A História acontece todos os dias, é evidente ! O problema é que estamos normalmente tão pouco preocupados com os acontecimentos que nos rodeiam que não lhes damos nem grande importância nem tão-pouco somos tentados a encontrar-lhes um significado especial. Uma das facetas do ano de 1974, é que os factos se sucederam tão rapidamente, que a maior parte das pessoas se apercebeu que a História se estava a desenrolar à sua frente, e muitas das vezes de uma maneira sem precedentes. De facto, 1974 será sempre visto como um ano importante, fundamentalmente porque foi o ano em que a moldura política criada pelos tratados que terminaram a Segunda Guerra Mundial foi posta em causa de uma maneira muito clara. O sintoma mais evidente desta crise global foi o grande número de mudanças de dirigentes políticos, em número demasiado grande para poderem ser atribuídas à simples mudança de gerações. As forças que produziram esta transferência foram complexas, mas é claro que os factores económicos tiveram muita importância. No mundo industrial o longo período de desenvolvimento económico, que parecia não ter fim à vista e que era um dos mais importantes artigos de fé do pós-guerra, foi posto em causa, devido a que a economia da abundância se baseava no pressuposto de que os recursos, sobretudo os alimentares e energéticos, eram inesgotáveis e permaneceriam sempre baratos. 1974 foi o ano em que estas premissas foram postas em causa, de uma maneira que ninguém poderia prever. No mundo industrializado esta mudança levou ao aparecimento duma inflação em crescendo que parecia incontrolável, e que provocou uma crise económica brutal. Para os países mais pobres a crise levou ao fim dos sonhos de desenvolvimento económico e levantou o espectro da fome generalizada. No âmago das várias crises económicas e políticas de 1974 esteve, evidentemente, o aumento do preço do petróleo. De um só golpe, a decisão tomada pelos países produtores de petróleo provocou uma redistribuição da riqueza mundial que nenhum dos planos de ajuda económica do pós-guerra tinha conseguido realizar. Inevitavelmente, esta transferência de riqueza foi acompanhada por uma transferência de poder para o pequeno número de países que quase monopolizam os recursos petrolíferos. Foi na ONU que esta mudança de estatuto dos países petrolíferos se tornou mais clara, quando conseguiram atacar os interesses das «grandes potências» - sendo secundados pelos países que mais tinham a perder com o aumento dos preços do petróleo - os países sem recursos naturais do Terceiro Mundo. Mas os problemas que ocuparam o tempo e a energia dos dirigentes mundiais em 1974 já eram visíveis antes do ano ter começado. E a verdade é que muito pouco foi conseguido durante o ano. No Médio Oriente, o conflito israelo-árabe esteve permanentemente à beira da explosão. No domínio económico, onde pareceria que o senso comum levaria os países industrializados a unirem-se, a divisão e desunião continuaram a dominar. Por exemplo, muitos economistas duvidavam da possibilidade de se poder manter o sistema monetário que tinha existido desde o fim da guerra, depois das transferências massivas de capitais para os países produtores de petróleo. Mas apesar destes receios, progrediu-se muito pouco na criação de um novo sistema, ou mesmo na decisão de por de parte o antigo. Em parte, esta falta de acção parecia reflectir o que o historiador escocês Thomas Carlyle tinha afirmado, que a mudança, «sempre necessária», é também sempre dolorosa. Necessária ou não, as mudanças realizadas em 1974 provocaram preocupação e mesmo dor a milhões de pessoas. Os aspectos positivos da mudança - o aparecimento de novas expectativas - só começariam a aparecer nos anos seguintes. O 25 de Abril de 1974 faz 28 anos neste ano de 2002. O golpe de estado de 25 de Abril e a crise revolucionária que se lhe seguiu não foram um caso isolado, nem tão-pouco foram o despoletar de novas crises à escala global. O 25 de Abril de 1974 está completamente integrado na época de crise que o precedeu, e que continuou a desenvolver-se; época que tendo começado com a Guerra Israelo-Árabe de Outubro de 1973, ou do Yom Kippur, teve o seu pleno desenlace neste ano terrível de 1974. Este ano, caracterizada pela crise energética, pela crise económica, provocada pela inflação galopante e pela crise alimentar, que foram consequências da primeira, deu origem a uma tentativa desenfreada de diminuição dos gastos com a energia, com a procura de fontes alternativas, da diminuição dos custos de produção, e do aumento da produtividade, pela racionalização e automatização de tarefas, única maneira de ultrapassar o impacto negativo que o choque energético teve nos preços no consumidor. As soluções encontradas a partir de 1974 são-nos bem conhecidas. Vivemos no meio delas ! O nosso Mundo mudou muito a partir de 1974. Portugal também. Vale por isso a pena recordá-lo.
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