra, mas de novo infrutiferamente. No dia 20, decidiu-se a destruir a horta e apanhar o gado que sustentavam a guarnição e a população do forte, mas novamente sem grande efeito e com mais algumas baixas. Obrigado a permanecer quatro dias no mesmo local, as vastas forças que Ribera tinha trazido para atacar as possessões portuguesas nesta região, começavam a ser-lhe prejudiciais, já que tão grande número de homens não podia ficar estacionado num local tão remoto, por um período tão dilatado de tempo, pois seriam obrigados a utilizar os mantimentos, as "munições de boca", necessariamente limitados que tinham trazido por esse rio acima. O comandante espanhol deu-se um tempo para recompor as forças sob o seu comando, duramente atingidas nos cinco dias de contínuos combates travados entre 16 e 20 de Setembro. O tempo estava bastante rigoroso, tendo aquela região estado debaixo de uma forte tempestade, acompanhada de ventos fortes, nos dias seguintes. Finalmente, no dia 24, com as suas forças reorganizadas e debaixo de um céu menos carregado, decidiu tentar um último esforço. Na tarde desse dia mandou atacar de novo o forte Coimbra, mas falhou mais uma vez a conquista do forte. No dia seguinte, 25 de Setembro de 1801, decidiu retirar-se iniciando a viagem de regresso a Assunção, não sem prestar uma homenagem aos esgotados defensores do forte, fazendo tocar os oboés e as zabumbas, esses grandes tambores que tinham acompanhado a expedição e que ribombavam ecoando pelos vastos campos alagados da região, enquanto as sumacas que transportavam a sua força começavam a descer lentamente o rio. Este honroso tributo foi respondido o mais condignamente possível pela guarnição do forte, ouvindo-se do alto do forte os instrumentos de música que o tenente-coronel Ricardo Franco tinha conseguido reunir: dois tambores, uma flauta e uma rabeca. Ribera iria descobriria, ao regressar à sede do seu governo, em meados de Outubro, que a situação na fronteira ocidental da intendência que dirigia era bem diferente da que tinha deixado em Agosto, prova de que a decisão de atacar a capitania de Mato Grosso tinha sido um erro estratégico. Com as forças espanholas em retirada, o capitão-general do Mato Grosso, o desembargador Caetano Pinto de Miranda Montenegro, futuro visconde e marquês de Vila Real da Praia Grande, um caso raro de um civil a governar uma capitania do império português, decidiu contra-atacar. O objectivo era claro, destruir o forte espanhol construído na margem norte do rio Apa, impondo definitivamente a fronteira nesse mesmo rio. Com essa intenção foi enviado pelo vale do rio Mondego uma pequena força, comandada pelo tenente Francisco Rodrigues Prado, governador do forte Miranda, que tomou e arrasou o forte São Jorge, na margem sul do rio Apa, o que permitiu fixar a fronteira definitivamente nesse rio.
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