Tropas israelitas no Sinai

Tropas israelitas abandonam a zona do Canal do Suez após a assinatura
dos acordos de separação das forças beligerantes

 

A caminho de novos confrontos

 

A retirada Os Árabes Israel

Na luta sem fim à vista entre países árabes e Israel, 1974 foi de facto o ano dos Árabes. Mas a realidade é que quando o ano acabou os Árabes estavam exactamente no mesmo sítio, e tão longe de resolver o conflito no Médio Oriente a seu favor como anteriormente. Como é natural, responsabilizaram o árbitro, Henry Kissinger, pelo acontecido, o que fez com que a tentativa de imposição de uma Pax Americana na zona se desvanecesse por completo. Por isso, aquilo que parecia ser uma clara tendência para a paz, passou a ser uma preparação para um novo confronto, e o mundo que se tinha apercebido da sua dependência do Médio Oriente, e da importância da resolução do conflito, estremeceu só de pensar nas consequências.

Raramente, desde o fim da Segunda Guerra Mundial, as hipóteses para um Médio Oriente tranquilo pareceram tão favoráveis como em Janeiro de 1974. No seguimento da Guerra de Outubro de 1973, os Estados Unidos estavam totalmente empenhados na tentativa de encontrar uma solução negociada, e Israel foi obrigado a retirar de territórios árabes ocupados, após sete anos de total inflexibilidade.

Houve outras razões para a euforia Árabe. A diminuição brutal das reservas monetárias em todo o mundo, provocada pelos sucessivos aumentos do preço do petróleo, deram aos países árabes uma importância no mundo sem precedentes. Com este aumento repentino de importância os Árabes sonharam com a rápida concretização de um acordo, que lhes permitisse voltarem-se para o tão necessário desenvolvimento interno.

Os Acordos de Retirada

Henry Hissinger estava convencido que a solução do conflito no Médio Oriente, tendo em conta a história do conflito, passava por ir dando pequenos passos. E, no princípio, esta metodologia gradativa conseguiu que se realizassem progressos assinaláveis. Em Janeiro, o Egipto e Israel assinaram um acordo de separação de forças, que fez com que Israel evacuasse 20 quilómetro de território egípcio no Sinai.  Em Maio, depois de muita discussão e uma guerra de nervos prolongada, apoiada por duelos de artilharia nos Montes Golã, a Síria seguiu o Egipto e Israel abandonou mais de 20 quilómetro de território sírio.

Mas tempos difíceis seguiram-se para as negociações seguindo o método adoptado por Kissinger. «A coisa explodiu na nossa cara, quando chegou o momento da Jordânia.» É que Kissinger decidiu esperar um pouco, para que os acordos anteriores assentassem, em vez de avançar rapidamente para negociações entre a Jordânia e Israel. Kissinger estava exausto e Israel não estava particularmente interessado em abdicar dos territórios ocupados nesta zona.


Arafat Arafat a discursar na ONU

Defendeu, em Novembro de 1974, na Assembleia Geral da ONU, a criação de um único estado na Palestina, laico e democrático.


O presidente egípcio, Sadat, tentou fazer com que as coisas progredissem apoiando o rei Hussein, e considerando-o representante de todos os Palestinianos da Jordânia, tentando dar a impressão de que o termo «Jordânia» incluía a Margem Ocidental. Mas se Sadat abriu uma porta, a verdade é que os israelitas não aproveitaram a oportunidade. Quando os dirigentes árabes se reuniram na capital de Marrocos, Rabat, para a sua cimeira de Outubro, a falta de progresso na questão Palestiniana fez com que se tomasse a decisão de deixar de considerar o rei Hussein como representante dos palestinianos nos territórios ocupados. Em vez disso os dirigentes árabes optaram por Yasser Arafat, o presidente da Organização de Libertação da Palestina (OLP), um homem com quem os israelitas tinham jurado nunca negociar.

Tudo isto fez com que os árabes deixassem de ter confiança na iniciativa de paz americana. «Kissinger teve um ano e falhou», como disse um ministro sírio. E mesmo Sadat, que personificava o apoio árabe ao plano americano, se afastou da posição americana e regressou aos seus contactos com a União Soviética, o que levou a um aumento da ajuda militar e económica de Moscovo.

A União Soviética foi a última a rir. Na cimeira de Vladivostoque, entre Brezhnev e Ford, os Estados Unidos tiveram de aceitar que a iniciativa para a paz no Médio Oriente, até aí exclusivamente americana, tinha perdido a sua força inicial e que seria necessária uma iniciativa conjunta das duas super-potências seria necessária para a pôr novamente em movimento. A inclusão da União Soviética não melhorou necessariamente as possibilidades de realização de um acordo, já que o principal problema para a finalização do acordo, a questão palestiniana, manteve-se de pé.

Os Árabes

Mas 1974 mudou em muito a posição dos guerrilheiros palestinianos (os «fedayeen«). Não só a OLP ganhou o apoio unânime dos países árabes, como o seu presidente foi recebido na ONU, tendo discursado perante a Assembleia Geral das Nações Unidas. Mas se, nesse discurso, a exigência de Arafat da destruição do Estado de Israel não deixava margem de manobra para a realização de um acordo, a verdade é que os Palestinianos tinham mostrado um novo de tipo de flexibilidade, começando uma campanha para aumentar a sua respeitabilidade, que os dirigentes árabes esperavam que poderia vir a persuadir os Estados Unidos, e por seu intermédio Israel, da necessidade de reconhecer a OLP e de negociar com ela.

Mesmo não havendo progressos rápidos na concretização de um acordo de Paz, a verdade é que os Árabes pensaram que em 1974 a balança do poder no Médio Oriente tinha mudado a sua favor, de uma maneira irreversível, e que por fim acabariam por vencer. Esta nova confiança deveu-se ao aumento dos preços do petróleo e ao dinheiro que ele gerou, e que permitiu comprar armas, instrução tecnológica e amigos externos. Num ano em que a economia israelita sofreu bastante, devido ao aumento do preço do petróleo, mas também devido à guerra de Outubro, e à chamada de reservistas que se mantiveram em serviço durante muito tempo, os países árabes produtores de petróleo puderam ajudar os países da linha da frente com mais de 2 mil milhões de dólares de ajuda militar.


O Xá do Irão A Coroa do Pavão

O Xá do Irão foi o «monarca do ano». Manteve os preços do petróleo inesperadamente altos, e com o dinheiro investiu massivamente na Europa e nos EUA.


Em 1974, os países árabes produtores de petróleo ficaram a saber que tinham poder para atacar o Ocidente onde doía mais - na carteira. Devido ao aumento sucessivo do preço do petróleo os árabes agravaram a inflação nos países ocidentais, sem mostrarem grande preocupação pelas consequências. E começaram a pôr em causa o sistema monetário internacional devido aos enormes excedentes das suas balanças de pagamentos.

Tanta riqueza e poder trouxe respeito e atenção, e algumas vezes obediência, não só para os Árabes, mas também para o Xá do Irão, que continuou a comprar as armas mais modernas e mais sofisticadas do mercado, por um preço astronómico. De facto, o Xá via-se como o protector do Golfe Pérsico e num futuro próximo como chefe de uma potência mundial. Alguns comentadores mais críticos afirmavam que a ideia tinha a ver com a mania das grandezas do Xá, mas em 1974 deixaram de o dizer alto e bom som.

Em 1974 o mundo industrializado prostrou-se virando-se para Meca, esperando acabar com a espiral dos preços do petróleo. Em resposta, os dirigentes árabes, tanto os radicais como os moderados, como o rei Faisal da Arábia Saudita, aconselharam a que se resolve-se o «problema israelita».

As hipóteses de tal acontecer eram muito pequenas. O que se discutia não era a paz, mas a possibilidade de um ataque surpresa de Israel contra a Síria, que se tivesse acontecido teria tido consequências catastróficas. É que ambos os lados em confronto se tinham reforçado massivamente. Os egípcios e os sírios acabavam de adquirir mísseis terra-terra SCUD e Israel informou que se considerasse que a sua existência estava em risco não se limitaria à utilização de armas convencionais. Felizmente a guerra não recomeçou.

Israel

A situação em Israel modificou-se significativamente em 1974. A geração formada nos guetos da Europa oriental, que tinha governado Israel durante os primeiros 26 anos da sua existência, retirou-se quando Golda Meir passou as rédeas do governo a Yitzhak Rabin, o primeiro chefe de governo a ter nascido no território que se tornou Israel. Rabin, que tinha 52 anos de idade, tomou o poder no momento em que Israel se encontrava, de novo como em 1953, cada vez mais isolado e rodeado de países árabes cada vez mais fortes. Nas próprias Nações Unidas, que tinham dado origem ao país, a sua própria existência tinha sido posta em causa por Yasser Arafat, quando afirmou perante uma Assembleia Geral aprovadora, que o Estado de Israel devia dar lugar a uma Palestina «democrática e secular».

Rabin, um antigo soldado transformado em diplomata, e chegado recentemente à política, agarrou as rédeas do poder e, ao contrário da obstinação de Golda Meir, dirigiu o governo moderada e consensualmente. Com uma pequena minoria no Parlamento, e uma oposição de direita forte e contrária a qualquer compromisso com os árabes, era a única coisa a fazer.


Ariel Sharon Major general
Ariel Sharon

Herói da Guerra do Yom Kippur, de Outubro de 1973, por ter dirigido o contra-ataque que fez o exército israelita atravessar o Canal do Suez, tinha ajudado a criar em Setembro de 1973 o partido de direita Likud. Eleito deputado nas eleições de Dezembro de 1973, foi nomeado conselheiro de Defessa de Rabin de 1975 a 1976.


Mas o principal problema de Rabin era a economia, e conseguir pô-la a funcionar. Com uma das taxas de inflação mais altas do mundo, de quase 40 %, e a necessidade de adquirir armas que suprissem as perdas da guerra de 1973, as reservas monetárias de Israel diminuíram para níveis muito perigosos e que podiam provocar a bancarrota.

Esta situação era dificilmente aceitável pelos israelitas que, durante os últimos 5 anos de paz, da guerra de 1967 até à do Yom Kippur, em Outubro de 1973, tinham sentido as suas condições de vida melhor muito, após os primeiros 20 anos de existência do Estado de Israel, muito duros em todos os aspectos - económicos, sociais, culturais. Os israelitas tinham conhecido a boa vida. Gostaram e não a quiseram abandonar.

Mas, o facto é que os heróis da Guerra de 1963 já não governavam. A Guerra de Outubro tinha provado que os israelitas não eram invencíveis, e que estavam totalmente dependentes da ajuda americana, abandonados que estavam pela Europa e confrontados com o poder petrolífero dos Árabes. Os israelitas pensavam que podiam defender-se dos árabes indefinidamente, mas a partir de 1974 sabiam que estavam dependentes da ajuda externa, sobretudo da Diáspora Judaica.

A pressão árabe sobre Israel manteve-se, tentando o reatamento das conversações para continuar o «impulso para a paz.» O problema era saber qual o novo passo a dar. Devia Israel negociar com o Egipto uma nova retirada ou com a Jordânia, sobre a retirada da Margem Ocidental do Jordão, ou com ambos os países simultaneamente? Rabin explicou, na sua única frase memorável do ano, que Israel tinha que ter «um pedaço de paz por cada pedaço de território». Mas nem Sadat nem Hussein conseguiram dar a Israel o que Rabin queria.

A decisão da Cimeira de Rabat, de que só Yasser Arafat e a OLP poderiam negociar o futuro da Margem Ocidental, foi considerado inaceitável por Israel que como seria natural bateu com a porta, recusando-se a negociar com «terroristas e assassinos.» E qualquer possibilidade de diálogo, por pequena que fosse, desapareceu quando os Palestinianos mataram 21 estudantes em Maalot. 

Na verdade, alguns funcionários israelitas falaram na possibilidade de se poder vir a negociar com palestinianos moderados, se nascesse «uma terceira força» na Margem Ocidental, mas de facto esperando que Hussein pudesse vir a regressar do seu isolamento. Mas, de facto, ninguém acreditava nestas duas soluções alternativas à OLP. E para o provar, realizaram-se na Margem Ocidental, pela primeira vez, manifestações de apoio aos fedayeen.

Sem concessões de parte de Israel nem dos Árabes, o Médio Oriente voltou a entrar em rota de colisão. Falou-se novamente de guerra, e a ... da população israelita que já estava em baixo em finais do ano, piorou ainda mais com o anúncio das medidas de austeridade, as mais duras desde os anos 50. A Libra israelita foi desvalorizada em 43 %. O preço da gasolina duplicou, o do açúcar triplicou e a maior parte dos outros produtos alimentares aumentou para o dobro. Mas as manifestações contra as medidas foram muito poucas, devido é claro à crise política, e devido à declaração de perigo de  guerra iminente em Novembro, devido a movimentações de tropas sírias. Israel esperou que a crise passasse com o passar do tempo. O tempo poderia vir a diminuir o radicalismo da posição da OLP sobre Israel, e permitir a Israel voltar à mesa das negociações com o Egipto, e podia ser mesmo que permitisse a realização de uma nova ofensiva de paz por intermédio de Kissinger.

Com a aceitação por parte da Síria de uma nova força de interposição da ONU, e com o tempo a piorar significativamente na região dos Montes Golã, o perigo de uma nova guerra diminuiu significativamente. Israel pensava que na Primavera de 1975 conseguiria resistir a uma nova investida síria e mesmo ganhar novamente, desde que tivesse o apoio dos Estados Unidos.

Mas a ambição de Israel era clara. Só queria mais uns anos de paz. Depois disso, ninguém queria pensar no que é que poderia acontecer.

 


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